Justiça volta a condenar jornalista por publicação de texto ficcional


Por Igor Waltz*

03/12/2014


José Cristian Goés (Foto: Reprodução Sindijor)

José Cristian Goés (Foto: Reprodução Sindijor)

Uma nova sentença condenou o jornalista Cristian Góes a pagar indenização de R$30 mil ao desembargador Edson Ulisses, vice-presidente do Tribunal de Justiça de Sergipe, a título de indenização por danos morais. O juiz Aldo de Albuquerque Mello, da 7ª Vara Cível de Aracaju (SE), condenou o jornalista na última sexta-feira, dia 28, pela crônica “Eu, o coronel em mim”, considerada ofensiva ao desembargador e a “todo o Poder Judiciário”. Em 2013, Góes já havia sido sentenciado a sete meses e meio de prisão, e a pena revertida em prestação de serviços à comunidade.

O texto, publicado em um blog em maio de 2012, é uma narrativa em primeira pessoa sobre um homem da época do coronelismo brasileiro que ainda hoje tem influência política e social no sertão. O texto faz uma referência a um “jagunço das leis” que atende ao “coronel”. O desembargador e o Ministério Público entenderam que o jornalista se referia ao governador de Sergipe, Marcelo Déda, já falecido, como sendo o “coronel”, e Edson Ulisses, cunhado do governador e escolhido por ele para o cargo de desembargador, como o “jagunço”.

Na sentença criminal, o Tribunal de Justiça confirmou a condenação do jornalista à prisão por ter escrito essa crônica, usando o argumento que não precisa dizer nomes e nem usar qualquer identificação, basta “meia palavra”.

Por meio de seu advogado, Góes diz que vai recorrer das decisões. “São duas sentenças absurdas sob todos os aspectos. O texto é literário e nele não há nem nome de pessoas e nem fato real. Os julgamentos não tiveram a mínima isenção. Não houve o pleno direito de defesa. Os procedimentos foram parciais, políticos, irregulares e ilegais”, declarou o jornalista.

Segundo o jornalista, as ações são uma clara demonstração do atraso, autoritarismo, das relações de compadrio, da sensação de poder absoluto que alguns têm e que pensam que são Deus. “É um claro e direto ataque à liberdade de expressão”, disse Góes, que chama atenção para o teor da sentença do juiz que pode soar como ameaça ao direito à expressão de outras pessoas.

Na decisão, o magistrado diz que a condenação não é uma “imposição de vingança”, mas um ato para “educar o agressor”, um exemplo e um desestímulo para que não se cometa o mesmo crime depois.

A perseguição judicial vem se tornando um entrave à liberdade de imprensa no Brasil. Organizações internacionais já alertaram para o risco de censura togada. Os mais recentes relatórios da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) e do Comitê de Proteção a Jornalistas (CPJ) demonstram preocupação com o uso de tribunais como instrumentos de censura a jornalistas no Brasil. Para a Artigo 19, que acompanha o caso do Cristian Góes desde seu início, ele é só um exemplo dos problemas que os crimes contra honra causam ao direito de liberdade de expressão no país.

*Com informações do Portal Imprensa, do Centro Knight para o Jornalismo nas Américas e ONG Artigo 19.