Rocinha: Promessas, apenas promessas


05/10/2020


Por Alcyr Cavalcamti, membro da Comissão de Liberdade de Expressão e Direitos Humanos da ABI.

A “MAIOR FAVELA DA AMÉRICA DO SUL” DESPERTA O INTERESSE DOS ARQUITETOS DE TODO O PLANETA MUITAS PROMESSAS FORAM FEITAS NA “REPÚBLICA DA ROCINHA” 

“A verdade da promessa ou o prognóstico depende da veracidade e também da autoridade daquele que as pronuncia” . Pierre Bourdieu

O Rio de Janeiro iria sediar em julho de 2020 o “Congresso Mundial de Arquitetura”- UIA 2020 Rio, adiado para 2021 em função da Pandemia que atingiu todo o planeta. Para o renomado arquiteto Sérgio Magalhães “O Rio de Janeiro é um laboratório vivo, onde se pode conversar sobre questões decorrentes das desigualdades sociais”. Ao ser anunciada solenemente a abertura do Congresso, o governador Wilson Witzel prometeu realizar obras de saneamento e urbanização, de início na Rocinha e no Vidigal. Na Rocinha prometeu a construção de um grande boulevard  e também a realocação de mais de sete mil moradores. em obras orçadas em mais de R$ 1,5 bilhão e em seu discurso afirmou que iria agilizar as obras, o mais rápido possível.

A Rocinha parece um santuário, terra de promessas,  muitas promessas, onde trabalhadores, bandidos e heróis caminham lado a lado, fazendo de conta que acreditam em tudo aquilo que lhes é apresentado. Por um estranho fenômeno se assemelha a um vulcão, aparentemente adormecido mas que pode explodir a qualquer momento. Depois da matança no ano da graça de 1988 muitas promessas foram feitas. Quase nenhuma foi cumprida. Programas e mais programas em época de eleições como o que prometia melhoramentos em toda a região. Seriam construídas passarelas, teleférico, grande rede de esgotos, remoção de todo o lixo, obras de contenção nas encostas, enfim uma grande urbanização para tornar a Rocinha definitivamente em um bairro. Na época a líder comunitária Francisca Norata a Chica da Rocinha  definiu a expectativa dos moradores cansados de anos e anos de promessas vazias:”não vai ser feito nada, são palavras ao vento, conversa pra boi dormir”.

 

Dois pequenos ritmistas. Photo Alcyr Cavalcanti

O saneamento prometido ainda não chegou, os índices de tuberculose são preocupantes, em alguns casos associados ao HIV. O número de casos de leptospirose é alarmante. O Posto de Saúde Alberto Sabin, também conhecido como posto da Rua Um procura atender a todos, embora com parcos recursos apesar dos esforços quase sobre humanos da sua diretora, a ” Helena do Posto”, que conhece profundamente os meandros da favela. Para amenizar a situação foi construído um Posto de Saúde na “Curva do S” ao lado de um CIEP.

Esperança ou descrédito são sentimentos que povoam o imaginário dos moradores que precisam das autoridades para a melhoria de suas condições de vida. Em 2007 o presidente reeleito Luís Inácio Lula da Silva teve um encontro com William de Oliveira, então presidente da UPMMR< associação de moradores, onde foi firmado um pacto registrado para a posteridade. A Rocinha ficou em clima de festa, algumas coisas foram feitas através do Programa de Aceleração do Crescimento-PAC, muitas não saíram do papel. na memória dos mais antigos, ficou a lembrança funesta do “Valão de Ouro” onde pouca coisa foi feita e muito dinheiro escoou pelo ralo.

O milhares de moradores, verdadeiros “heróis sem rosto” acordam ainda antes do sol nascente e caminham para a árdua jornada de trabalho apesar da Pandemia mortal. Atravessam a Via Ápia e o Valão tendo de conviver com as inúmeras bocas  muito bem guardadas pelos últimos soldados sempre na atividade, muito bem armados ao caminhar de um lado para outro na cuidadosa vigilância de seu território.  O “dono do morro” através de seus inúmeros olheiros controla tudo que se passa na imensa favela, a “Lei do Silêncio” prevalece, porque como diz o velho ditado “Manda quem pode, obedece quem tem juízo”. Redes de relacionamentos são feitas e algum tempo depois desfeitas, suas configurações mudam conforme as situações assim exijam.

As fotografias foram feitas na abordagem de apenas alguns aspectos da “Maior Favela da América do Sul”, como é conhecida entre seus moradores, que pode não ser a maior, mas que é sem sem dúvida a mais bela de todas, o por do sol do alto da Rua Um é um espetáculo inesquecível que vem trazer esperança a seus milhares de moradores que almejam dias melhores,. A esperança e o sonho de dias melhores, um dia com certeza irão acontecer.