06/03/2008
Marcia Martins
14/03/2008
Um plantão que é uma piada
Guerras, violência urbana, agressão ao meio ambiente são assuntos que têm dominado o noticiário da mídia em geral. Mas, no meio de tanta tragédia, um jornalista consegue fazer da notícia uma grande piada. O autor dessa proeza é Maurício Menezes, que com o seu “Plantão de Notícias” provoca risos amarelos entre os coleguinhas, cujos erros são o alvo de suas gozações.
Maurício Menezes nasceu em Gurinhatã, Minas Gerais, em 1950. Diz, em tom de blague, que escolheram por ele o ofício, lá pelos 20 anos, quando foi encarregado de atender os ouvintes durante uma greve de jornalistas da Rádio Nacional, pisando pela primeira vez numa redação.
De lá para cá, convive com o excesso de trabalho, já que apenas nos seis primeiros meses de carreira trabalhou em um único emprego. No momento, além de atuar na Rádio Tupi e apresentar seu espetáculo no Teatro Ipanema, no Rio, aos sábados e domingos, ele tem um site, um programa de TV na internet e a própria produtora. Ao mesmo tempo, escreve um livro sobre os “causos” da imprensa.
ABI Online — Em que ano você nasceu e em que cidade?
Maurício Menezes — Nasci em l950, para alegria do Brasil, que chorava a perda da Copa do Mundo. Quando me perguntam onde nasci, a pergunta seguinte é: “Onde fica isso?” É um absurdo não saber onde fica Gurinhatã…
ABI Online — Como você se decidiu pelo jornalismo?
Maurício — Eu não me decidi. Decidiram por mim. Tinha 20 anos de idade quando entrei pela primeira vez numa redação, para receber telefonemas. Os jornalistas da Rádio Nacional estavam em greve e eu fui colocado na lá para atender os ouvintes. Nem sabia que ali era a redação. Quando a greve terminou, eu fiquei.
ABI Online — Quais foram as principais dificuldades para entrar no mercado?
Maurício — Sempre tive uma grande dificuldade na minha vida: o excesso de emprego. Nunca trabalhei num só lugar, exceto nos primeiros meses de carreira. Já teve uma época em que trabalhei em quatro lugares.
ABI Online — Você cursou faculdade de Jornalismo?
Maurício — Não tive tempo. É o meu maior arrependimento.
ABI Online — O que você acha da exigência do diploma nessa carreira? Ele é dispensável, como julgam alguns teóricos?
Maurício — Nenhum diploma é dispensável. Mas também não é o diploma que faz o jornalista.
ABI Online — Quais foram os principais veículos por onde passou?
Maurício — Todos foram importantes. Fiquei 29 anos na Rádio Globo e 25 na sucursal Rio do Estadão. Mas tive passagens pela Rede Globo, pelo Grupo Visão, o Flamengo, o Tribunal de Justiça, o TRE…
ABI Online — Atualmente, você está na Rádio Tupi. Tem preferência pelo veículo?
Maurício — Gosto muito do rádio, talvez por sua agilidade. Adoro fazer meu programa de humor na televisão, mas não há nada melhor do que fazer rádio ao vivo. Agora tenho também um programa semanal de TV na internet (www.plantaodenoticias.com.br), em parceria com a Universidade Plínio Leite, de Niterói. Sem contar com meu site, minha produtora, a FullTime, e um livro que estou escrevendo sobre “causos” da imprensa.
ABI Online — Como surgiu a idéia de reunir as gafes dos jornalistas no “Plantão de notícias”?
Maurício — Foi no plantão na porta da casa do Roberto Medina, quando ele estava seqüestrado. Eu ficava contando histórias de colegas. Dali fui para o bar e do bar, para o teatro.
ABI Online — O “Plantão” já tem 17 anos. Há alguma diferença nas mancadas cometidas pelos jornalistas nos dias atuais?
Maurício — É a mesma coisa. Agora a questão é agravada pela velocidade da informação. O tempo entre o fato e sua veiculação é de poucos minutos. E a pressa é que conduz ao erro.
ABI Online — Como você apura esses erros para contar no show?
Maurício — Leio muitos jornais e revistas, o tempo todo. Sempre que viajo, paro naquelas bancas do aeroporto e compro todos os jornais. E dois estudantes de Jornalismo me ajudam, o Fernando Moreira e o Pablo Kirschner. Bem como os ouvintes e telespectadores, que enviam muito material.
ABI Online — Algum jornalista já ficou aborrecido por ter uma mancada contada por você no “Plantão”?
Maurício — Nunca um colega reclamou, porque os erros que eu mostro fazem parte do nosso trabalho. No teatro e nas palestras que faço, explico que somos vítimas da pressa exigida por nossos clientes. Um juiz pega um processo e tem um mês para analisá-lo. Um jornalista pega o mesmo caso e tem duas horas para contar o que aconteceu. E eu conto erros meus também. Muitos dizem que entendem melhor o trabalho do jornalista depois de ver o meu show. E são muitos os estudantes que dizem ter decidido pela carreira de jornalista depois de assistir ao “Plantão de notícias”.
ABI Online — Existe algum erro histórico, que não pode faltar no show?
Maurício — Há alguns casos clássicos, principalmente do rádio, que não posso deixar de apresentar. Como o do locutor que pegou um texto fúnebre por engano e mandou o pessoal se apressar, porque o enterro estava acontecendo: “Se vocês correrem, ainda pegam o finalzinho…”
ABI Online — E qual foi o maior erro que você cometeu?
Maurício — Tem dois. Recebi uma denúncia de que um preso estava sendo torturado no DOI-Codi e fui lá apurar. Outra foi ter achado que Adionel (assessor de imprensa da Arquidiocese do Rio) não era um nome próprio, mas sim um cargo da Igreja. E aí eu perguntei, por tê-lo achado muito jovem, há quanto tempo ele era Adionel.
ABI Online — Já passou por alguma saia-justa no palco?
Maurício — Ihhhh… Estou quase montando um show sobre os erros no teatro. Eu estava no Teatro das Artes, em São Paulo, e o público já tinha entrado. Eu, atrás da cortina, comecei a ajeitar o microfone sem fio. Estava com as calças arriadas e alguém acionou o mecanismo automático de abertura das cortinas. Aqui no Rio, um dia um maluco subiu no palco. Outra vez, o pessoal do “Pânico” foi me ver, mas graças a Deus ficou sentado, só assistindo. Graças a Deus mesmo.
ABI Online — Você já torceu pelo erro de algum jornalista em especial?
Maurício — Claro que não torço pelo erro. Mas uma vez me pediram que fizesse uma palestra num tal de Curso de Aperfeiçoamento de Jornalistas. Eu disse que não ia colaborar com um negócio desses. Mas hoje o mais incrível é o Daniel Sabbá, da CNT. É uma figura deliciosa.
ABI Online — Você tem idéia de quantas pessoas já assistiram ao “Plantão” e quantas apresentações foram?
Maurício — É uma pena eu não ter catalogado isso. Sou muito desorganizado. Mas já fiz até apresentação solo no Teatro Amazonas. Tem ator profissional que nunca conseguiu isso. No Rio, me apresentei também no João Caetano, no Copacabana Palace e no Canecão.
ABI Online — Quem integra a equipe do “Plantão de notícias” atualmente?
Maurício — Gosto muito de trabalhar com pessoas que não são artistas. Geralmente, escolho estudantes de Comunicação. Na atual temporada no Teatro Ipanema, estão comigo a Júlia Marvi, que estuda Jornalismo em Belo Horizonte; o Fernando Moreira, aluno da Facha, no Rio; o Hélio Júnior, já formado; e Edmundo Alvarenga, o baixinho, que ainda está em formação. Nossa produtora é a Cris Pimentel, uma jornalista de São Paulo que mora no Rio há dez anos.
ABI Online — E o programa na TV?
Maurício — Surgiu porque o público de rádio e de teatro cobrava muito. Não agüentava mais ouvir: “Vocês têm que ir para a TV.” Fizemos bons programas, mas nunca conseguimos espaço. Tínhamos muitos fãs, inclusive entre produtores da TV Globo e apresentadores como Jô Soares. Passamos pela CNT, a Record e a Band, que foi a nossa melhor fase. Até que um dia o Antônio Brasil, do site Comunique-se, escreveu um artigo dizendo que o “Plantão de notícias” era uma prova de que havia humor inteligente na TV. Isso matou a gente, porque parece que não gostam muito de coisas ligadas à inteligência na televisão. Gostaria muito de voltar, mas muitas vezes os diretores preferem pôr no ar filmes velhos, que dão traço de audiência, a nos ceder o espaço. Nunca entendi isso.
ABI Online — Como era fazer o programa de TV e o show do “Plantão” e, ao mesmo tempo, ser assessor do Tribunal de Justiça e, depois, do TRE?
Maurício — Nunca tive problemas, pelo contrário. Fui a muitas reuniões de juízes e desembargadores em que, terminados os trabalhos, eu fazia um show, para melhorar a carga negativa que ficava no ambiente. Uma vez o Presidente do TRE, Desembargador Marlan de Moraes Marinho, foi me ver no teatro e no fim era feito um sorteio. Ele ganhou uma camisa. Outras vezes, durante julgamentos, faziam comentários sobre o meu trabalho. Sempre foi tudo muito positivo, até porque os juízes, em geral, são bem-humorados.
ABI Online — Como você avalia o jornalismo e o jornalista de hoje, com equipes formadas, principalmente, por jovens?
Maurício — Eu nunca tive nenhum problema na minha carreira, porque sempre agi no interesse do público do Brasil. Sempre que faço palestras em faculdades, reclamo que deveriam ensinar que o jornalista não deve brigar com a notícia. Acho que a arrogância, que leva o repórter a trombar com a notícia, é o problema mais grave. Cansei de ver o sujeito dizer que não vai dar uma notícia para não “encher a bola” de alguém. Ou que vai noticiar pela metade, para atingir alguém.
ABI Online — Você tem ou teve alguma relação com a Associação Brasileira de Imprensa?
Maurício — Tenho o maior respeito pela ABI. Acho que é o nosso templo, como abrigo; o nosso Vaticano, como instituição. Já passei bons momentos da minha vida no Edifício Herbert Moses, inclusive num dos melhores momentos da categoria, quando precisamos destituir um Presidente do Sindicato dos Jornalistas. Na fase de redemocratização, a Associação foi palco de muitos encontros (e até desencontros) de jornalistas e intelectuais. Passou por uma fase muito difícil e cheguei a ficar com os olhos cheios de lágrimas, há dias, quando entrei no prédio e vi que as coisas estavam funcionando; os banheiros, limpos; os corredores, cheios de gente. Uma maravilha!