Por Claudia Sanches
06/01/2016
Uma jornalista que escrevia sobre o cotidiano da vida na cidade síria de Raqqa, considerada capital do Estado Islâmico, foi assassinada pelos jihadistas, informaram ativistas e jornalistas sírios.
Ruqia Hassan, de 30 anos, foi acusada pelo grupo extremista de ser espiã e teve a morte confirmada por sua família nos últimos dias. Sob o pseudônimo de Nissan Ibrahim, Ruqia descrevia nas redes sociais a vida dos moradores de Raqqa e os frequentes ataques da coalizão internacional contra os jihadistas.
Depois de se formar em filosofia da Universidade de Aleppo, ela se uniu à oposição ao regime de Bashar al-Assad, se baseou em Raqqa e se recusou a sair da cidade após o EI tomar o local. Não se sabe ao certo quando ela foi sequestrada pelo EI, mas sua última publicação no Twitter ocorreu em 21 de julho do ano passado.
“Vá em frente e cortem a internet, nossos pombos mensageiros não vãoreclamar”, escreveu ela no microblog, mantendo o senso de humor e esperança mesmo nos momentos difíceis.
Segundo o ativista local sírio Abu Mohammed, as últimas palavras da jornalistas foram: “Estou em Raqqa e recebi ameaças de morte. Quando o EI me prender e me matar, não tem problema… porque é melhor do que (viver) humilhada por eles”.
O Estado Islâmico tem realizado uma campanha de assassinatos cruéis para silenciar todos os que se posicionem contra o grupo ou forneçam informações sobre os acontecimentos em Raqqa. Em alguns vídeos, os extremistas já mostraram a execução de membros da organização jornalística “Raqqa is Being Slaughtered Silently” (Raqqa está sendo massacrada silenciosamente).
Raqqa, na Síria, é a cidade que o grupo autodenominado “Estado Islâmico” escolheu como capital para o califado que decretou em partes do território sírio e iraquiano.
Segundo relatos de ativistas e refugiados, o grupo comanda o local de cerca de 400 mil habitantes com mão de ferro, em um regime que inclui punições severas para atos como fumar ou não usar barba.
A morte é a pena para uma série de delitos considerados graves pelo “EI”, como passar informações a ONGs ou à mídia.
Informação: desafio ao Estado Islâmico
Por isso, a iniciativa de grupos como o Raqqa Está Sendo Massacrada Silenciosamente impressiona pela coragem: jornalistas-cidadãos tem sido a principal fonte de informações sobre a cidade para os moradores locais e para o mundo, já que a presença da mídia convencional foi reduzida extremamente na Síria depois das execuções de jornalistas por militantes.
O coletivo de jornalistas não profissionais Raqqa is Being Slaughtered Silently (RBSS) –Raqqa Está Sendo Massacrada Silenciosamente, em tradução livre– publica fotos, vídeos e relatos sobre a vida na cidade natal de seus fundadores.
Há repórteres atuando na cidade fora do país, na tentativa, às vezes frustrada, de garantirem sua segurança. Seus membros convivem com ameaças de morte e invasões de hackers a suas contas on-line.
Os ativistas que ainda vivem em Raqqa precisam driblar as câmeras de vigilância espalhadas pela cidade e as milícias que caçam pessoas suspeitas de documentar as ações do grupo extremista. Eles apuram e, depois de enviarem os registros para os colegas no exterior, apagam tudo.
O RBSS consegue publicar informações, em inglês e em árabe, quase em tempo real –nem sempre com precisão, mas apuradas “in loco”, em um contexto de ameaças e riscos evitados por muitos veículos profissionais.
Com isso, os militantes se tornaram fonte de informação, e seu conteúdo passou a ser usado e citado por redes de TV, jornais e revistas.
Segundo o Comitê para Proteção dos Jornalistas (CPJ), ao menos 85 jornalistas foram mortos e 90 sequestrados na cobertura do atual conflito na Síria, iniciado em 2011.
Com informações da BBC News, G1 e Folha de S.Paulo