Governo brasileiro repudia retenção de brasileiro em aeroporto de Londres


Por Cláudia Souza*

19/08/2013


Glen Greenwald e David Miranda no Aeroporto Tom Jobim Foto: Ricardo Moraes/Reuters

Glenn Greenwald e David Miranda no Aeroporto Tom Jobim Foto: Ricardo Moraes/Reuters

O Ministério das Relações Exteriores divulgou nota manifestando “grave preocupação” com a retenção do brasileiro David Miranda, 28 anos, mantido incomunicável no Aeroporto de Heathrow, em Londres, durante 9 horas, com base na legislação britânica de combate ao terrorismo.

David é casado com Glenn Greenwald, jornalista radicado no Brasil, que assinou matérias para o jornal The Guardian sobre programas de espionagem secretos dos Estados Unidos executados pela Agência de Segurança Nacional Americana (NSA). As denúncias foram feitas pelo ex-agente da CIA Edward Snowden, atualmente asilado na Rússia.

De acordo com a nota do Itamaraty, o episódio é uma “medida injustificável por envolver indivíduo contra quem não pesam quaisquer acusações que possam legitimar o uso de referida legislação. O Governo brasileiro espera que incidentes como o registrado hoje com o cidadão brasileiro não se repitam.”

David Miranda, estudante de Comunicação Social na Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPN), desembarcou na manhã desta segunda-feira, dia 19, no Aeroporto Tom Jobim, no Rio de Janeiro, onde foi recebido por Glenn Grenwald.

David Miranda esteve em Berlim, na Alemanha, para uma reunião com a videomaker Laura Poitras a respeito de um documentário que Glenn Greenwald está produzindo sobre as informações da NSA. A escala em Londres era de apenas duas horas. Contudo, ao chegar no aeroporto britânico o brasileiro foi parado por oficiais e informado que seria interrogado com base no artigo 7 da lei de terrorismo.

No Brasil, David afirmou que pretende pedir providências sobre o caso. Ele contou que teve o passaporte confiscado e que permaneceu em uma sala com seis agentes, que teriam confiscado ainda outros objetos pessoais do brasileiro, entre os quais um pen drive, um aparelho celular, um computador, um videogame e uma câmera fotográfica.

Glenn Greenwald ressaltou que a detenção de David Miranda representa uma tentativa de intimidação. Ele afirmou que tem cerca de 20 mil documentos ainda não divulgados que recebeu de Edward Snowden.

— Agora vou ser mais radical com minhas reportagens no The Guardian. Tal situação demonstra o verdadeiro caráter dos Estados Unidos, sublinhou Greenwald.

Investigação

O ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, disse que vai conversar com o chanceler britânico, William Hague, ainda nesta segunda-feira.

O Partido Trabalhista inglês pediu uma investigação urgente sobre o uso dos poderes antiterroristas para deter o brasileiro. O artigo 7 da lei de terrorismo, de 2000, se aplica em aeroportos, portos e áreas de fronteira, permitindo aos agentes deter e interrogar indivíduos.

— Qualquer indicação de que os poderes contra o terror estão sendo mal utilizados deve ser investigada e esclarecida com urgência, lembrou a parlamentar Yvette Cooper.

Em entrevista à rádio BBC, o deputado britânico Keith Vaz, presidente de uma comissão parlamentar, afirmou que vai pedir explicações à polícia sobre a detenção do brasileiro:

— É uma reviravolta fora do comum para uma história muito complicada. É certo que os serviços policiais e de segurança devem questionar as pessoas. O que precisamos fazer rapidamente é estabelecer os fatos. Agora temos uma reclamação do Sr. Greenwald e do governo brasileiro. Eles disseram que estão preocupados com o uso da legislação de terrorismo para algo que não parece estar relacionado com o terrorismo, por isso precisa ser esclarecido e rapidamente.

De acordo com autoridades britânicas, grande parte das investigações com base na lei de terrorismo dura menos de uma hora, e apenas uma a cada duas mil pessoas fica detida por mais de seis horas.

Ilegalidade

A ONG Anistia Internacional condenou a detenção de David Miranda. Em nota, a entidade afirma que “a detenção de David é ilegal e indesculpável. Ele foi detido sob uma lei que viola qualquer princípio de equidade e sua prisão mostra como a lei pode ser abusiva por razões mesquinhas e vingativas.”

*Com informações O Globo, Exame.com, Itamaraty.