Queda na receita do Projor provoca reestruturação no Observatório da Imprensa


Por Eduardo Ribeiro, diretor de Jornalismo da ABI

02/07/2015


A escassez de recursos que atinge praticamente toda a imprensa brasileira não deixou incólume o Projor – Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo, que tem como carro-chefe o Observatório da Imprensa nas versões digital, televisiva e radiofônica. Em entrevista à newsletter Jornalistas&Cia, que reproduzimos no site da ABI, Angela Pimenta, diretora do Projor, afirmou que as mudanças, embora provocadas em razão da descontinuidade de alguns patrocínios, não afetarão os rumos da instituição e de seus projetos e, ao contrário, servirão para fortalecer e aprimorar os processos de gestão, a governança e a própria estrutura da instituição dentro dessa nova realidade. Segundo ela, longe de ser um passaralho, as medidas mais drásticas serão temporárias e para compensá-las a instituição passará a contar com novos colaboradores, entre eles Matinas Suzuki, que chega para integrar o Conselho Fiscal. A reestruturação está sendo feita com o apoio de Ana Toni, que foi da Fundação Ford e tem grande ligação com a gestão do Greenpeace, e do professor da Unesp Francisco Belda, mais próximo do dia a dia da instituição, de sua direção e dos projetos editoriais.

“Vamos manter praticamente intacta a equipe deixada e recomendada pelo Luiz Egypto e mesmo quem está saindo seguirá com as portas abertas no Projor. Queremos manter a saga de ser um observatório pluralista, relevante e que continue a fazer a crítica da mídia de forma civilizada, sem sectarismo, buscando audiência, mas sem perder a densidade”, diz Angela, que lembra que isso estará garantido pelos nomes que zelam pela instituição e por sua reputação, seja atuando diretamente, como o inspirador e fundador do Observatório Alberto Dines, o editor Jô Amado, no conteúdo, e Andrea Baulé, no fechamento técnico da web; sejam os que integram o Conselho Consultivo e também atuam como colaboradores, casos de Carlos Eduardo Lins da Silva, Eugênio Bucci e Caio Túlio Costa. No editorial que publicou nesta 3ª.feira, a equipe do OI salientou: “Faltando pouco para completar 20 anos de existência, estamos vivendo as mudanças que o tempo e as inovações tecnológicas nos impõem. Não somos os únicos, nem os primeiros e muito menos os últimos projetos jornalísticos a enfrentar esse desafio. As bases materiais e humanas que animaram a nossa proposta sofreram mudanças, algumas delas radicais, ao longo das últimas duas décadas. Conjunturalmente, fomos também atingidos nos meses mais recentes pela crise econômica que o País inteiro enfrenta. Vários parceiros tiveram de atrasar pagamentos ao OI, outros foram obrigados a desistir de antigos vínculos de cooperação”.

Mauro Malin, que agora deixa oficialmente a cúpula do Projor e do Observatório, havia se licenciado no início do ano para se dedicar ao livro que está escrevendo sobre Armênio Guedes. Preferiu não comentar as decisões. Luiz Egypto, redator-chefe, que também no início do ano havia cogitado um possível desembarque – por entender ter chegado a hora de finalizar um ciclo que, apenas no site, já se estendia por 16 anos, mas com anos adicionais, a se considerar todo o ciclo de vida do Observatório –, chegou a um acordo e também deixa a organização, sendo substituído na função por Carlos Castilho. Luciano Martins Costa, outro decano do projeto, titular há vários anos da versão radiofônica do Observatório de Imprensa, transmitida por emissoras de várias regiões, sai do ar por tempo indeterminado, mas tem convite para continuar com o programa em versão semanal e também por meio de podcast. Ainda não se decidiu e vai aproveitar as próximas semanas para definir os futuros passos.

Em seu texto de despedida, postado nesta 3ª.feira (30/6), Luiz Egypto lembra que, antes de assumir o posto de redator-chefe (um misto de editor geral e gerente do site), sua integração dera-se como responsável pela edição impressa do Observatório da Imprensa, que circulou mensalmente por 29 edições, a partir de julho/agosto de 1997: “Agora, olhando para trás, constato que é muito, muito tempo. É mesmo chegada a hora de passar o bastão”.

Segundo ele, participar do Observatório foi um privilégio pela contribuição decisiva para a qualificação do debate sobre a mídia no Brasil: “Este é um site jornalístico cuja pauta primordial é a crítica de mídia; em concomitância – e aí está o pulo do gato –, é um fórum de discussão sobre o jornalismo, a imprensa e a comunicação aberto à participação da cidadania. Essa norma é uma cláusula pétrea de sua política editorial. Não foram poucas as vezes que publiquei artigos com os quais não concordava um pingo, mas tinham espaço garantido no Observatório porque era nossa obrigação publicá-los. Aí reside o segredo da longevidade de um veículo jornalístico ao mesmo tempo plural e diversificado, embora a sua agenda, pauta e conteúdo não necessariamente interessem a uma grande massa de leitores. Essa abertura a opiniões diversas, ao debate e ao contraditório está no corpo e na alma deste site, tal como Alberto Dines o concebeu na primeira metade dos anos 1990. E eu me orgulho por ter sido um dos responsáveis pela manutenção dessa linha editorial radicalmente anti-sectária”.

Luiz  Egypto (legypto@gmail.com) disse que na semana que vem sai para 12 dias de férias: “Na volta (apud Millôr), livre como um táxi e com conta no Uber, se necessário”.

Sobre ele, diz o editorial do OI: “Durante 16 anos, Luiz colocou todo o seu conhecimento e experiência a serviço do projeto, transformando a página do OI numa referência obrigatória em matéria de observação crítica da mídia. Sem ele, muito provavelmente nada disso teria sido possível. A marca da presença de Luiz, e da equipe que ele montou, permanecerá indelével nos novos tempos que se abrem para o Observatório. Boa parte dessa equipe continuará participando da produção da página web e outros colaboradores se somam ao projeto com o objetivo de manter viva a preocupação do OI em promover a diversidade de percepções e de opiniões em nossa produção editorial. Além disso, claro, Alberto Dines, fundador, inspirador e alma do Observatório da Imprensa, continuará a postos”.

Luciano Martins Costa explica em seu texto de despedida, também desta 3ª, que a crise de gestão que se abateu sobre o OI tornou insustentável a manutenção do trabalho que vinha liderando ininterruptamente desde julho de 2007, sem contar os outros sete anos de participação na fase inicial do projeto: “Os motivos que levam à interrupção desta jornada são muitos, entre os quais não é possível fazer uma hierarquia de relevâncias. Talvez fosse possível contornar alguns deles, mas há uma causa que não pode ser ignorada: não há muito mais o que se analisar na mídia informativa brasileira. Os principais veículos da imprensa se transformaram em panfletos políticos e vasculhar o noticiário em busca de jornalismo que valha uma referência tem sido como buscar um fio de cabelo no palheiro”.

Ele encerra o texto lembrando que “os primeiros artigos escritos para o Observatório tratavam de sustentabilidade e de propostas para superação da crise que desde então ameaçava o futuro dos jornais” e que “esta derradeira observação não pode ser mais otimista, em relação à mídia tradicional, do que as daquele tempo”. E conclui afirmando: “Mas sabemos todos que, uma vez colocada a lente da crítica sobre a imprensa, você nunca mais vai ler jornal do mesmo jeito”.