30/04/2010
O torturado não pode perdoar o torturador, como fez o Ministro Eros Grau, preso e torturado durante a ditadura militar, ao relatar, no Supremo Tribunal Federal, a ação em que o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil questionou o entendimento de que a Lei de Anistia, de 1979, se estende aos que praticaram torturas em presos políticos durante a ditadura militar. Além de condenar a decisão, adotada por sete votos a dois, a ABI lamentou que a Corte Suprema não tenha reclamado com mais clareza e vigor a abertura dos arquivos da ditadura, embora essa necessidade fosse mencionada por alguns dos juízes.
O inconformismo da ABI foi expressado em declaração divulgada nesta sexta-feira, dia 30 de abril, na qual a Casa do Jornalista manifesta seu aplauso aos Ministros Ricardo Lewandovski e Carlos Ayres Britto, os únicos que votaram contra o entendimento de que a Lei da Anistia beneficiou os agentes do Estado que torturaram, estupraram e deram sumiço aos corpos de dezenas de homens e mulheres presos durante o regime militar. Diz a declaração da ABI:
“O torturado não pode perdoar o torturador, como fez o Ministro Eros Grau, preso e torturado durante a ditadura militar, ao relatar, no Supremo Tribunal Federal, a ação em que o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil questionou o entendimento de que a Lei da Anistia, de 1979, favorece os agentes do Estado que torturaram, estupraram e deram sumiço aos corpos de homens e mulheres presos durante o regime militar.
A ABI considera que faltou à maioria dos ministros do Supremo a coragem cívica de proclamar que esses crimes não têm conotação política e são imprescritíveis, como têm declarado eminentes juristas e como estabelecido em tratados internacionais de que o País é signatário, como a Convenção Interamericana dos Direitos Humanos. É estranho que na véspera de julgamento de tal importância institucional os ministros do Supremo Tribunal Federal tenham aceitado convite para um jantar ou um encontro social com o Senhor Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, deixando que pairasse em setores da opinião pública a suposição de que a decisão adotada não enaltece a desejada e indispensável independência da principal Corte de Justiça do País.
Nesse quadro de rendição a pressões de forças que não ousam expor-se à luz da opinião pública, a AB I considera também que é seu dever expressar aplausos às manifestações dos juízes que foram votos vencidos nesse histórico julgamento, os Ministros Ricardo Lewandovski e Carlos Ayres Britto, que negaram seu aval aos crimes praticados pelos monstros, como os classificou o Ministro Ayres Britto, que se valeram do poder do Estado para supliciar e humilhar homens e mulheres colocados sob sua custódia. Lewandovski e Britto, e não seus pares, ofereceram relevante contribuição à tentativa de esclarecimento de um período sombrio da nossa História que é preciso desvendar em toda a sua inteireza.
A ABI reitera que, assim como a OAB Federal e a sua Seção do Estado do Rio de Janeiro, a gloriosa OAB –RJ, vai prosseguir na luta pela abertura dos arquivos da ditadura, que deveria ter sido reclamada com vigor, com manifestação formal e expressa, pelos ministros que decidiram perdoar os que não poderão jamais ser perdoados, pela iniqüidade e vilania dos crimes que cometeram.
Rio de Janeiro, 30 de abril de 2010.
Maurício Azêdo, Presidente.”