Entidades repudiam retirada de jornalistas de Belo Monte


Por Cláudia Souza*

07/05/2013


O jornalista francês da Radio France Internationale (RFI) no Brasil, François Cardona, é expulso do canteiro de obras. Foto: Ruy Sposati

A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado do Pará (Sinjor-PA) divulgaram nesta terça-feira, dia 7, nota conjunta repudiando a decisão da juíza estadual Cristina Sandoval Collyer, da comarca de Altamira(PA), que impede o livre acesso da imprensa a um dos canteiros de obras da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no município de Vitória do Xingu.

Localizado a 75 quilômetros de Altamira, o canteiro está ocupado desde a última quinta-feira, dia 2, por manifestantes que exigem a regulamentação do processo de consulta aos povos tradicionais (índios e quilombolas) sobre os empreendimentos que venham a afetar seus interesses, e defendem a paralisação dos projetos hidrelétricos até que as comunidades, formada em maioria por índios de etnia munduruku, sejam ouvidas.

Na última sexta-feira, dia 3, a juíza acatou parcialmente o pedido de reintegração de posse do canteiro Belo Monte feito pelo Consórcio Construtor Belo Monte(Ccbm), responsável pelas obras da usina. A magistrada afirmou que não tem competência para determinar a desocupação total da área e que o pedido deveria ser encaminhado à Justiça Federal. Contudo, concedeu a reintegração de posse contra os não-índios que ocupam o local.

Com a medida, foram retirados da área o fotógrafo Lunaé Parracho, da Reuters; o repórter François Cardona, da Rádio France Internationale(RFI), e o jornalista Ruy Sposati, assessor do Conselho Indigenista Minssionário(Cimi), que recebeu multa de R$ 1 mil, segundo a juíza, por ter contrariado a decisão judicial de 2011, que o proibia, juntamente com outras pessoas, de retornar ao local.

O processo de consulta aos povos tradicionais está previsto na Convenção 169, da Organização Internacional do Trabalho (OIT). O Brasil é signatário da norma internacional, aprovada pelo Congresso Nacional em 20 de junho de 2002, na forma do Decreto número 143, promulgado pela Presidência da República em 19 de abril de 2004.

O texto estabelece, entre outros ítens, que devem ser consultados os povos indígenas e os que são regidos, total ou parcialmente, por seus próprios costumes e tradições ou por legislação, mediante procedimentos apropriados e por meio de instituições representativas, com o objetivo de se chegar a um acordo e conseguir o consentimento acerca das propostas.

A Secretaria-Geral da Presidência da República divulgou na última segunda-feira, dia 6, a seguinte nota:

“O governo federal mantém sua disposição de dialogar com os munduruku para a pactuação de um procedimento adequado de consulta a esse povo. Mas queremos dialogar com lideranças legítimas. Na região do Tapajós está em curso uma experiência prática de participação planejada e conjunta, que será uma espécie de laboratório para a regulamentação da Convenção 169 no Brasil. O diálogo com os indígenas servirá de modelo para a regulamentação da consulta prévia, conduzida de forma participativa e transparente pela Secretaria-Geral”.

Por razões de segurança, o Consórcio Construtor Belo Monte mantém os trabalhos paralisados desde a quinta-feira. A Norte Energia, empresa responsável pela instalação e operação da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, recorreu à Justiça Federal para obter a reintegração de posse da área.

Leia a íntegra da nota da Fenaj e do Sinjor-PA:

“O Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado do Pará e a Federação Nacional dos Jornalistas vêm a público repudiar, veementemente, a forma violenta e anti-democrática com que o fotógrafo da Reuters, Lunaé Parracho, o jornalista do Conselho Indigenista Missionário, Ruy Sposati, e o correspondente da Radio France Internationale (RFI) no Brasil, François Cardona, foram retirados do canteiro de obras no Sítio Belo Monte, localizado no município de Vitória do Xingu, a 60 Km de Altamira, em cumprimento a uma ordem judicial expedida dia 03 de maio deste ano, que determinou a retirada de pessoas não indígenas do local.

Cumprindo a decisão, e como não havia pessoas não indígenas no canteiro de obras ligadas ao movimento de ocupação, o oficial de Justiça, acompanhado de força policial (Força Nacional e PM/PA) e de representante da empresa Norte Energia, resolveu impedir os profissionais de jornalismo que estavam atuando na cobertura do fato, apesar da referida decisão ser direcionada às partes do processo.

A gritante inversão de valores, que condena quem se dispõe a prestar o serviço da denúncia de diversos problemas vividos pela população daquela região à sociedade paraense e brasileira, não é apenas mais um dos capítulos da história, onde judiciário, policiais e empresários, por puro desconhecimento, desrespeitam os profissionais de jornalismo no nosso Estado. É sim um fato lamentável que depõe, lamentavelmente, contra a empresa e o judiciário paraense, órgão que deveria agir como promotor da Justiça e não o seu contrário.

Diante de tal episódio, que demonstra claramente uma brutal agressão ao exercício profissional, o Sindicato acredita que atitudes como esta extrapolam o respeito e atingem a liberdade de expressão e de imprensa em nosso Estado, tendência desgraçadamente verificada em vários outros estados, vitimando outros jornalistas e jornais.

O Sindicato não permitirá que fatos como estes intimidem a categoria dos jornalistas como um todo, a despeito de vivermos formalmente dentro de um regime democrático de direito, em que a liberdade expressão acha-se consagrada na Constituição.

Em vista disso, o Sindicato dos Jornalistas no Estado do Pará não medirá esforços, dentro do que lhe é possível, no sentido degarantir o livre exercício profissional e o respeito aos profissionais de jornalismo. Ao mesmo tempo, motivar que a imprensa em nosso estado não se cale diante das violações de prerrogativas dos jornalistas.

Belém, 06 de maio de 2013.

Sindicato dos Jornalistas no Estado do Pará – Sinjor-PA
Federação Nacional dos Jornalistas – FENAJ”