Cento e vinte ex-presos políticos receberam o pedido oficial de desculpas por parte do Estado do Rio de Janeiro, em cerimônia realizada no ginásio de esportes do Estádio do Caio Martins, em Niterói, transformado em presídio político, em abril de 1964, logo após a derrubada do Presidente constitucional João Goulart, onde foram recolhidos cerca de 1.200 presos políticos. Dentre os que receberam a reparação encontram-se três jornalistas: Marcos de Castro, Elias Fajardo e Lucio Marrero, este último já falecido.
Campo de concentração em Niterói
Uma placa descerrada na cerimônia e que ficará exposta como memória de obscurantismo lembra que o estádio de Caio Martins foi o primeiro conjunto esportivo transformado em um verdadeiro campo de concentração, que serviu de modelo em outros Estados brasileiros e mesmo em países que atravessaram período ditatorial, como no Chile, onde em 1973 o Estádio Nacional serviu também de prisão de oposicionistas, inclusive de brasileiros exilados no país andino. .
Wadhi Damous, Presidente da seção fluminense da Ordem dos Advogados do Brasil, revelou que na parte da manhã a entidade recebeu ameaça de bomba, fato comunicado às autoridades da área de segurança do Estado. Com isso, Damous disse ter recordado o que aconteceu em 20 de agosto de 1980, quando grupos de extrema direita enviaram uma bomba que matou a secretária Lida Monteiro da Silva ao abrir uma correspondência destinada ao entãop presidenter da OAB, Seabra Fagundes. Na época, uma investigação da Polícia Federal apontou o civil Ronald James Watters como responsável pelo atentado, mas ele acabou absolvido pela Justiça.
Damous exortou os brasileiros “a ficarem atentos aos trabalhos da Comissão da Verdade, que pode ter chegado tarde, mas antes tarde do que nunca”.
O Presidente da OAB-RJ elogiou a “justa reparação” que o Governo do Estado do Rio estava proporcionando aos 120 presos políticos, mas admitiu que a medida não é total.
Para Damous, “a reparação será total quando a Justiça julgar acusados de assassinatos e torturas com amplo direito de defesa e sendo culpados punidos como qualquer cidadão no Estado de direito”.
Damous defendeu a criação de um Centro de Memória no Caio Martins e em outros locais que serviram de centros de repressão contra brasileiros.
Governo do Estado recebe críticas
A ex-presa política Ana Miranda representando todos os 120 homenageados fez duras críticas ao Governador do Estado, Sergio Cabral, que até agora não recebeu em audiência, solicitada várias vezes, para debater a reparação. Dos 1.114 pedidos de reparação no Estado do Rio foram deferidos 894.
Ela lembrou que 20% dos que pediram reparação a partir de 2004 já morreram sem terem recebido qualquer tipo de reparação a que teriam direito, exatamente pelo descaso com que o governo do Estado se comportou ao se recusar receber os representantes de presos políticos.
Além da reparação moral, os ex-presos políticos receberam indenização de 20 mil reais, quantia considerada irrisória por Rodrigo Neves, Secretário de Direitos Humanos do Governo do Estado do Rio de Janeiro, que em seu discurso reconheceu a importância da luta dos que resistiram ao Estado ditatorial. “Graças aos senhores e senhoras aqui presentes vivemos hoje em um Estado democrático”, disse e destacou: “o que seria de nosso país se não fosse a resistência dos senhores e senhoras?”
DOI-CODI começou no Caio Martins
Para Rodrigo Neves não “podemos e não devemos esquecer que aqui no conjunto esportivo do Caio Martins, transformado em campo de concentração, infringiram maus tratos a presos políticos e se formou o DOI-CODI, a CISA e outros organismos da repressão da ditadura”.
O Secretário de Direitos Humanos do Estado do Rio de Janeiro prometeu que no máximo até o primeiro semestre de 2013 todos os pedidos de reparação serão resolvidos.
A Ministra Maria do Rosário, da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, foi representada na cerimônia pelo seu Chefe de Gabinete, Bruno Monteiro, que defendeu a abertura da “caixa (arquivos) para saber o que aconteceu nos anos de arbítrio”.
Monteiro admitiu que o pedido de perdão por parte do Estado brasileiro ainda é pouco e é preciso muito mais, inclusive saber onde se encontram os restos mortais de desaparecidos políticos, para que os familiares possam enterrá-los.
Foram lembrados ex-presos políticos já mortos, entre os quais Degenildo da Silva Pinto, que esteve no Caio Martins em abril de 1964. Ele foi lembrado pela filha Marilia Duque Estrada. Além do jornalista Lucio Marrero também foi homenageado Laudelino Gomes, ambos já mortos.
A ABI esteve representada na cerimônia pelos Conselheiros Alcyr Cavalcanti e Mario Augusto Jakobskind, integrantes da Comissão de Direitos Humanos e Liberdade de Impren