O testemunho do fotógrafo Sérgio Vital Tafner Jorge acabou com a farsa montada pelos militares sobre a morte do guerrilheiro Carlos Marighella, executado a tiros disparados por agentes da ditadura militar (1964-1985), na noite de 4 de novembro de 1969.
“Eu vi os policiais colocando o corpo dele no banco de trás do carro”, revelou o fotógrafo que fez o registro de Marighella depois de morto. O depoimento foi dado à revista IstoÉ e publicado com exclusividade na edição nº 2208, ano 36, que circulou nesta terça-feira, 7 de março.
A história de Sérgio desmontou a versão dos militares para a forma como se deu o assassinato Carlos Marighella. Líder da Ação Libertadora Nacional (ALN) e considerado inimigo número 1 do Governo da ditadura, de acordo com a revista ele foi metralhado em uma emboscada na Alameda Casa Branca, no bairro dos Jardins, em São Paulo.
Segundo a reportagem, na versão dos militares “o guerrilheiro fora atraído para um ‘ponto’ com religiosos dominicanos simpatizantes da ALN e trocara tiros com os agentes que varejavam o local do encontro”.
Sérgio nessa época estava com 33 anos e era fotógrafo da revistas Manchete. Ele fotografou Marighella estirado no banco traseiro do fusca dos dominicanos. “Barriga à mostra, calça aberta, dois filetes de sangue escorrendo pelo rosto”, conforme assinala um trecho da matéria.
O fotojornalista atualmente está com 75 anos de idade, e disse à IstoÉ que toda a cena de Marighella morto “foi uma farsa”. Ele disse à reportagem que resolveu contar a verdade depois que soube que o também fotógrafo Silvaldo Leung Vieira revelou à Folha de S.Paulo, em 5 de janeiro, que a sua foto usada pelo Exército como prova do suicídio de Wladimir Herzog, nas dependências do DOI-Codi paulista, era uma “encenação criada pelos militares”.
Sérgio contou ao repórter Alan Rodrigues que se sentia incomodado com em não contar a verdade, e que passados 40 anos do acontecimento “vi que tinha chegado a hora de contar. O Brasil mudou”.
A operação que resultou na morte de Marighella foi conduzida pelo então delegado linha dura Sérgio Paranhos Fleury. Sérgio Vital e outros colegas fotojornalistas chegaram ao local aproximadamente às 20h, mas foram impedidos de documentar a cena. “Não quero ouvir nenhum clique! Todos encostados no muro, com as máquinas no chão!”, teria ordenado aos fotógrafos o delegado, um dos mais temidos agentes da ditadura.
Segundo relato do fotógrafo, Marighella estava no banco da frente do fusca, com uma perna dentro e outra fora do carro; os dois braços estavam caídos e não havia quase registro de sangue em sua roupa. Seu corpo foi colocado no banco de trás do automóvel por três policiais, só então os fotógrafos foram autorizados a fazer os registros.
A intenção de Sérgio é relatar essa história à Comissão da Verdade. Para provar que a versão dos militares para a morte de Marighella foi uma “armação”, voltou ao local onde o guerrilheiro foi executado e, com a ajuda de um amigo, fez uma reprodução da cena que presenciou há 40 anos.
* Com informações da IstoÉ.