Morre no Rio o ex-ministro Wilson Fadul


19/10/2011


O ex-ministro da Saúde Wilson Fadul, 91 anos, morreu na manhã desta terça-feira, 18, de insuficiência cardíaca. Ele estava internado no hospital São Lucas, em Copacabana, zona sul do Rio, há cerca de 20 dias. O corpo foi velado nesta quarta-feira, 19, das 9h às 16h, no Salão Nobre da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. A cerimônia de cremação está marcada para quinta-feira, dia 20, cemitério do Caju, zona norte do Rio.

Wilson Fadul deixa três filhos, entre os quais o jornalista Wilson Fadul Filho, que presidiu a Comissão de Defesa da Liberdade de Expressão e dos Direitos Humanos da ABI, e é associado da entidade.

 
Wilson Fadul se formou em 1945, pela Faculdade Fluminense de Medicina, em Niterói. No ano seguinte, ingressou na Aeronáutica como segundo-tenente médico, tendo sido designado para servir no município de Campo Grande(MS), onde em 1950, foi eleito vereador na legenda do PTB.
 
Em 1952, foi eleito Presidente da Câmara Municipal, e no ano seguinte venceu as eleições para a Prefeitura de Campo Grande. Em 1954, conquistou a vaga de Deputado federal por Mato Grosso do Sul. Em outubro de 1958, foi reeleito para o cargo. Dois anos depois concorreu ao Governo do Estado Mato Grosso do Sul, sem sucesso.
 
Após a renúncia do Presidente Jânio Quadros, em 1961, Wilson Fadul passou a integrar a comissão encarregada de elaborar a Emenda Constitucional nº 4, que implantou o regime parlamentarista no País, adotado como forma conciliatória para permitir a posse do vice-presidente João Goulart, cujo nome era vetado pelos ministros militares.
 
Em setembro de 1962, Wilson Fadul votou pela antecipação do plebiscito – previsto para o início de 1965, porém realizado em janeiro de 1963 -, em defesa do regime presidencialista. Nas eleições de outubro de 1962, foi eleito para o terceiro mandato na Câmara dos Deputados, da qual se desligou em junho de 1963 para assumir o Ministério da Saúde, no Governo João Goulart.
 
Em sua gestão foi realizada uma grande pesquisa sobre a indústria farmacêutica no Brasil, que revelou índice de 95% de desnacionalização no setor. Com base no estudo, o Governo federal criou o Grupo Executivo da Indústria Farmacêutica Nacional, com o objetivo de defender a indústria nacional de medicamentos, proibir a importação de matéria-prima a preços acima do mercado, e incentivar a implantação de uma indústria química de base.
 
Após o golpe militar de 1964, Wilson Fadul foi demitido do Ministério da Saúde e reassumiu a vaga na Câmara dos Deputados. Em junho de 1964, teve o mandato cassado e os direitos políticos suspensos por dez anos, pelo Ato Institucional nº 1 (AI-1).
 
Neste período, Wilson Fadul ajudou a fundar a Frente Ampla, movimento de resistência à ditadura, e foi o interlocutor de Jango no exílio. Após o decreto do Ato Institucional nº 5, seguiu para a França, onde estudou Filosofia.
 
No final da década de 70, com a aprovação da Anistia e o fim do bipartidarismo, Wilson Fadul retornou ao Brasil e foi um dos fundadores do PDT de Leonel Brizola, tendo sido designado a estabelecer o partido no Mato Grosso do Sul, Estado pelo qual se candidatou ao Governo em novembro de 1982.
 
De volta ao Rio de Janeiro, foi vice-presidente do Banco do Estado do Rio de Janeiro (Banerj) entre 1984 e 1987, no primeiro mandato de Leonel Brizola no Governo do Rio, e Presidente da instituição financeira, entre 1991 e 1994, no segundo mandato do pedetista.
 
No dia 2 de maio de 2011, Wilson Fadul foi homenageado na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul, por proposição do Deputado estadual Felipe Orro (PDT), com a Comenda do Mérito do Trabalho, pela honrosa trajetória cívica em defesa das liberdades e da democracia.

“Wilson Fadul”

Por José do Vale Pinheiro Feitosa e Wilson Fadul Filho
 
“Hoje, 18 de outubro de 2011, às sete horas da manhã, rachou-se a estrutura sólida do mundo bio-psicoquímico e cibernético desta era. A era ainda colada à metafísica da dualidade humana do corpo e da alma. A era que mecanizou a alma em mente e a tornou apenas a função de performance na produção capitalista.

Naquelas primeiras horas da manhã, aqui no Rio de Janeiro, numa Casa de Saúde, assistido pela mecânica de aparelhos médicos digitais, morria o médico e político brasileiro Wilson Fadul. Morria em consequência de um procedimento médico justificado pela necessidade de salvar-lhe a vida. Pediu para sair dali, estava cansado, queria ir para casa. A casa que é o princípio a negar a tal estrutura sólida com a qual comecei este texto.

Antes do atestado de morte cerebral, tivera uma parada cardíaca, certamente foi “ressuscitado” e ficou em coma profundo até o ato de retirada dos aparelhos e quando a família recebe a notícia. Naturalmente entre o “negócio” de solubilidade do corpo, as razões sociais e principalmente políticas toda a família se mobiliza pelo resto do dia.

Além da notação histórica o que interessa é este homem e tudo que mobilizou num longo processo de existência no movimento. Ora como movimento da existência e noutra com a existência no movimento. Por isso mesmo é história: o mundo Greco-romano, a civilização ocidental, o sentido tribal de suas origens árabes, as fazendas de café do novo mundo e um profundo respeito pelo mundo francês do século XX.

Wilson Fadul nascido em fevereiro de 1920, como ele disse: eu nasci…na estação da estrada de ferro Sul de Minas, que não existe mais. Isso em Conservatória, distrito de Valença no Rio de Janeiro. Fadul, com mais de 91 anos de idade, falava de sua história, do mundo e do pensamento humano como de fato somos os humanos: um todo não mecânico. Dessa  forma ele rechaçou peremptoriamente a visão de um mundo petrificado e pasteurizado imposto pela mídia desta pós-modernidade vazia.

Naquela idade, isso ainda foi há menos de uma semana, ele não dependia da bioquímica cerebral, das teorias que articulam computadores com a malha neuronal e nem do sistema circulatório para expressar a existência. Nenhum sinal demente ou qualquer atributo perfomático que reduz a idade avançada a um mero desempenho.

Na verdade ele viveu intensamente o século XX. Viveu num Brasil monopolista do café até um país industrializado, diversificado e urbano. Fez jornadas incríveis no pantanal de Mato Grosso do Sul, em pastagens de bovinos selvagens e perigosos e com água na cintura em coleções compartilhadas com sucuris enormes. Andou e foi alvo de grandes manifestações nas colinas do Líbano e passeou pelas paragens italianas em busca do passado romano.

Ele viveu o ambiente essencialmente político do Rio de Janeiro, desde as escaramuças da UDN para derrubar Getúlio e Juscelino até a transferência para Brasília. Conviveu com Flores da Cunha e todas as tardes até certas horas da noite estavam numa roda de convivência da elite política do Rio de Janeiro na casa de Osvaldo Aranha. Foi contemporâneo de todos os políticos da UDN, PSD e PTB dos anos 50 até os tempos da ARENA e do PMDB. Tinha apreço enorme pela memória de Santiago Dantas, com quem trocava análises com frequência.

Fadul junto com Ênio da Silveira, Edmundo Muniz e outros companheiros fundaram a Editora Paz e Terra que tantas publicações interessantes traduziu no Brasil na época da ditadura. Ele foi um dos grandes artífices da Frente Ampla que conseguiu juntar Jango, Juscelino e Lacerda contra o regime militar. Estava se preparando para um almoço com Rubens Paiva quando foi avisado por José Aparecido que ele havia sido preso pela ditadura.

Toda esta história e muitos fatos ainda não publicados sobre os acontecidos nos bastidores da política de então nos foram revelados em longas tardes de gravações. E com tal riqueza de detalhes, datas e citações, testadas por outras fontes que, enfim nos remete para o que apontamos no início. O ser humano não é esta dualidade mecânica de corpo e mente, ele é uma dinâmica histórica, interativa e construtiva de uma realidade que ao mesmo tempo o empurra e é empurrada por ele.”