Salve o Almirante Negro!


24/06/2024


Por Tiago Pestana, historiador e membro da Diretoria de Igualdade Étnico-Racial da ABI

No dia 24 de junho de 1880 nascia no Rio Grande do Sul, João Cândido Felisberto, o Almirante Negro, líder do movimento que ficou conhecido como Revolta da Chibata, ocorrida entre os dias 22 e 27 de junho de 1910, no Rio de Janeiro, contra os castigos físicos, pratica comum na Marinha, extremamente brutal e desumano.

Naquela noite de 22 de novembro, os marinheiros tomaram o controle do encouraçado Minas Gerais, um dos navios mais poderosos da frota brasileira. Negros, pardos, nordestinos e nortistas que ocupavam postos subalternos na Marinha eram constantemente chicoteados por seus superiores brancos que gozavam dos privilégios sociais e políticos verificados desde o período da escravização indígena e africana.

A Revolta da Chibata foi encerrada com a concessão pelo Governo de uma anistia aos revoltosos, entretanto, João Candido e cerca de 490 seguidores viriam a ser enganados e punidos com penas arbitrárias de prisão e deportação para o trabalho forçado da extração de borracha na Amazonia.

Em dezembro de 1910, João Cândido foi levado para a prisão da Ilha das Cobras, onde ele e seus companheiros foram torturados. Vários marinheiros morreram de fome e doença. Após algum tempo, o Almirante Negro foi transferido para o Hospital Nacional de Alienados, um hospital psiquiátrico no Rio de Janeiro, sob a alegação de que ele apresentava sinais de insanidade. Essa internação foi mais uma forma de punição e tentativa de desmoralizá-lo.

A importância de lembrar da trajetória do Almirante Negro pode ser medida em declarações recentes do Comandante da Marinha Marcos Olsen, contra o Projeto de Lei 340/2018, que inscreve o nome de João Cândido Felisberto no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria:
– “(…) é um fato opróbio em que abjetos marinheiros desrespeitaram a hierarquia e a disciplina e usaram equipamentos militares para chantagear a nação” – disse Olsen que mantém-se um “bastião” contra a indisciplina, decidindo-se pelo sentido narrativo que convém “à boa ordem” e posicionando-se contra reações e demandas por melhores condições de vida, pois o paradigma sócio-político não pressionava os oficiais à época, mas o que pressiona hoje é a história e sua produção historiográfica, que revelam e consolidam a memória de abusos e racismo.

Vale relembrar e ensinar a trajetória de personalidades negras que caminharam, enfrentaram e enfrentam danosas heranças estruturais racistas. Na esperança de que as novas gerações adquiram conhecimento que possam contribuir para a formação de uma sociedade mais justa e fraterna.