A lei é ordem; e uma boa lei é uma boa ordem.
Aristóteles, filósofo grego.
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Bendita sois vós, oh! ABI, que sempre acolheu em seus braços aqueles que não sendo misantropos ainda continuam lutando por algo que consideram tangível e certo.
Eis aí num só parágrafo a exclamação que abrange fatos e fotos, verdades e calúnias, citações do que foi ouvido e falado, reminiscências históricas da arte social e política, feitos que engrandeceram ou reduziram o potencial do homem em proteger a sua espécie, vendo malograr-se suas cogitações e esforços para bem elevá-lo, considerando a sua participação na defesa de princípios evolutivos da unidade universal.
Sobre essa última questão, “a unidade universal”, surgiu-me esse título ou imagem subjetiva quando relia, e o faço de tempos em tempos, um livro de autoria do então Coronel Carlos Alberto Lima Menna Barreto, “A farsa Ianomâmi” (Biblioteca do Exército Editora – 1995).
Oportunamente, quando de almoço semanal com grandes amigos (civis e militares), lembrei-me de solicitar aos presentes que me ajudassem na escolha de matérias que julgassem pertinentes ao momento, uma vez que, em face de tantos assuntos que estariam surgindo, já estaria tendo dificuldade em estabelecer preferências.
A idéia foi bem acolhida e assim relacionei os assuntos vários que me foram apresentados conforme segue:
a) de um engenheiro civil : Da necessidade de implantação do trem-bala entre Rio/São Paulo;
b) de um engenheiro militar : A questão indígena na Amazônia;
c) de um engenheiro militar: O que se espera em Janeiro próximo (referência à alteração nos quadros de pessoal dos Ministérios);
d) de um advogado civil : Dos corruptos na corrupção.
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Apontada na alínea b, a questão indígena na Amazônia coincidiu com os problemas brilhantemente apontados pelo Coronel Menna Barreto em seu livro acima mencionado e assim achamos por bem divagarmos um pouco sobre o assunto, a nosso ver de grande importância e já bastante debatido quando da tão propalada distribuição de terras para fixação de reservas indígenas em Roraima. O assunto se reveste evidentemente da necessidade de considerarmos os diversos aspectos que envolvem a presença indígena na Amazônia, tratados até então por linhas por demais diversificadas pelos órgãos ligados quer aos governos, quanto aos Estados, arbitrários ou dissidentes, refletindo questões de ordem política, as quais, em sua maioria, são quase sempre amparadas pelos tribunais.
Na verdade existem aspectos que devem refletir de uma maneira mais subjetiva a nossa preocupação em torno da nossa Hiléia Amazônica, muito além daqueles circunscritos aos indígenas que nela habitam. Todavia torna-se evidente que a cobiça internacional nos leva a considerar, e isso tem sido por demais falado e escrito, que desde há muito se tem visto ocorrências ligadas a aspectos que demonstram que a Amazônia continua sob a visão de organismos internacionais, considerando-a como um imenso espaço à disposição do mundo.Para cometimento de planos e projetos naturalmente já existentes, basta evidenciar-se que fatos senão recentes porém continuados estão a demonstrar que embora ainda se observem inúmeras regiões mundiais a serem ocupadas não se conhece que sobre as mesmas recaiam tanto interesse e ousadia quanto sobre nossa Amazônia.
Com relação aos nossos índios, claro e evidente que, e estamos voltando ao Capítulo16 do livro “Farsa Ianomâmi”, de Menna Barreto, a fim de transcrevermos um pequeno trecho do livro “Rondon Conta sua Vida a que faz referência o insigne militar sob título “A contestação de Rondon”.
Em carta de 14 de março de 1910 ao Ministro Rodolfo de Miranda, como resposta ao convite para chefiar o Serviço de Proteção aos Índios, em via de ser constituído, Cândido da Silva Rondon expressava seu pensamento a respeito desse discutido assunto. Desde logo declarava-se contrário a catequese pela simples razão de violar o principio republicano da liberdade da crença. Julgava que em vez de intrometer-se na religião dos índios sem nenhum proveito para eles o Serviço a ser criado deveria garantir a “efetividade da posse dos terrenos em que habitavam, restituindo às tribos subsistentes, cujos territórios foram usurpados, os mesmos territórios sempre que possível, ou uma suficiente extensão que lhe fixasse o Governo Federal, mediante acordos amistosos”.
Sugeria que lhes proporcionassem animais de criação, ferramentas,utensílios e assistência técnica,de modo a facilitar-lhes progresso cultural e prosperidade finan- ceira. E, ressalvando a necessidade de respeitar-se sempre a mentalidade indígena, avessa a compromissos ou atividades continuadas e sistemáticas, mostrava-se inteiramente favorável à progressiva integração de todos eles à sociedade brasileira.
Para fechar, acredito que possa, desde que para isso fui devidamente autorizado pela pessoa que viveu o fato, meu amigo Coronel Lario Serrano, contar o que se deu há alguns anos, ou melhor em 1980, em plena selva amazônica:
Serrano se achava em inspeção em uma área coberta pela unidade do Exército na qual servia naquela oportunidade.
Descendo de “rapell”, em uma clareira da floresta, ele e alguns colegas, ao se encontrarem no solo, foram recebidos por um homem branco, vestido com roupas civis, que se aproximou e se apresentou como um italiano, professor, que ali se achava em estudos. Serrano, espantado com o encontro, entabulou conversa com o italiano, o qual os convidou a irem até a sua casa, ali perto.
Do que me contou Serrano do que viu, também fiquei sem muito compreender : A casa do Italiano “em estudos” apesar de madeira, tinha tudo o que uma casa das nossas cidades possuía: geladeira – ar-condicionado, luz elétrica, móveis e utensílios, tapetes etc. Serrano,estupefato com o que havia visto, ao voltar para a sua base fez amplas referências ao Comando, mas com o decorrer das novas inspeções nada mais lhe foi dito sobre o assunto.
Acredito, mas não posso afirmar categoricamente, que o nosso “italiano “fazia parte de uma dessa centenas ou milhares de organizações não-governamentais que pululam em nosso País.
Há tantas coisas que não sabemos e que se passam não só à frente do nosso nariz como dos nossos dirigentes que até nos sentimos humilhados ao sentirmos que nos orgulhamos do nosso nacionalismo.
Depois desse conto, verídico, o que achamos pior: o abandono do nosso índio ou os estranhos que entram subversivamente em nossos rincões?
* Bernardino Capell, sócio da ABI, é jornalista, economista e membro titular do Instituto
de Geografia e História Militar do Brasil.