14/01/2022
Publicado no portal Coletiva.net.
Em vídeo, ancorado pela jornalista Roberta Mércio, o administrador municipal revela o rosto do repórter investigativo do Grupo RBS.
Após a veiculação de matéria na RBS TV, no portal G1 e em GZH, que revelou um suposto esquema de pagamento de propina ao prefeito de Bagé, Divaldo Lara, o administrador municipal se mostrou descontente com a situação. Em vídeo divulgado nas redes sociais e ancorado pela coordenadora de Comunicação da prefeitura e ex-colaboradora do Grupo RBS, Roberta Mércio, o político ataca o jornalista responsável pela reportagem investigativa, Giovanni Grizotti. Além disso, a postagem ainda revela o rosto do comunicador do Grupo RBS, que sempre manteve discrição da sua imagem por conta da densidade de pautas com as quais se envolve.
Em trecho do vídeo, Roberta Mércio diz que o prefeito de Bagé é vítima de “assassinato de reputação”. Logo em seguida, a palavra é passada para Divaldo Lara, que acusa Grizotti de ser esquedista e de “armar uma matéria”, enquanto o rosto do jornalista investigativo é divulgado. Ao longo da produção, o político também protesta que não foi notificado sobre a veiculação da matéria.
O prefeito de Bagé também publicou em página do Facebook um comunicado. Nele, escreveu que “o grupo para o qual Giovani Grizotti trabalha, bem como seus afiliados, já têm um histórico de sensacionalismo e distorções quando se refere ao presidente Bolsonaro e perseguições a quem o apoia. E comigo não foi diferente”.
Veja o post completo logo abaixo:
Repercussão
Em suas redes sociais, Grizotti escreveu que agradece as mensagens carinhosas que recebeu em referência aos ataques sofridos por Divaldo e Roberta. No texto, o jornalista ainda registra que o depoimento do prefeito “reconhecendo a denúncia do MP e a existência da delação, bem como o próprio áudio privado que enviei à Roberta, e vazado no vídeo que circula nas redes sociais, desmentem a péssima montagem editada para me atacar”. Ele ainda ressalta que na mensagem, “como manda o bom jornalismo” relata uma checagem que fez, “não confirmando denúncia feita por um jornal”.
Sobre os ataques do prefeito de Bagé Divaldo Lara e sua assessora de imprensa, Roberta Mércio. pic.twitter.com/YqsnPZgwfE
No final da tarde desta quinta-feira, 13, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul (Sindjors), em conjunto com a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), emitiu uma nota de repúdio intitulada ‘Em vídeo, prefeito de Bagé coloca em risco a vida de jornalista investigativo’. Ao citar o caso, o comunicado registra o repúdio “do cerceamento da Liberdade de Imprensa e de qualquer tentativa de censura à produção de notícias”.
A manifestação ainda ressalta que, independentemente de questões políticas ou posicionamentos pessoais, tanto do prefeito, quanto do jornalista, o Sindjors tem o dever de se manifestar em defesa da categoria, quando atacada no seu bem mais precioso: a vida. “Um jornalista investigativo é especializado em desvendar e dar publicidade a fatos ocultos do conhecimento público, especialmente crimes e casos de corrupção ou irregularidades. Por esta razão, o profissional mantém preservada a sua identidade visual, uma vez que corre risco de represálias que podem ser de extrema violência.”
Confira a nota completa logo abaixo:
O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do RS – Sindjors e a Federação Nacional dos Jornalistas – Fenaj, diante da publicação de vídeo do prefeito de Bagé, Divaldo Pereira Lara (PTB), nas redes sociais, em que revela a identidade visual do repórter investigativo Giovani Grizotti, do grupo RBS, repudiam, veementemente, o cerceamento da Liberdade de Imprensa e de qualquer tentativa de censura à produção de notícias.
Assevera o art. 1º, do Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, da Federação Nacional dos Jornalistas – Fenaj, o direito fundamental do cidadão à informação, que abrange o direito do jornalista de informar, de ser informado e de ter acesso à informação; e, no art. 2º, afirma que, como o acesso à informação de relevante interesse público é um direito fundamental, os jornalistas não podem admitir que ele seja impedido por nenhum tipo de interesse. Feitas estas observações, o fato é que o vídeo do prefeito petebista responde a uma reportagem que denuncia supostas irregularidades, creditadas ao administrador municipal, a partir de delação premiada e investigada pelo jornalista. Anteriormente censurada, a reportagem produzida foi liberada pelo Supremo Tribunal Federal – STF, nesta semana, e veiculada por emissora do grupo. Não se avalia, aqui, o direito de o denunciado sentir-se injuriado. O que se questiona, com esta nota, é a forma como o fez o prefeito de Bagé, colocando em risco, deliberadamente, a integridade do jornalista, numa tentativa de censura a todo aquele que venha a investigar supostas irregularidades de personas públicas.
Diz o art. 6º do Código de Ética dos Jornalistas, que é nosso dever “[?]; II – divulgar os fatos e as informações de interesse público; III – lutar pela liberdade de pensamento e de expressão; IV – defender o livre exercício da profissão; [?]; VII – combater e denunciar todas as formas de corrupção, em especial quando exercidas com o objetivo de controlar a informação; [?]; XIV – combater a prática de perseguição ou discriminação por motivos sociais, econômicos, políticos, religiosos, de gênero, raciais, de orientação sexual, condição física ou mental, ou de qualquer outra natureza.
Independentemente de questões políticas ou posicionamentos pessoais, tanto do prefeito, quanto do jornalista, o Sindjors tem o dever de se manifestar em defesa da categoria, quando atacada no seu bem mais precioso: a vida. Um jornalista investigativo é especializado em desvendar e dar publicidade a fatos ocultos do conhecimento público, especialmente crimes e casos de corrupção ou irregularidades. Por esta razão, o profissional mantém preservada a sua identidade visual, uma vez que corre risco de represálias que podem ser de extrema violência. Vale lembrar o caso do jornalista Tim Lopes que, na madrugada do dia 02 de junho de 2002, foi torturado e morto enquanto realizava uma reportagem investigativa sobre tráfico de drogas e abuso de menores, no bairro da Penha, no Rio de Janeiro. O crime chocou o país e foi considerado como cerceamento à Liberdade de Imprensa.
Quando parte interessada de uma reportagem se sentir injustamente atacada, tem todo o direito de buscar, de forma legal, uma retratação. Salientando que, a esse respeito, o art. 11º, III, ressalva que o jornalista não pode divulgar informações “obtidas de maneira inadequada, por exemplo, com o uso de identidades falsas, câmeras escondidas ou microfones ocultos, salvo em casos de incontestável interesse público e quando esgotadas todas as outras possibilidades de apuração. Luís Gustavo G. C. de Carvalho (Direito de Informação e Liberdade de Expressão. Rio de Janeiro: Renovar, 1999), conceitua interesse público como: “A soma daqueles interesses superiores de uma dada sociedade na consecução dos objetivos comuns por ela tracejados em sua Constituição, no seu sistema legal e na sua cultura, no funcionamento normal e correto dos órgãos públicos a quem cometeu o exercício de funções para o alcance daquele fim e no regular exercício dos direitos consagrados aos cidadãos”.
Assim, o Sindjors e a Fenaj repudiam a atitude do prefeito Divaldo Pereira Lara, no referido vídeo, porquanto ataca um jornalista no seu direito ao livre exercício da profissão, ao de proteção à vida, dele e de sua família. Ao fazê-lo, também ataca a Liberdade de Imprensa, tão necessária à democracia e garantida na Constituição Federal de 1988. Uma Imprensa livre e ativa garante a informação e o desenvolvimento da sociedade. Não existe Democracia sem Jornalismo.
Sindicato dos Jornalistas Profissionais do RS – Sindjors
Federação Nacional dos Jornalistas – Fenaj
Relembre o caso:
Depois de quase cinco meses de censura prévia, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes derrubou a decisão imposta à reportagem da RBS TV, sobre uma delação premiada feita por um empresário ao Ministério Público (MP). O magistrado acatou o requerimento do Grupo RBS contra os veredictos da 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) e da 18ª Vara Cível da comarca de Porto Alegre, que haviam impedido de “realizar qualquer divulgação jornalística, por qualquer meio que seja, de informações ou vídeos”.
IMPORTANTE: Coletiva.net optou por não publicar o vídeo referido nesta matéria por entender que a divulgação do mesmo pode dar ainda mais visibilidade ao que se preserva, o direito do jornalista Giovani Grizotti de não querer mostrar seu rosto em suas produções profissionais.