Maracangalha homenageia jornalista autor do Febeapá-Festival de besteira que assola o país


18/02/2023


Por Maria Luiza Busse,  diretora de Cultura da ABI

O centenário do carioquíssimo jornalista e escritor Sergio Porto é enredo do Grêmio Recreativo Bloco Carnavalesco Maracangalha , bloco sem corda e patrocínio fundado em 2003 com o singelo prazer de brincar o carnaval. Na volta do recesso compulsório por causa da pandemia, comemora 20 anos homenageando os 100 do criador de Stanislaw Ponte Preta, heterônimo com o qual o Sergio Porto, nascido e estabelecido em Copacabana, zona Sul, falava sobre personagens da Borda do Mato, o bairro do Grajaú, zona norte da cidade.

‘Febeapá-Festival de besteira que assola o país’, é um dos seus 14 livros produzidos até morrer em 1968, aos 45 anos, vítima de infarto fulminante. Sergio era um reconhecido cronista de costumes que o golpe de 1964 empurrou para a crítica política de combate sagaz contra a opressão e em favor da democracia. O Stanislaw repórter dos modos e maneiras de ser do carioca, ampliou o posto de observação para colocar o humor sarcástico a serviço de denunciar a sucessão de ignorância e absurdos que é a marca do proceder de ditadores. Passou, então, os últimos anos de vida a recolher o que não se supunha crível e lançou em 1966 a primeira das três edições do Febeapá.

 

 

 

 

 

 

 

 

De acordo com Claudia Mesquita, historiadora especialista na obra do jornalista, “Sérgio Porto e o seu heterônimo Stanislaw Ponte Preta, ajudaram a revolucionar a moderna imprensa brasileira dos anos de 1950 e 1960. Pioneiro na associação entre humor, corpo feminino, e crítica política, o criador das “Certinhas do Lalau”, dos Febeapás, e da hilariante Família Ponte Preta, iniciou sua carreira com Aparício Torelly, o Barão de Itararé, na Folha do Povo, criou o Stanislaw, no Diário Carioca, e integrou com Antônio Maria e Nelson Rodrigues, o chamado “Big Three” da imprensa carioca no Diário da Noite. Porém, foi no jornal Última Hora, no qual assinou coluna diária por treze anos consecutivos, que Stanislaw Ponte Preta conquistou um público fiel de leitores no Rio de Janeiro e em todo o Brasil, tornando-se também um ídolo para os “coleguinhas” da imprensa com o seu humor “politicamente incorreto”, seguido pela geração de O Pasquim. Embora tenha atuado em todos os meios de comunicação disponíveis em sua época, como rádio, cinema, televisão, Sérgio Porto se autodefinia como um jornalista”,disse a pesquisadora quando da sua participação no seminário Pensar a Imprensa, realizado na Fundação Casa de Rui Barbosa.

Aqui, algumas passagens do livro que poderiam ter sido extraídas de acontecimentos dos últimos quatro anos:

“Quando aquele cavalheiro nervoso entrou no hospital dizendo ‘eu sou coronel, eu sou coronel’, o médico tirou o estetoscópio do ouvido e quis saber: ‘Fora esse, de que outro mal o senhor se queixa?’

“Foi então que estreou no Teatro Municipal de São Paulo a peça clássica ‘Electra’, tendo comparecido ao local alguns agentes do DOPS para prender Sófocles, autor da peça e acusado de subversão, mas já falecido em 406 A.C…”

“Quando a Censura Federal proibiu em Brasília a encenação da peça Um Bonde Chamado Desejo, a atriz Maria Fernanda foi procurar o Deputado Ernani Sátiro para que o mesmo agisse em defesa da classe teatral. Lá pelas tantas, a atriz deu um grito de ‘viva a Democracia’. O senhor Ernani Sátiro na mesma hora retrucou: ‘Insulto eu não tolero’ “. 

“Em Campos (RJ) ocorreu um fato espantoso: a Associação Comercial da cidade organizou um júri simbólico de Adolph Hitler, sob o patrocínio do Diretório Acadêmico da Faculdade de Direito. Ao final do julgamento, Hitler foi absolvido”.

“O Instituto Nacional de Previdência Social […] baixou uma circular prevendo o seguinte: se o senhor é segurado do INPS, não tem certidão de casamento, mas necessita de maternidade para sua mulher ter filho, terá que fazer o pedido com trezentos dias de antecedência, conforme o regulamento previdenciário. Mas como o período de gestação é de apenas duzentos e setenta dias — o que dá nove meses — o senhor deve dar uma passadinha lá no INPS trinta dias antes de pensar em fazer qualquer coisa”

“O professor Raul Pitanga, com setenta anos de idade, anuncia algo assombroso: conseguiu descobrir a cura para o homossexualismo. O professor vai comparecer nos próximos dias à Academia Brasileira de Medicina para explicar que o homossexualismo é uma doença curável. […] O professor septuagenário tem toda razão. O problema é a recaída”.

Sérgio e Dirce Pimentel de Araújo tiveram três filhas, Gisela, Solange, e a historiadora Angela Porto que participa do Maracangalha e assina o estandarte que homenageia seu pai. O bloco concentra domingo, dia 19/2, às 17h, na Cobal do Humaitá, Rio de Janeiro.