Imprensa e gastronomia perdem um crítico refinado

Com a morte do jornalista Saul Galvão (1942-2009), de câncer, aos 67 anos de idade, a gastronomia perdeu um dos seus mais refinados colunistas. Durante 30 anos, ele foi um guia completo dos melhores vinhos e cardápios que conheceu, no Brasil e no exterior, para o prazer dos leitores do Jornal da Tarde e do Estadão.

Saul morreu no mês de setembro, em São Paulo. Trabalhava para o Grupo Estado desde 1965, onde até julho deste ano assinava uma coluna sobre vinhos no caderno “Paladar” do Estadão. Deixou uma vasta produção de livros, com dicas de restaurantes, bebidas e receitas de comidas, incluindo os seus pratos prediletos.

Saul Galvão ingressou no jornalismo após abandonar o curso de Direito da USP, para trabalhar como repórter nos veículos do Grupo Estado, tendo se destacado nas áreas de política e internacional. Sua matéria de estréia sobre gastronomia ocorreu no Jornal da Tarde, em 1978, quando passou a substituir o jornalista Paulo Cotrim, um dos precursores da crítica gastronômica em São Paulo.

Companheiro de Galvão na Faculdade de Direito da USP e no Estadão nos anos 60, Quartim de Moraes disse que um dos traços mais marcantes do amigo era a generosidade. Um crítico que só publicava comentários construtivos: “Se ele detestasse um restaurante ou um novo vinho, jamais publicava uma crítica demolidora”, escreveu Quatrim sobre Saul Galvão para uma edição especial do Caderno “Paladar”, do Estadão, que o homenageou. “Não quero prejudicar ninguém. Se não tenho nada de bom a dizer, prefiro simplesmente não dizer nada”, segundo Quatrim de Moraes era assim que Saul Galvão justificava a ausência de comentários sobre aquilo que não gostava.

Receitas

Além do estilo e paladar refinados, Saul Galvão também é lembrado pelos amigos pelos seus pratos prediletos. Natural de Jaú — cidade do interior paulista, localizada a 304 quilômetros da capital —, costumava dizer que “leitoa na minha casa é uma espécie de prato do dia”. Conta o amigo Dias Lopes que esse prato favorito geralmente era degustado na casa de dona Sila, sua mãe, “nos almoços de Ano Novo e outras comemorações familiares”.

Saul gostava tanto de saborear um prato de leitoa assada que, morando em São Paulo, o encomendava por telefone e se lançava na estrada para ir saboreá-lo em companhia da família em Jaú. Para aqueles que desejam saborear os pratos preferidos de Saul disponibilizamos as receitas:

Leitoa a passarinho

Cortar a leitoa em pedaços pequenos,
como se fosse um frango a passarinho, e temperada na véspera
em vinha d’alho (alho, vinho tinto e temperos verdes).
Vai para a panela com vinha d’alho até estar cozida.
Antes de tirar do fogo, joga-se gordura fervendo para
deixar a pele pururuca.

Arroz de forno

Este prato não tem nada a ver
Com o risoto italiano. É feito
Com arroz branco, já pronto.
É só preparar um molho de
Tomate bem temperado, com
Ervilhas e camarões, misturar
Ao arroz e colocar num pirex.
Pouco antes de servir, polvilhar
Queijo ralado e levar ao forno
para aquecer.

Nouvelle cuisine 

De acordo com o também crítico gastronômico Josimar Melo, Saul Galvão “era apaixonado pela cozinha e chegou a fazer estágios na França, nos restaurantes dos estrelados chefs Pierre Troisgros e Roger Vergé, luminares da nouvelle cuisine francesa, nos anos 1980”. 

Dentre as obras que publicou como crítico e enólogo figuram dois excelentes guias de receitas e compras de vinhos, como “A cozinha e seus vinhos”. Este trabalho apresenta um panorama da produção vinícola e das características principais das marcas de vinhos mais consumidos no mundo. Este livro é um roteiro de viagem de Saul Galvão pelas regiões onde se encontram as maiores vinícolas produtoras de vinho no mundo, na qual ele destaca o desempenho de países sul-americanos como Chile, Argentina, Uruguai e Brasil, diante do mercado europeu, numa edição ilustrada com mapas, história e referências.

Primoroso no detalhe, neste guia Saul Galvão também contribui com o leitor com dicas sobre escolha, degustação, armazenamento e temperatura ideal para manutenção do vinho, de acordo com o tipo, além de sugestões sobre combinações com comidas e indicação de preços.

Ainda sobre a produção de vinho Saul Galvão publicou o livro “Tintos e brancos” — uma obra de referência quando o assunto é vinho —, que é o resultado de mais de 25 anos de pesquisa nos principais centros produtores da bebida, em países como França, Itália, Portugal, Chile Argentina, Brasil, entre outros da Europa e das Américas do Norte e do Sul.

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