A Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) anunciou a abertura oficial da investigação das condições da morte do jornalista Vladimir Herzog, morto por agentes da ditadura na sede do DOI-CODI do II Exército em São Paulo, na noite de 25 de outubro de 1975.
O Governo Federal Brasileiro recebeu na última terça-feira, 27 de março, a notificação da denúncia apresentada em julho do ano passado pela parceria entre o Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL), a Fundação Interamericana de Defesa dos Direitos Humanos (FIDDH), o Grupo Tortura Nunca Mais de São Paulo e o Centro Santo Dias de Direitos Humanos da Arquidiocese de São Paulo.
Em comunicado conjunto divulgado hoje, as entidades voltaram a criticar a omissão do Governo em seu dever de “investigar, processar e sancionar os responsáveis pelo assassinato de Vladimir Herzog”. Ainda no comunicado, elas destacaram a importância da notificação ao Estado brasileiro, na qual “os órgãos competentes são chamados tomar decisões que podem assegurar a manutenção do Estado Democrático de Direito, e a garantia da consolidação da democracia no Brasil.”
Versões
À época do assassinato do jornalista, a investigação do Governo Brasileiro concluiu que “Vladimir Herzog foi encontrado morto enforcado dentro da cela e tendo para isso se utilizado de uma tira de pano, na sala onde fora deixado”. A ABI foi uma das instituições que apoiaram a denúncia do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo.
A farsa foi desmantelada por testemunhas de companheiros de prisão de Herzog, como o jornalista e Conselheiro da ABI Rodolfo Konder. Em entrevista ao Jornal da ABI, (Novembro/Dezembro 2005) Konder conta que Herzog irritava os agentes que o interrogavam ao negar fazer parte do Partido Comunista Brasileiro (PCB).
Em seguida, após ouvir os gritos de dor da cela ao lado (de Herzog), Konder foi obrigado a ajudar Vlado a redigir uma confissão na qual dizia ter sido aliciado por ele próprio (Konder) a participar do PCB, e ainda delatava outras pessoas ligadas ao partido.
Anistia
Agora, o Supremo Tribunal Federal (STF) analisará recurso apresentado pela OAB, questionando a validade da Lei de Anistia. Pela primeira vez o STF se posicionará em relação ao tema depois da decisão da Corte Interamericana em novembro do ano passado, na qual ignorou a Lei e condenou o Brasil por não punir os responsáveis pelos crimes cometidos durante a ditadura militar (1964-1985).
Em 2010, o STF determinou que o Governo brasileiro não estaria obrigado a cumprir as decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos, pois os casos julgados na Corte já estariam cobertos pela Lei de Anistia.
Em
entrevista ao
ABI Online en julho de 2011, Beatriz Stella de Azevedo Affonso, Diretora do Cejil, esclareceu que a CIDH compreende como funciona a Lei de Anistia no Brasil (que beneficia torturados e torturadores) e não a reconhece. Isto deve abrir precedente para que outros crimes cometidos pelo Governo brasileiro no período da ditadura sejam investigados e julgados.
Segundo ela, a Corte tem conhecimento também da forma como os governos militares na época utilizavam-se de outros órgãos públicos para dar a aparência de legitimidade aos atos de tortura e outros crimes cometidos por alguns de seus agentes.
Na ocasião, Ivo Herzog, filho de Vlado, também falou sobre as contradições entre a legislação brasileira e a internacional:
— Quando o STF deu um veredicto contrário em 2010, aquilo na verdade foi um sinal para que se olhasse mais profundamente a nossa legislação de direitos humanos. As nossas leis não podem ir contra as leis internacionais. Fez-se uma interpretação obscura da Lei de Anistia, que foi de encontro aos interesses da sociedade, declarou.
Por e-mail, a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR) confirmou o recebimento do documento da Corte Interamericana, mas informou que a petição ainda está na fase inicial de trâmite e foi encaminhada para análise preliminar da Advocacia-Geral da União (AGU), para verificar a admissibilidade do caso.
*Com informações de O Globo