08/03/2021
Precisamos mesmo dos vices?
Hélio Doyle e Ricardo Taffner
Deixemos de lado questões políticas ou pessoais: para que existem as figuras do vice-presidente da República, do vice-governador e do vice-prefeito? Para substituir os titulares, é claro, e para auxiliá-los em missões especiais, quando por eles convocados. Isso é o que diz a Constituição Federal e, em essência,as constituições estaduais e leis orgânicas do Distrito Federal e dos municípios. E por isso temos um vice-presidente da República, 27 vice-governadores e 5.570 vice-prefeitos.
Precisamos desses 5.598 vices? Eles exercem uma função essencial? O que fazem justifica e compensa os milhões de reais que saem dos cofres públicos para remunerá-los, manter seus funcionários, escritórios e residências oficiais, com mordomias e batalhão de seguranças?
Não, não precisamos dos vices. Ora, dirão, há vices em todos os países presidencialistas, a começar pelos Estados Unidos. Mas nos Estados Unidos, assim como na Argentina, o vice-presidente tem uma função importante, a de presidir o Senado, como era no Brasil até 1964, quando os vices deixaram de ser eleitos diretamente pelo voto e passaram a compor uma chapa.
Os vices são dispensáveis e custam muito caro ao país. A vice-presidência da República custou R$ 11,63 milhões em 2020. Com pagamento de pessoal foram mais de R$ 6 milhões. Quase R$ 1,5 milhão foram gastos em passagens e despesas de locomoção. Nesses R$ 11,63 milhões não estão as despesas com a manutenção da residência oficial, o Palácio do Jaburu, o que inclui a alimentação da família do vice-presidente, de seus convidados e dos que lá trabalham.
Os gastos se repetem com os vice-governadores e vice-prefeitos. O gabinete do vice-governador do Distrito Federal, por exemplo, gastou mais do que o do vice-presidente da República: R$ 11,98 milhões. O vice no DF dispõe de uma residência oficial na qual se prevê gastar R$ 122 mil, neste ano, com a compra de comidas e bebidas. Não é muito diferente nos estados e na maioria dos municípios, e acabar com a figura institucional dos vices possibilitaria ao país uma economia gigantesca. Os vices nada fazem que não possa ser feito por um ministro ou um secretário e, sem o cargo praticamente honorífico, poderiam assumir uma pasta nos governos ou prefeituras.
Os vices podem ser importantes para compor politicamente as chapas eleitorais, e por isso, geralmente, são de um partido e o titular é de outro. O vice faz contraponto ao titular: se um é do Norte, o outro é do Sul; um da periferia, um do centro, um homem e uma mulher, um idoso e um jovem. Mas, como nem sempre há afinidades entre eles, são inúmeros os episódios de atritos, desconfianças e crises entre o titular e seu vice, visto como alguém sempre conspirando, à espera de efetivamente cumprir o dispositivo constitucional.
Nos tempos atuais é possível governar mesmo quando se está longe do seu território. O presidente dos Estados Unidos, por exemplo, não passa o cargo para o vice quando sai do país.Além disso, pouquíssimos eleitores levam em conta quem é o vice ao votar, e muitos se sentem fraudados quando, por qualquer razão, ele assume a titularidade. A substituição temporária ou definitiva pode se dar de diversas formas, sem necessidade do vice. Uma delas: ao assumir, o presidente, o governador e o prefeito designam um ministro ou secretário para substitui-los em casos de afastamento temporário por viagem, férias ou doença.
Nos afastamentos definitivos do titular, os presidentes das câmaras e das assembleias assumem interinamente e são convocadas novas eleições, diretas ou indiretas, de acordo com a Constituição. Se o afastamento for longo, em decorrência de um processo, o Legislativo designa um substituto para o período. Se o titular abandona o cargo com menos de dois anos para se candidatar a outro, há nova eleição.
As figuras institucionais do vice-presidente, do vice-governador e do vice-prefeito se tornaram anacrônicas, dispensáveis e dispendiosas e, em alguns casos, perigosas. Ninguém sentirá a falta deles, muito menos os titulares.