11/06/2008
Cláudia Souza
13/06/2008
Uma vida pela MPB
Nascido em maio de 1937, em Cascadura, Sérgio Cabral, de 71 anos, é um dos nomes mais brilhantes e respeitados na imprensa e no cenário artístico e cultural do País. Representante do mais legítimo espírito carioca, este vascaíno notório cultiva o amor pelo Rio de Janeiro, a MPB e seus personagens desde o início da carreira, iniciada no fim da década de 50 no vespertino Diário da Noite.
Ao longo de mais de meio século, trabalhou como repórter, redator e cronista em quase todos os jornais do Rio. Fundador de O Pasquim e do Teatro Casa Grande, é autor de composições de sucesso — como “Os meninos da Mangueira”, em parceria com Rildo Hora — e de dezenas de publicações sobre grandes artistas, como Pixinguinha, Ari Barroso e Elizeth Cardoso, com reconhecida e forte atuação no incentivo e resgate da cultura e da música popular brasileira.
Pai do atual Governador do Rio, Sérgio Cabral Filho, o veterano jornalista também fez carreira na política, exercendo três mandatos como Vereador da cidade do Rio de Janeiro (a partir de 1982) e no Tribunal de Contas do Município (a partir de 1993), sem contudo abandonar as atividades de jornalista e escritor.
ABI Online — Por que você optou pela profissão de jornalista?
Sérgio Cabral — Eu queria ser escritor, mas percebia que a profissão era desvalorizada no Brasil. Achava também que não tinha talento para escrever, muito menos para viver de livros. Ainda jovem, escrevi um conto e enviei para o concurso literário do suplemento dominical do Jornal do Brasil. A pessoa que analisava o material fez o seguinte comentário sobre o meu texto: “Sem nexo”. Encerrei ali minha carreira de ficcionista, mas descobri que poderia ganhar dinheiro escrevendo, desde fosse jornalista.
ABI Online — Como foi o início da carreira?
Sérgio Cabral — Comecei em 1957, no Diário da Noite, como estagiário. Minha família era muito pobre e, como eu não tinha de onde tirar dinheiro, precisava do registro profissional para ter um salário. Assim que comecei a trabalhar em jornal, fiquei completamente apaixonado pela profissão. Passava as noites trabalhando na redação, dormia em cima da mesa. Quando fazia frio, abria uma bobina de papel e me cobria. Certa vez, por volta das três da manhã, os redatores estavam fechando o jornal, todos muito cansados, pois tinham três ou quatro empregos. Percebi que o João Rocha, redator-chefe, estava com dificuldade para escrever um título pequeno, para uma notinha de dois parágrafos. Ele batia na máquina, arrancava o papel, iniciava outro texto, tornava a arrancar. Passei por trás dele, li a nota, fui para um canto, fiz um título e botei discretamente na sua frente. Ele olhou aquilo espantado e perguntou quem tinha feito o título. Quando respondi que tinha sido eu, ele virou-se imediatamente para o Geraldo de Barros, secretário de Redação, e indagou: “O Sérgio Cabral já foi registrado?” Com a resposta negativa, sentenciou: “Então, registra amanhã!”
ABI Online — Quais eram o título e a notícia?
Sérgio Cabral — A notícia era sobre fortes chuvas que atingiram uma cidade mineira, causando sérios prejuízos. Procurado por um deputado, pedindo ajuda financeira para a cidade, Juscelino Kubitschek, então Presidente da República, garantiu que liberaria a verba. Então, escrevi o seguinte: “JK promete dar o que temporal tirou”. Sou jornalista graças a este título.
ABI Online — Que tipo de matéria você passou a cobrir depois de registrado?
Sérgio Cabral — Cobria vários assuntos, mas uma das primeiras matérias foi sobre concurso de miss. Outro dia escrevi uma crônica no Lance!, lamentando a ausência da bandeirinha Ana Paula, dizendo que o futebol estava mais feio sem ela, que seria maravilhoso olhar para o campo e ver aquelas pernas, porém lembrando que sou um senhor de 70 anos e minha intenção não é “cantar” ninguém. Eu uso o jornal para fazer essas coisas e, já na primeira vez em que fiz isto, o resultado foram três filhos e dez netos. (risos)
ABI Online — Conte esta história…
Sérgio Cabral — A candidata a Miss Rio de Janeiro seria lançada em um concurso num clube carioca. Organizaram uma feijoada para o grupo que trabalhava no concurso e eu fui convidado. Chegando lá, um dos diretores veio falar comigo, pedindo para eu “cantar” uma moça que estava próxima a nós, convencendo-a a se candidatar. Ao invés de “cantar” para o concurso, decidi “cantá-la” pra mim. Comecei a alimentar a candidatura da moça nas minhas matérias, escrevendo que ela namorava um jornalista que não concordava com a sua participação no concurso. Certo dia, quando retornei ao clube, ela estava com uma amiga que se aproximou de mim, perguntando se o que eu tinha escrito era verdade. Eu disse que para mim ela era mesmo minha namorada. Pois a possível candidata a miss afirmou que para ela também. Foi a primeira coisa que o jornalismo me deu: três filhos, dez netos e 46 anos de casamento.
ABI Online — Como foi seu início no Jornal do Brasil?
Sérgio Cabral — Comecei em dezembro de 1959, pouco antes do carnaval de 1960. O JB destacava dois repórteres para cobrir o evento, que ganhava duas páginas. Senti que conquistava prestígio com as minhas matérias e entrevistas sobre o tema. Logo após o carnaval de 61, Reynaldo Jardim, editor do recém-criado Caderno B, perguntou se eu gostaria de ter uma página para escrever sobre música popular às quintas-feiras, com pauta livre. O título da coluna, dado pelo próprio Reynaldo, era “Música naquela base”. Aceitei, mas continuei atuando como repórter e copidesque. Não ganhava nada para escrever para o Caderno B, mas gostava muito de fazê-lo.
ABI Online — Qual era a sua rotina de trabalho nessa época?
Com a mulher, Magali |
Sérgio Cabral — Cheguei a trabalhar no Diário da Noite e no Jornal do Brasil ao mesmo tempo. Mas não agüentei, principalmente porque morava em Cavalcante. Eu entrava no Diário às cinco da manhã, almoçava no Saps — o Serviço de Alimentação e Previdência Social criado por Getúlio Vargas em 1940, para garantir comida de graça aos trabalhadores — e seguia às 14h para o JB, onde trabalhava até meia-noite. Como não tinha tempo para dormir, chegava lá, lia a minha pauta e se a primeira matéria fosse, por exemplo, às 16h, sentava no banheiro e caía no sono. Todos os dias os colegas me despertavam, gritando “sai pra lá, Sérgio!”, “acorda aí, Sérgio!” Então, saí do Diário da Noite e fiquei só no JB até novembro de 1962, quando houve uma greve dos jornalistas e eu fui demitido.
Aliás, acho que sou o único jornalista da história do Brasil demitido duas vezes de jornal por causa de greve. A segunda foi em 1986, na greve do Globo. Eu era contra, pois acreditava que o movimento não tinha respaldo. Contudo, fui à assembléia e, como todo mundo apoiou, não seria eu o furador de greve. Então, não entreguei a matéria para a minha coluna, e fui demitido. Além de mim, foram mandados embora Maurício Azêdo, Ana Arruda, Nilson Lage, um grupo bom. Para piorar nossa situação, os donos de jornais decidiram não contratar nenhum grevista demitido.
ABI Online — Como você enfrentou essa fase?
Sérgio Cabral — Minha mulher estava grávida do meu filho mais velho, o atual Governador do Estado do Rio, e eu não tive jeito de dizer para ela que estava desempregado, porque o JB era o emprego que eu julgava ser para a vida inteira. A Condessa Pereira Carneiro, dona do jornal, gostava de mim. Então, um amigo me aconselhou a levar minha esposa para assistir ao filme “Uma vida difícil”, do Dino Risi, que conta a história do repórter de um jornal comunista que denuncia grandes empresários italianos envolvidos num esquema de envio de dinheiro para a Suíça. A reportagem fazia sucesso, mas o profissional vivia numa dureza danada, porque o jornal não pagava, não tinha receita. Cansada da miséria, a mulher dele decide abandoná-lo, indo viver com a família no interior. Certo dia, um grande empresário convida o jornalista para ser seu secretário, ganhando um salário absurdo. Pensando na mulher, ele aceita, compra um carrão e vai atrás dela. Ao chegar na cidadezinha com o carro moderníssimo, consegue reconquistar a esposa. O tempo passa e o empresário começa a humilhá-lo, maltratá-lo, e ele lá, puxando o saco do cara. No fim do filme, acontece uma festa na casa do empresário, à beira da piscina. O jornalista-secretário deixa o sifão cair na hora de servir um convidado. O patrão passa nesta hora, arranca o sifão da mão dele e lhe atira a bebida no rosto. O jornalista revida com um soco no empresário, que cai dentro da piscina. Na cena final, o repórter vai embora com a mulher, orgulhosa da atitude do marido. Na saída, perguntei para a minha mulher: “Você achou que ele agiu certo?” E ela respondeu: “Claro. Ele tinha toda a razão!” Foi a deixa para eu confessar: “Sabe o que é… comigo aconteceu algo parecido.”
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ABI Online — Daí em diante sua vida também se tornou difícil?
Sérgio Cabral — Sim. Durante dois meses, sobrevivi graças ao dinheiro arrecadado a partir de uma lista feita por colegas de redação, principalmente do Jornal do Brasil. Quando meu pai morreu, eu tinha apenas 3 anos de idade. Passei a vida inteira em busca da figura paterna e consegui dois pais: Jacob do Bandolim e o jornalista Prudente de Moraes, neto, que eu amava. Quando soube da minha demissão, Prudente me telefonou, revoltado. Na época, ele era Diretor da Light e me ofereceu trabalho. Você não pode imaginar o que significava para um homem de esquerda como eu trabalhar na Light naquela época. Eu me sentia reproduzindo a história do tal jornalista do filme. Antes de dar a resposta, consultei o Partido por intermédio do Roberto Moreno, que me incentivou a aceitar, lembrando que havia uma base boa do partido lá dentro. Em seguida, o Diário Carioca, que era um jornal maravilhoso e, felizmente, irresponsável, foi logo desrespeitando o acordo dos patrões e me contratou. O Diário foi a melhor redação em que eu trabalhei em toda a minha vida — e olha que eu atuei em praticamente todos os jornais do Rio. Ele só tinha um grande inconveniente: não pagava. Então, fui para a sucursal da Folha de S.Paulo. E em 1966 recebi convite para ser o Diretor Artístico do Teatro Casa Grande, na época conhecido como Café-concerto Casa Grande. Tinha restaurante, venda de discos, livros… Uma coisa fantástica! Decidi sair da Light, mas continuei na Folha, redação onde atuei por mais tempo, de 1963 a 69.
ABI Online — Como foi a ida para O Pasquim?
Sérgio Cabral — Eu trabalhava na Folha e na Última Hora, onde o Tarso de Castro era um sucesso como cronista e foi procurado por um cara que tinha feito com Sérgio Porto um jornal chamado A Carapuça. O Sérgio Porto tinha morrido, em setembro de 68, e ele queria ressuscitar a publicação. Tarso, eu e Jaguar nos reunimos e decidimos fazer outro jornal no lugar de A Carapuça, que o Jaguar batizou de O Pasquim. A primeira edição saiu em junho de 1969. A tiragem de 14 mil exemplares se esgotou às dez da manhã, o que nos obrigou a rodar outra. No segundo número, foram vendidos 40 mil exemplares e assim por diante, até novembro, quando fizemos uma festa comemorando 100 mil exemplares. No ano seguinte, já vendíamos 200 mil, uma loucura! A redação era alegre, o clima era bom, engraçado, e enfrentávamos a censura. Em 1º de novembro de 1970, fomos presos.
ABI Online — Como ocorreu a prisão?
Sérgio Cabral — Eu estava em Campos, num encontro de estudantes, para falar sobre O Pasquim. Um sucesso! Após o evento, me levaram para um clube. Para você ter uma idéia, às oito da manhã eu estava dentro da piscina do clube, só de cueca, quando recebi o recado da minha mulher, pedindo que eu telefonasse com urgência para casa. Só podia ser alguma coisa grave, pensei. Nessa época eu morava no Leblon, perto da praia, e meus três filhos eram muito pequenos. O mais velho tinha 7 anos. “Será que meus filhos morreram afogados? Preciso voltar rapidamente! Tenho que voltar!”, concluí, angustiado. Segui até a redação do jornal Monitor Campista, liguei pra casa e perguntei: “O que houve, Magali?” “O Exército invadiu O Pasquim e estão atrás de você!”, disse ela. “Ai, que alívio!”, devolvi. Garanto que esta foi a melhor notícia que recebi em toda a minha vida.
Voltei para o Rio e me escondi. Um dia na casa da Leila Diniz, outro no estúdio do Millôr Fernandes… Até que o Paulo Francis, que já estava preso, telefonou para O Pasquim, dizendo que o pessoal do Exército só queria fazer umas perguntas rápidas para mim, que editava o jornal, e ao Jaguar, e depois nos liberaria. Tomei conhecimento do recado dele porque, apesar de escondido, sempre mantinha contato com a redação. “Se é só isso que eles querem, vou até lá”, decidi, ingênuo. Fiquei preso dois meses.
Ricardo Fasanello |
ABI Online — O que aconteceu depois?
Sérgio Cabral — A censura apertou demais. Tínhamos que mandar o jornal para Brasília, uma coisa terrível. O pior ano da minha vida foi 1971. O Pasquim perdeu toda a receita, porque os anunciantes ficaram com medo. Havia ainda sabotagem nas bancas, com ameaças de explosões aos jornaleiros que ousassem vender a publicação. Fui despejado, pegava dinheiro emprestado em banco, não conseguia pagar, recorria a um segundo banco para conseguir pagar o terceiro… Continuei no Pasquim apenas como colaborador e, em 72, fui para São Paulo trabalhar na Editora Abril, ganhando muito bem como editor da revista Realidade. Mas eu tenho um problema: sou carioca de nascimento, vocação e profissão. Só sei escrever sobre o Rio de Janeiro, sobre as coisas do Rio. Trabalhando em São Paulo, vim ao Rio e encontrei Ciro Monteiro na Cinelândia. “Vamos tomar um chope?”, perguntei, animado. Fomos para o Amarelinho, apareceram outros amigos e nós ficamos ali conversando, naquela tarde linda, um papo ótimo. Saindo dali, imediatamente telefonei para casa: “Magali, faça as malas pois estamos voltando para o Rio”, disse. “É mesmo?”, perguntou ela. “É. Consegui um emprego”, menti.
Como não tinha emprego, não tinha casa, não tinha nada, fomos morar com uma amiga. Tentei entrar em jornal, mas naquela época estava muito complicado. Certo dia, encontrei o Martinho da Vila, que, sem saber das minhas dificuldades financeiras, perguntou: “Você não quer ser produtor de disco, não?” “Mas o que faz um produtor de disco?”, indaguei. “A mesma coisa que você faz aí, esses shows, essas coisas que você faz aí, ora!”
Ricardo Fasanello |
ABI Online — A partir de então, o trabalho com a música se intensificou?
Sérgio Cabral — Iniciei ali uma carreira de dez anos, conciliando com o trabalho em jornal, pois logo depois comecei no Diário de Notícias, onde, durante dois ou três anos, assinei a coluna “Esquema carioca”, cujo tema era o Rio de Janeiro. Fiz ainda textos sobre música popular no Globo e escrevi para alguns programas da TV Globo. Finalmente eu retomava a minha vida.
ABI Online — Em que época você deu aulas de Jornalismo?
Sérgio Cabral — Foi entre as décadas de 80 e 90, em uma faculdade de Comunicação. A dica que eu dava era a seguinte: trabalhe em jornal, mas descubra uma área e dedique-se a ela. Pode ser cinema, economia, ou lá o que for. Se você se der bem naquilo que escolheu, raramente ficará desempregado. A minha escolha, sem dúvida, é a música popular brasileira. Confesso, humildemente, que raramente fiquei desempregado, devido a duas coisas: a esta especialização e ao Partido Comunista.
ABI Online — De que maneira se dava esta relação?
Sérgio Cabral — O partido não deixava nenhum comunista desempregado. Se existia uma vaga, colocava-se um companheiro. Gosto das lições que o partido me ensinou sobre ética, vida política, realidade brasileira, cultura e espírito de solidariedade, o qual lamento não existir mais.
ABI Online — Como você uniu o interesse pelo esporte ao jornalismo?
Sérgio Cabral — Por ocasião da Copa de 62, fui destacado como copidesque para a editoria de esporte do Jornal do Brasil. Como vascaíno notório, assistia às partidas e me envolvia com tudo aquilo. Surgiu um convite para eu participar da famosa mesa-redonda esportiva “Resenha Facit”, ao lado de João Saldanha, Armando Nogueira e Nelson Rodrigues. Depois, assinei colunas no Jornal do Sports e na Última Hora e, em 1980, o Milton Temer, que era editor de Esporte no Globo, me convidou para substituir o Cláudio Melo Souza, que ia sair de férias. Acabei ficando seis anos como colunista do jornal. Em seguida, fui para O Dia, onde escrevi até 93.
ABI Online — Nessa época você já tinha iniciado a carreira política.
Sérgio Cabral — Sim. Fui eleito Vereador em 1982 e reeleito em 88 e 92, mas nunca abandonei o trabalho em jornal. Em 93, fui para o Tribunal de Contas e, por força do cargo, não poderia ser remunerado para escrever. Fiquei fora da imprensa, mas me realizava escrevendo livros.
ABI Online —Quando começou a escrever livros?
Sérgio Cabral — Na década de 70. Em 1974, lancei “As escolas de samba — o que, quem, onde, como, quando e por quê”; em 78, venci o concurso de monografia da Funarte com “Pixinguinha, vida e obra”. Na época do Pasquim — que tinha uma editora —, alguns artigos meus foram reunidos em “ABC de Sérgio Cabral” (1979). Depois, escrevi “Tom Jobim” (1987); “No tempo de Ari Barroso” (1993); “Elizeth Cardoso, vida e obra” (1994); “As escolas de samba do Rio de Janeiro” (1996); “A música popular brasileira na era do rádio” (1996); “Antonio Carlos Jobim — Uma biografia” (1997); “Livro do Centenário do Clube de Regatas do Vasco da Gama” (1998); “Mangueira — Nação verde e rosa” (1998); “Nara Leão — Uma biografia” (2001); e “Grande Otelo — Uma biografia” (2007).
ABI Online — Quais são próximos projetos?
Sérgio Cabral — Minha pretensão — a palavra é adequada, porque estou sendo muito pretensioso — é escrever a história da música popular brasileira através dos seus personagens importantes. Atualmente, escrevo sobre Ataulfo Alves. Gosto de escrever sobre quem admiro, porque, ao fazer a biografia de uma pessoa, você passa a conviver com ela. Portanto, precisa ser alguém agradável, que te faça bem, te faça sonhar. Participei de uma palestra com Rui Castro — que também é biógrafo —, falando sobre esta paixão, esta coisa de sonhar com o biografado, de ver a cara dessas pessoas. O Rui disse que o biógrafo pensa que se apodera da alma do biografado, mas que, na verdade, acontece o contrário.
ABI Online — O jornalismo estaria na origem de sua atividade como biógrafo?
Sérgio Cabral — Esta foi a maneira que encontrei de ser jornalista, porque meus livros, na verdade, são reportagens, longas reportagens. A grande crítica que recebo dos meus livros é o excesso de dados. Mas isso vem da velha mania de repórter, de apurador, que trago comigo.
ABI Online — Mesmo em tempos de internet, em que as informações estão mais facilmente localizáveis, você concorda que as pessoas precisam continuar se preocupando com a apuração, a pesquisa?
Sérgio Cabral — Os dados que constam na internet foram removidos de outras publicações e nem sempre podem ser confiáveis. Muitos pesquisadores me procuram para que eu fale de um personagem ou outro sobre o qual tenha escrito. Começo perguntando se já leram o que escrevi. A maioria diz que não. Então, antes de conversar, mando ler. Eu já agia assim quando dava aulas na faculdade, incentivando a leitura, a escrita. Convidava para a sala de aula grandes personagens e amigos, como Nelson Sargento, e pedia aos alunos um entrevistão. Na hora de corrigir os textos, apontava as falhas, explicava com cuidado. Meu bilhete costumava ser maior que o texto do aluno. Por mais que apareçam novidades tecnológicas, ler e escrever será sempre o melhor caminho.
ABI Online — Seus filhos têm formação em Jornalismo, política, Publicidade e produção cultural. Você acredita que os tenha inspirado?
Sérgio Cabral — Acho que sim, mas meu sonho era ter um filho cientista. (risos)
ABI Online — Atualmente você escreve para o Lance! e apresenta um programa de rádio sobre MPB. Como surgiram estes projetos?
Sérgio Cabral — Como me aposentei no Tribunal de Contas, no ano passado, finalmente pude aceitar um velho convite do jornal, para escrever uma coluna dominical sobre esporte. Na mesma ocasião, comecei a fazer o programa “Eles têm histórias pra contar”, na Rádio Roquette-Pinto, mas de graça, porque quero dar uma contribuição ao trabalho de meu filho sem a acusação de nepotismo. Reproduzo no programa as palestras que faço sobre música popular. Seleciono um compositor, um instrumentista, ou um tema, e ilustro com informações e música. O programa vai ao ar às sextas-feiras, às 15h, com reprise aos domingos, às 14h. Não percam! (risos)
ABI Online — A ABI está em festa, comemorando o centenário. Qual a sua relação com a Casa?
Sérgio Cabral — Minha relação com a ABI é muito antiga. Grandes Presidentes da entidade, como Barbosa Lima Sobrinho e Prudente de Moraes, neto, foram pessoas muito queridas para mim. Sem falar no atual Presidente, Maurício Azêdo, um dos maiores amigos que tenho na vida, velho companheiro na imprensa, na Câmara dos Vereadores, no Tribunal de Contas. Dei a um dos meus filhos o nome de Maurício. Sempre estive próximo à Casa, da qual sou Conselheiro. Tenho esperança e convicção de que este primeiro século da ABI será seguido de muitos na história da imprensa brasileira.
ABI Online — Quais são os planos agora?
Sérgio Cabral — Parei de fumar e estou praticando exercícios físicos, pois também quero viver um século para continuar escrevendo sobre a minha paixão maior, que é a música popular brasileira e seus personagens.