24/03/2019
Ao longo dos seus 110 anos de existência sempre ocorreram querelas jurídicas entre associados, diretores, e membros dos diferentes órgãos que compõem o comando da ABI. Quase todos os litígios se dissolveram sem a intervenção do Judiciário. As divergências, em sua grande maioria, nunca extrapolavam as paredes do prédio, eram discutidas internamente para preservar a imagem da instituição. As questões mais acaloradas sempre eram submetidas à apreciação do Conselho Deliberativo, órgão superior da administração da Casa dos Jornalistas. Mesmo àquelas contendas que buscaram o suporte judiciário não ousaram a desafiar a soberania da Casa. Não há notícia, desde 1908, de que um diretor da ABI tenha recorrido à justiça para obter regalias e benefícios pessoais, ao arrepio dos regramentos internos, em detrimento dos seus pares e do corpo social.
O que ocorreu recentemente merece profunda reflexão. Como pode um diretor da ABI, no exercício de uma posição respeitável, utilizar-se à sorrelfa de expedientes escusos contra os seus próprios companheiros de Diretoria? Quem perde ao se utilizar de métodos legal e moralmente inaceitáveis para usufruir vantagens diante do habito de conquistá-las a qualquer preço ? O velho Tancredo Neves, em sua sabedoria política, dizia sempre que quando a esperteza era grande demais, comia o dono.
Através de um ato de litigância de má fé, o vice da ABI teve a petulância de induzir a erro a juíza da 41ª Vara Cível. A manobra destinava-se a obter uma liminar com o objetivo de conseguir a relação dos associados da entidade e deflagrar a campanha sucessória, antes da formação da Comissão Eleitoral e da publicação do Edital.
No processo movido contra a ABI e seu presidente, iniciado em 2 de fevereiro, o vice alegou não ter acesso aos endereços dos membros da comissão que preside, o que o teria levado a se socorrer do JUDICIÁRIO. Dava a entender que seus direitos estavam sendo garroteados pelo arbítrio. Na petição inicial, sustentava que o presidente da ABI solapava a oposição com um comportamento autoritário e antidemocrático. Ao recusar-se a fornecer a listagem do corpo social, com os respectivos telefones, endereços eletrônicos e individuais , o presidente da Entidade “impossibilitava a formação de chapas oposicionistas”.
Ao protocolar a petição, nos primeiros dias de fevereiro, não existia nenhuma eleição em curso. Não havia sequer Comissão Eleitoral, cuja função é fiscalizar a formação das chapas e homologá-las, como determina o Art. 5º do Regulamento Eleitoral. Só assim poderiam ser habilitadas a participar do pleito marcado para 28 de abril. Nem mesmo o Edital de Convocação das Eleições tinha sido publicado pela imprensa. A veiculação do Edital só ocorreria no dia 23 de março. Vinte um dias antes de conhecido o Edital, o vice-presidente da ABI apresentava-se em juízo como vítima de inominável perfídia.
No seu arrazoado, sustentava que o Comando da Casa exibia um comportamento incompatível com o regime democrático. De acordo com os queixumes do vice, a atitude do presidente da ABI ofendia a paridade entre os candidatos ao pleito eleitoral, ao contrariar o Art. 53 do Código Civil que determinava aos associados ” terem direitos iguais “. Esse muxôxo era uma falácia.
O processo contra a ABI abrigava em seu ventre algumas incongruências. Como foi possível, por exemplo, o vice obter duas tutelas, de “urgência e de tutela“, o que fere a boa prática processual, para garantir a isonomia associativa quando não havia nenhuma eleição em curso ? O advogado do vice, utilizou-se de dois institutos jurídicos que sequer se completam, mas assim mesmo teve seu pedido acolhido pela 41ª Vara Civil.
Na esteira dos requisitos que autorizam a concessão da tutela antecipada, o magistrado deveria avalizar a probabilidade de ter realmente acontecido o fato narrado, a obstrução dos direitos do vice, bem como a sua plausibilidade jurídica. Não foi o que aconteceu, o que acentuou ainda mais o equívoco da decisão judicial. A juíza não percebeu que não existia nenhuma campanha eleitoral em andamento. Sequer havia sido formada a Comissão Eleitoral e publicado o Edital de Convocação das Eleições, como rezam os Artigos 5º, 6º, 7º, 19º e 20º do Regulamento Eleitoral.
Como não existiam chapas homologadas pela Comissão Eleitoral não havia, portanto, direitos ofendidos. O único arremedo de chapa que se encontrava em campanha, antecipando-se aos prazos do regramento da ABI era a do vice, que se tem reunido regularmente com seus seguidores em dependências da própria Entidade.
A concessão precoce da listagem do corpo social ao vice, por decisão judicial, se insurge contra o Regulamento Eleitoral e ao próprio Estatuto da Casa, que se encontram em vigor há 15 anos. Não podia o vice oferecer também restrições ao texto do RE, depois de se ter beneficiado das suas regras, nas duas últimas eleições. É também inaceitável que ele tenha condenado intempestivamente os diplomas que regem as eleições da instituição desde 2004.
O pacote de vontades do vice, além de rasgar os principais documentos da Entidade com anuência do Judiciário, o que jamais aconteceu em seus 110 anos de existência, ainda atropela, despreza e ignora a soberania do Conselho Deliberativo da ABI. Ofende também o jornalista Luís Carlos Azêdo, presidente do CD, ao se referir a ele desrespeitosamente como “engavetador” .
A decisão de 1ª instância, na contramão do que recomenda a boa prática do Direito, deixou-se contaminar pelas volições do vice, ansioso em deflagrar o processo eleitoral antes do prazo legal, proclamando-se publicamente como porta-voz da oposição. Nada justifica que sejam afrontados os valores e princípios que sempre nortearam uma instituição democrática como a ABI, cuja história se confunde com a do próprio País.
O relator do agravo deixou-se igualmente viciar pelo entendimento inconsistente da 41ª Vara Cível. A sua decisão aprimorou ainda mais o despacho equivocado de primeira instância, esquecendo-se de que o processo eleitoral sequer havia começado. Sua Excelência faz uma interpretação ainda mais enevoada do Art. 55 do Código Civil que prega a igualdade entre as partes. Justamente em prestígio a esse artigo, entre outros, que jamais poderia-se ignorar o texto do Regulamento Eleitoral, que põe todos em condições paritárias, valorizando o associado que a duras penas paga a mensalidade associativa.
O presidente da ABI em nenhum momento defendeu a desigualdade entre os associados, apenas exigiu que fossem respeitadas e cumpridas as normas em vigor desde 2004. Regras que foram violadas pelo vice em seu próprio beneficio, ao solicitar que a justiça obrigasse a ABI a fornecer a listagem dos associados, antes de iniciado o prazo legal para a campanha eleitoral. A decisão atrapalhada do judiciário encontra-se atualmente subjudice, após o pedido de agravo interno impetrado pela ABI. Mesmo diante desse recurso, o estrago maior já está feito, como se a toga funcionasse também como capuz.