Greenwald: espionagem dos EUA tem objetivos econômicos


Por Igor Waltz*

10/10/2013


O jornalista Glenn Greenwald e seu companheiro David Miranda prestaram depoimento na CPI da Espionagem. (Crédito: Lia de Paula/Agência Senado)

O jornalista Glenn Greenwald e seu companheiro David Miranda prestaram depoimento na CPI da Espionagem.
(Crédito: Lia de Paula/Agência Senado)

Em audiência pública da CPI da Espionagem na tarde da última quarta-feira, 9 de outubro, o jornalista norte-americano Glenn Greenwald afirmou que os principais objetivos da espionagem dos Estados Unidos em outras nações é ampliar seu poder no mundo e obter vantagens econômicas para seu governo e suas empresas. Ele garantiu que tem publicado tudo o que sabe sobre os documentos que tratam da espionagem que a Agência Nacional de Segurança (NSA) fez sobre as comunicações brasileiras.

“O grande motivo da espionagem é obter vantagens econômicas e industriais. Sem dúvidas, o propósito principal não é o combate ao terrorismo, nem a segurança nacional, nem o combate a outros crimes como a pedofilia. É para aumentar o poder dos EUA e dar vantagem econômica”, afirmou.

A audiência foi conduzida pela presidente da CPI, a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), com apoio do relator, Ricardo Ferraço (PMDB-ES), e participações do vice-presidente do colegiado, Pedro Taques (PDT-MT), e do senador Eduardo Suplicy (PT-SP). Também depôs o companheiro de Greenwald, o estudante brasileiro David Miranda. Ambos residem no Rio de Janeiro.

O senador Pedro Taques (PDT-MT) propôs ao jornalista que entregasse à CPI os documentos que tem sobre o Brasil para serem analisados pelo colegiado. “Nós não podemos ficar sendo pautados por programas de televisão”, disse o senador. Taques propôs que a documentação fique sob a guarda da CPI com a ressalva de que o jornalista tenha acesso a eles para continuar publicando as reportagens.

“São documentos onde há ao menos indício de crimes. E documentos onde há indício de crimes podem ser objeto de busca e apreensão. Então sugiro que ele deixe esses documentos sob a guarda do Senado, desta CPI, e possa ter acesso a eles para executar seu trabalho”, completou.

Greenwald não aceitou a proposta de entregar os documentos. Ele alegou que vem se expondo a riscos ao buscar e publicar os documentos que comprovam a espionagem americana, e que prefere manter o trabalho jornalístico apartado do governo. “Estou publicando todas as informações com muito risco. Eu não estou segurando documentos relevantes, eu não estou segurando informações importantes. Toda informação que eu tenho sobre espionagem contra o Brasil eu estou publicando, não estou segurando. O governo e o jornalismo são separados e devem ficar separados”, declarou.

O colunista do jornal britânico The Guardian foi o responsável por publicar as revelações do ex-técnico da agência de segurança americana (NSA) Edward Snowden sobre os programas secretos norte-americanos de interceptação de dados eletrônicos e telefônicos em todo o mundo. Greenwald também publicou reportagens no jornal O Globo, na revista Época e também no programa Fantástico, da Rede Globo, revelando espionagem norte-americana à presidente Dilma Rousseff, a seus assessores próximos e à Petrobras. Também divulgou informações sobre espionagem canadense no Ministério de Minas e Energia.

Ele informou que Snowden lhe deu “muitos documentos, muito complexos” há quatro meses, nos quais está trabalhando desde então e divulgando na medida em que descobre fatos importantes, como as espionagens no Brasil e no México. Atualmente, revelou, está trabalhando com jornalistas da França e da Espanha sobre espionagens que esses países também teriam sofrido. “Acho que é minha obrigação como jornalista ajudar a proteger a privacidade e os direitos humanos de todas as pessoas em qualquer país”, afirmou.

Segundo ele, os Estados Unidos e seus aliados mais próximos estão em “guerra contra o jornalismo e contra a liberdade de imprensa”. São os chamados Five Eyes (Cinco Olhos, em inglês): EUA, Inglaterra, Canadá, Austrália, Nova Zelândia. “Agora podemos ver que o governo dos Estados Unidos age como os governos autoritários, como o Irã e a China. É verdade, a China faz espionagem de cunho industrial, econômica e financeira, mas Estados Unidos, Inglaterra e Canadá fazem exatamente a mesma coisa. Esses governos dos estão mentindo para suas populações e para o mundo. Falam que o sistema de espionagem é contra o terrorismo ou pedófilos. Será que há terroristas ou pedófilos na Petrobras?”, indagou.

David Miranda

Durante a ocasião, David Miranda fez um breve relato de sua detenção por parte de autoridades britânicas, no aeroporto londrino de Heathrow, em 18 de agosto. Ele disse que foi detido pela polícia logo após desembarcar do voo em Londres e ficou 8 horas e 55 minutos em uma sala respondendo a inúmeras perguntas dos agentes sobre os mais diversos assuntos, como suas posições políticas, os protestos de junho no Brasil e seu envolvimento com as reportagens de Greenwald, entre outros.

Miranda, que ficou ainda detido mais duas horas em outras dependências do aeroporto, esperando sua liberação, também foi ameaçado de ser preso caso se recusasse a responder a qualquer um dos questionamentos. Para ele, o objetivo de sua detenção foi claro, o governo britânico quis intimidar Greenwald e Snowden por meio de pessoas a eles relacionadas. “Foi uma mensagem direta a Glenn, queriam intimidar ele, Laura e o The Guardian” – disse, referindo-se à cineasta documentarista norte-americana Laura Poitras, que trabalha com Greenwald e Snowden na divulgação dos documentos secretos.

Na ocasião, os policiais apreenderam também aparelhos eletrônicos de Miranda, como notebook, celular, pendrive e videogame, que até agora não foram devolvidos. Miranda disse que os agentes o detiveram lançando mão da lei antiterrorismo local. Segundo ele, mais de 90% das pessoas detidas no Reino Unido com base nessa lei são liberadas em média depois de uma hora e que essa lei permite detenções para interrogatório por no máximo nove horas.

O brasileiro acrescentou que policiais britânicos invadiram, três semanas antes de sua detenção, escritório do jornal The Guardian e obrigaram que jornalistas e editores destruíssem computadores que supostamente continham informações sobre o sistema de espionagem.

Outros requerimentos

A CPI também aprovou requerimentos para que o colegiado colha os depoimentos do presidente do Conselho Diretor da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), João Batista de Rezende, do diretor geral da Polícia Federal, Leandro Daiello, e do ex-deputado federal Marcelo Itagiba, que presidiu a CPI das Escutas Telefônicas Clandestinas entre 2007 e 2009. O objetivo dos membros da CPI da Espionagem é averiguar a capacidade de o Brasil proteger o sistema de telecomunicações nacional de espionagens externas e saber do andamento das investigações oficiais sobre a espionagem norte-americana.

Os senadores aprovaram ainda requerimento para que sejam encaminhados ofícios ao advogado de Edward Snowden e para o governo da Rússia, onde ele está asilado, na tentativa de agendar uma videoconferência.

O senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) disse que haver pressa em ouvir Snowden e outros convidados porque pretende entregar seu relatório até o fim do ano. A CPI da Espionagem ouviu hoje o jornalista Glenn Greenwald e seu companheiro, o brasileiro David Miranda. Greenwald publicou reportagens com base nos documentos vazados por Snowden e Miranda foi detido em sua última passagem pela Inglaterra para prestar esclarecimentos sobre o assunto.

*Com informações da Agência Senado e EBC.