08/03/2009
O jornalista Rodolfo Konder aceitou o convite da Diretoria da ABI e assumiu a coordenação da atividades da Representação da Casa em São Paulo, em substituição ao companheiro Audálio Dantas, que renunciou em 15 de dezembro passado ao cargo de Vice-Presidente da ABI nacional e de Presidente da Representação da ABI em São Paulo. Konder é membro do Conselho Deliberativo da ABI, para o qual foi eleito em abril de 2008 para um mandato de três anos. Nascido em Natal, RN, e criado no Rio de Janeiro, Konder radicou-se em São Paulo em 1968, quando começou a trabalhar como um dos editores da revista Realidade, da Editora Abril.
Considerado um dos mais qualificados profissionais da imprensa do País, Konder foi repórter, editor, editorialista, diretor de publicações, articulista e cronista de jornais e revistas do Brasil e do exterior. Escritor laureado em 2001 com o Prêmio Jabuti pelo livro “Hóspede da Solidão“, publicou 20 livros de contos, crônicas e memórias. Conselheiro da União Brasileira de Escritores no período 2002-2004, de janeiro de 1993 a dezembro de 2000 foi Secretário de Cultura do Município de São Paulo, integrou o Conselho da Fundação Padre Anchieta, instituição mantenedora da TV Cultura de São Paulo, e a Diretoria da Bienal de São Paulo. Coube-lhe presidir a Comissão Municipal de São Paulo para as Comemorações dos 500 Anos do Descobrimento do Brasil. Devotado integralmente ao jornalismo, à educação e à cultura, foi Diretor do Museu de Arte de São Paulo-Masp e Diretor Cultural da UniFMU-Faculdades Metropolitanas Unidas, cargo de que se afastou em fevereiro passado, pouco antes de assumir a direção das atividades da ABI em São Paulo.
Além da participação na revista Realidade, o invejável currículo de jornalista de Konder inclui a participação como editor ou diretor de outras revistas, como Singular e Plural , Visão, IstoÉ, Afinal e Nova, na qual, após ser admitido como redator, dirigiu uma redação só de mulheres, o que o levou a registrar, com humor e irreverência, que se sentia então o bendito fruto entre as mulheres. Foi também colaborador de Playboy, Revista da Hebraica e Época, assim como de O Estado de S.Paulo, no qual publicou artigos e crônicas durante dez anos.
Pioneiro do jornalismo multimídia, Konder trabalhou não apenas em veículos impressos, mas também em emissoras de rádio e televisão, entre as quais a Rádio Canadá, de Montreal, à qual esteve vinculado durante dois anos. Durante quatro anos, foi editor-chefe e apresentador do Jornal da Cultura, da TV Cultura de São Paulo, na qual, posteriormente, lia diariamente um texto sob o título Sabor da Crônica até o começo da gestão do jornalista Paulo Markun como diretor da emissora, em 2008. Após a posse de Franco Montoro como Governador do Estado de São Paulo, em 1983, trabalhou durante um ano como Coordenador de Difusão da Secretaria de Comunicação do Estado, atualmente extinta.
Professor de Jornalismo da Fundação Armando Álvares Penteado-Faap durante cinco anos e diretor durante um ano das Faculdades Integradas Alcântara Machado-Fiam, Konder foi Diretor Cultural da UniFMU durante oito anos. Como articulista e cronista, publicou textos em Movimento, O Diário, Voz da Unidade, Folha de S. Paulo, Jornal da Tarde, Gazeta Mercantil, Diário Popular, Pasquim, O Paiz, História, Versus, Opinião, Povos e Países, Jornal do Brasil, Jornal da Semana, Leia Livros, Shopping News, Américas, Shalom e, atualmente, Linguagem Viva. No exterior, publicou textos em La Calle e Clarín, de Buenos Aires, Argentina. Poucos jornalistas do País têm currículo tão denso e fecundo.
A par da atuação profissional, Konder teve intensa militância política, que o expôs desde muito jovem a perseguições e provações de todo tipo. Diretor do Sindicato dos Petroleiros do antigo Estado da Guanabara na época da implantação da ditadura militar de 1964-1985, teve de se exilar logo após o golpe; viveu entre 1964 e 1965 no Uruguai e, depois, no México. Após o assassinato do jornalista Vladimir Herzog nas masmorras do Doi-Codi de São Paulo, em 25 de outubro de 1975, teve de partir para novo exílio, que se estendeu de 1976 a 1978, no Canadá e nos Estados Unidos.
Assim como outros jornalistas acusados de militantes do Partido Comunista Brasileiro-PCB, Konder estava preso no Doi-Codi quando Herzog, ameaçado de prisão se não o fizesse, apresentou-se para depor nesse órgão de repressão; horas depois estava morto. Como uma das últimas pessoas a ver Herzog com vida, Konder prestou um depoimento fundamental para o desmonte da farsa montada pelo II Exército, que tentou apresentar a morte do jornalista como suicídio e com esse fim chegou a produzir e distribuir uma grosseira imagem com a simulação da morte de Herzog por enforcamento. Após a corajosa denúncia sobre os momentos finais de Vlado, como Herzog era chamado pelos companheiros, Konder teve de deixar o Brasil mais uma vez.
Em depoimento sob o título “Fragmentos comunistas”, publicado no volume “Outras faces de Herzog”, editado por alunos de uma faculdade de Comunicação do Estado de São Paulo, Konder narrou assim esses momentos dolorosos:
“Em pleno sábado, dia 25 de outubro daquele ano, Vlado estava no Doi-Codi, trilhando seu caminho para a tortura e uma morte covarde, cruel e sangrenta.
Na delegacia, fiquei numa cela ao lado da dele. Num determinado momento, obrigaram Vlado a assinar um documento. Diante da negativa dele de assiná-lo, os policiais não pensaram duas vezes e partiram para a força bruta. Vlado teve seu crânio batido no parapeito da cela e nós ouvíamos os gritos vindos também das entranhas dele. Porque os gritos de tortura são diferentes dos gritos de dor. E depois veio um silêncio profundo e, ao mesmo tempo, torturante.
Eu e outros presos estávamos na sala do andar térreo quando Herzog foi morto. Algum tempo depois, fomos transferidos para o andar de cima do Doi-Coi para reconhecer algumas fotos. Mas isso foi uma manobra para que pudessem transportar o corpo de Vlado sem que víssemos. Na versão ‘oficial’, Vlado havia se suicidado.
No dia seguinte, o comandante chamou apenas a nós jornalistas e não só nos informou sobre o ‘suicídio’, como também afirmou que Herzog era um agente da KGB, o que era absurdo.
No enterro, não fiquei muito tempo. Havia saído do Doi-Codi muito sujo após uma sessão de tortura com choques elétricos em várias partes do corpo. Mas pude sentir a dor dos presentes no pouco tempo em que permaneci ali.
O rabino Henry Sobel não quis enterrar Herzog no cemitério ao lado dos suicidas. Foi a primeira demonstração pública de que Vlado foi assassinado e não se suicidou. Uma posição contrária à primeira versão divulgada oficialmente.
Depois de algum tempo, fugi para um exílio de três anos. Fiquei em três países: Peru, Canadá e Estados Unidos (Nova York).
Após esse período, deixei a militância do PCB e parti para a busca dos direitos humanos. Sinto traumas após tudo o que sofri na repressão, mas consegui superar tudo com o exercício do jornalismo e a publicação de 19 livros. Minha psicanalista foi a literatura.”
Após retornar do segundo exílio, em 1978, Konder foi um dos fundadores da Seção Brasileira da Anistia Internacional, de que foi Vice-Presidente e, depois, Presidente, nos anos 80. A serviço da Anistia Internacional, participou de vários congressos no Brasil e no exterior e cumpriu missões diplomáticas na Guatemala e nos Estados Unidos.
A dramática trajetória de Rodolfo Konder, assim como sua infância e adolescência em Ipanema, está presente na densa obra que publicou, composta por estes livros: “Cadeia para os Mortos”; “Tempo de Ameaça”; “Comando das Trevas”; “De Volta, os Canibais”; “Anistia Interncional: Uma Porta para o Futuro”; “O Veterano de Guerra”; “Palavras Aladas”; “O Rio da Nossa Loucura”; “As Portas do Tempo”; “A Memória e o Esquecimento”; “A Palavra e o Sonho”; “Hóspede da Solidão”; “Labirintos de Pedra”; “Rastros na Neve”; “Sombras no Espelho”; “Cassados e Caçados”; “Agonia e Morte de um Comunista”; “A Invasão”; “As Areias de Ontem”. Além desses volumes, tem no prelo mais uma obra: “Educar é Libertar”.
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