“Que a salvação do Estado seja a lei.”
Cícero – Escritor e político romano (106-43 a.c.) – De legibus,III.8.
Não receiem o título. Traduz, na verdade, a expectativa. É o resultado da eleição para presidente da nação brasileira, que se calcou desde os primórdios da propaganda eleitoral efetuada pelos candidatos que se apresentavam ante a vontade do povo de uma forma que dava margem a incertezas quanto à qualificação dos dois candidatos mais proeminentes, uma vez que os demais não tinham sequer condições para vencer o grande páreo.
Vamos aqui dar nossa conclusão do que motivou o chamado segundo turno eleitoral: a nosso ver, o Governador de Minas, Aécio Neves, entre a cruz e a espada, preferiu por questões pessoais não aceitar o convite que lhe fizera o candidato José Serra para ser o seu vice, com olhos voltados para o Congresso, onde se fez senador da República, com possibilidades vastíssimas de futuro ainda mais brilhante daqui a quatro anos. A Senadora Marina Silva, tão logo soube do malogro da sua candidatura, decidiu, como se diz, subir no muro, aí ficando, deixando os seus pupilos a ver navios, preferindo não os incitar a dar seus votos para um dos dois beligerantes.
Viremos essa página, digamos assim. Dilma venceu! Lula foi evidentemente seu grande cabo eleitoral. Passada essa fase de, como disse, expectativa, nos obrigamos a cair na realidade. A história do mundo, em sua evolução, revela-nos momentos de grandes transformações que geraram conflitos de toda ordem, os quais tiveram por conseqüência tanto a grandeza de alguns povos como a miséria de tantos outros.
Não nos apressemos sobre o que cogitarmos nem sobre o que julgamos. Nossas apreensões nos levariam até a verberar contra o inconcebível em razão apenas do que presumimos! O que nos compete já, ou melhor, partindo do seio de uma sociedade que nos parece meio acéfala, é estabelecermos melhores e permanentes contatos com as instituições que tratam da segurança do Estado, sejam elas civis ou militares, a fim de que se possa ver criada uma estrutura de apoio às normas de fiscalização que devem reger um governo que se faça respeitar em benefício do povo.
Se tivermos a certeza de que podemos contar com a administração dos novos dirigentes da República em termos de honestidade de propósitos, passaremos a acompanhar apenas suas atividades, exigindo comprovação dos custos e despesas das obras realizadas, publicadas obrigatoriamente no Diário Oficial, o que nos permitirá um acompanhamento não muito perfeito como o que tem sido feito até hoje.
Por outro lado, mister se faz que a cognominada “mãe do PAC”, a nossa futura Presidente, não só o prometa como também retire das gavetas projetos inacabados ou paralisados, exigindo completa reintegração aos novos parlamentares do novo Congresso, aonde tem maioria quantitativa. São eles:
a transposição das águas do Rio São Francisco; a continuidade das hidrelétricas; as eclusas do Tucuruí; melhorias de portos marítimos e fluviais, hoje inadequados; incentivo imediato ás indústrias de fabricação de equipamentos para exploração e produção de petróleo do nosso pré-sal, a fim de nos livrarmos das importações com dispêndios de nossas divisas. A recomendação imediata de atendimento aos reclamos das nossas Forças Armadas, não só no que diz respeito aos equipamentos bélicos de que necessitam, a fim de assegurarem a defesa da Nação, como na disponibilidade orçamentária de que deverão dispor, destinada à formação dos seus contingentes com pessoal qualificado para as diversas ações quer na guerra como na paz.
O último item tem seu esboço fortalecido pela atual condição do País, em razão da mobilização dos setores relacionados com as reservas do pré-sal, cuja comercialização está sendo programada pela Petrobrás, garantindo os investimentos que deverão ser efetuados.
Inúmeras sugestões estão sendo dadas á nova governante — aquelas que nos parecem que carregam em si a força que merece fé devem ser ditas, mas acreditamos que no momento presente nos cabe aguardar os primeiros embates, desfechos, querelas e lutas intestinas que naturalmente irão surgir tanto de partidos como de sindicatos, com o objetivo lógico no que diz respeito à obtenção para seus filiados, aptos ou não, de cargos de projeção do Governo.
Queremos crer que, como inteligentemente fez o sagaz Presidente Lula, os homens que se responsabilizarão pelos novos encargos nos Ministérios provavelmente serão mantidos ou remanejados entre aqueles que demonstraram perfeitos conhecimentos dos assuntos das Pastas ministeriais; se assim não o fizer, arcará Dilma Roussef, ao que cremos, com um possível fracasso inicial.
Quanto ao Congresso, nos deixaram alguns senadores e deputados de boa cepa, mas em compensação ganhamos alguns outros que merecem fé .Vamos reeditar a luta em torno do que se chama democracia, a qual se pretende equilibrar em torno de suas esperanças, cerca de 185 milhões de habitantes espalhados entre 26 Estados e um Distrito Federal.
Não queremos retroceder para avaliar questões pessoais ligadas aos nomes destes ou daqueles. Venceram, com uma sociedade dividida que lhes deu ganho de causa, em um pleito sobre o qual o TSE nada encontrou de ilegal. Conquanto tenhamos, e isso é um direito inalienável de deliberarmos e agirmos como desejamos, quando não afrontada a lei, evidentemente que nos cabe considerar que o momento oportuno nos leva a aguardar os acontecimentos. A inteligência às vezes vale mais que a cultura, e nós levamos muitos anos vendo esse filme no decorrer do Governo Lula; daí a sua popularidade e aceitação do povo.
Sociedade dividida, como já dissemos, entre os que se deixam comprar pela ambição dos cargos, outros que aguardam polpudos empregos sem pensar sequer na correspondência dos seus encargos; sociedade dividida entre aqueles que cursam colégios particulares e universidades caras e outros jovens que nem sequer têm curso primário; daqueles que não possuem qualquer plano de saúde, mourejando na porta dos hospitais públicos, na esperança de serem atendidos desde as primeiras horas das manhãs. Essas paisagens, essas fotografias, são as que não desejaríamos colocar no álbum da Pátria.
Não há como julgar possíveis melhoras. Reações contadas na História já se deram quer na área civil como militar, ante a procura de melhores dias em prol do nosso povo, e aí está conosco a volta dessa pasmaceira que nos leva ao descrédito de nós mesmos. Mas, como dissemos, vale a esperança. Como debaixo de um mágico, ela poderá surgir (com que feitio não adivinhamos), em um momento oportuno, cheia de brio e de orgulho: “A salvação do Estado: a Lei”.
Tudo indica que, dentro em pouco, estaremos assistindo à festa dos novos empossados, com grande número daqueles que já têm seus nomes gravados nas cátedras do Congresso, de onde não pretendem se afastar, por ser tão fácil manterem-se nessa postura de mando e poder enquanto assim o desejarem, saltando de senadores a deputados, a bel-prazer.
Como mudar essa imagem aos nossos olhos, já cansados de ver tanta falta de escrúpulos? Ah, sim! Temos agora a Lei da Ficha Limpa, mas os tribunais, cujos juizes conflitam entre si, salvaguardando suas conclusões em razão da exuberância dos dispositivos jurídicos, encontram dificuldades em interpretá-la, daí o tempo decorrido sem qualquer solução ao primordial assunto.
No caso do Brasil, o Poder Judiciário não pode ser considerado de peso, uma vez que seus juizes são indicados pelo Executivo, evidenciando-se, assim, que os tribunais não possuem certa autonomia, podendo curvar-se a interesse superiores que também incidem sobre a questão de benefícios burocráticos e financeiros para o sistema. Aguardam-se as mudanças propostas para o sistema judiciário brasileiro, o que talvez venha a modificar e preencher essa lacuna.
Torna-se difícil concebermos que a programação de projetos que venham a atender à evolução sociopolítica da Nação possa ser cumprida sem que haja um poder uníssono que venha amalgamar tais pretensões e que parta do Executivo, demonstrando pleno interesse no desmonte de quaisquer dificuldades que se apresentem. Para que se dê tal coisa, necessário se torna que haja no Congresso alto interesse no assunto em pauta por parte dos partidos que apóiam o Governo e também da própria sociedade, uma vez que estimamos que o interesse a ser demonstrado pelo povo, o verdadeiro fiscal das ações governamentais, possa refletir-se na redução de abusos e crimes de corrupção infiltrados em nossa administração pública desde há muito, permitindo a sua imediata apuração e punição adequada.
Para fechar, apontamos aqui o que desejaríamos viesse a ser considerado lei, passível da devida punição, a ser fixada por decisão judicial: receber remuneração condizente com a sua atividade ocupacional, em termos de garantir o seu sustento e de sua família. É isso que se deseja para cada brasileiro, mas tornar-se rico à custa do erário, sem que o seu trabalho seja condizente com os valores recebidos, isto é imoral, inconcebível e ultrajante ao regime democrático.
*Bernardino Capell Ferreira é jornalista, escritor, sócio da ABI e membro titular do Instituto de Geografia e História Militar do Brasil.