A Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos — órgão vinculado à Secretaria de Direitos Humanos, ligada à Presidência da República — abriu sindicância para apurar denúncias sobre a
ameaça sofrida por uma equipe do Globo no Pará, na última segunda-feira, 23 de julho, pelo Prefeito do município de Redenção, Wagner Fontes (PTB-PA), candidato à reeleição.
Os repórteres ameaçados foram Carolina Benevides e o fotojornalista Marcelo Piu, que foram a Redenção apurar denúncias de fraude envolvendo a Prefeitura local. Os jornalistas saíram da cidade escoltados por dois policiais federais, depois de serem ameaçados pelo prefeito durante uma entrevista:
— Estou falando para que você embase suas perguntas, até para que você possa refletir sobre o que eu vou te dizer. Se (alguém) falar mal a fim de difamar, pode ser que amanhã ou depois esteja morto, disse Wagner Fontes.
Para reforçar a sua intimidação, o prefeito contou a história de um blogueiro da região conhecido como Júnior que foi procurado por ele e teria sumido no dia seguinte do encontro. Wagner Fontes contou o que disse ao blogueiro:
— Se você continuar fazendo o que está fazendo comigo, a injustiça que está fazendo comigo, vai custar caro para você. Porque pode ter certeza absoluta de que Deus vai colocar a mão sobre você e cobrar o que você está fazendo comigo, relatou Fontes.
Wagner Fontes disse ainda que não sabe se o blogueiro repensou ou se foi preso: “Ele sumiu”, afirmou Fontes que disse ter “visão ampla da liberdade de imprensa” e continuou falando do blogueiro:
— Ele foi preso. Não foi por minha causa. Houve uma coincidência, a polícia estava concluindo um processo de investigação. Foi preso como traficante, contou.
Registro
Conforme noticiou a Agência Globo, os repórteres registraram a ameaça na Polícia Federal (PF) de Redenção, que lhes deu proteção até a manhã de terça-feira, 24 de julho, destacando dois agentes federais para acompanhá-los até a saída do perímetro urbano do município, na divisa com Tocantis.
Assim que os policiais federais retornaram à cidade, dois policiais militares pararam o carro da equipe e pediram carona. O delegado da PF, Luiz Felipe da Silva, foi avisado e fez com que a equipe do jornal retornasse à cidade. Disse o delegado que estranhou o episódio, pois em Redenção não é comum que PMs abordem carros pedindo carona. O fato foi registrado como adendo à certidão de ocorrência.
No documento, consta que o “prefeito coagiu e ameaçou a equipe, tendo deixado transparecer que um acidente poderia acontecer ou ainda que algo ilícito poderia ser encontrado com a equipe”. De acordo com os registros, um funcionário da Prefeitura teria dito ao fotógrafo que sabia qual era o carro da reportagem, além de perguntar em que hotel a equipe do Globo estava hospedada.
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Em entrevista, o advogado e primeiro-secretário jurídico do PTB, Luiz Gustavo Pereira da Cunha, disse que o partido “repudia qualquer censura à imprensa”:
— Esse episódio é lastimável, pedimos desculpas antecipadas, disse o advogado, afirmando que, caso O Globo peça esclarecimentos à Executiva Nacional, esse pedido será levado ao Conselho de Ética do PTB, declarou Pereira da Cunha.
Enquanto isso, a Polícia Militar do Pará disse “não identificar ameaça à vida ou integridade física da jornalista ou das pessoas que estavam com ela”. O órgão policial pediu que a queixa seja feita por escrito.
Repúdio
Em nota divulgada nesta quinta-feira, 26 de julho, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) também
se manifestou sobre o caso. Segundo a diretora-executiva da entidade, Veridiana Sedeh, a Abraji “repudia a ameaça sofrida” pela equipe do
Globo.
A Abraji manifestou preocupação com a violência contra jornalistas no interior do Brasil, onde muitos profissionais têm sido assassinados. “A violência contra jornalistas no interior do Brasil é preocupante e configura um grave atentado à liberdade de expressão”, diz a nota da entidade que cobra que o caso seja apurado com rigor.
Já o Comitê de Liberdade de Expressão da Associação Nacional de Jornais (ANJ) afirmou que “considera esse episódio um claro atentado ao direito de informar e de ser informado”.
Comitê
A Ouvidoria da Secretaria Nacional de Direitos Humanos pretende solicitar aos órgãos policiais e ao Ministério Público (MP) registros sobre as ameaças. O órgão só deve se pronunciar após analisar o caso.
A criação de um comitê para acompanhar as investigações de crimes cometidos contra jornalistas foi proposta recentemente à Ministra da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, Maria do Rosário, por representantes de sindicatos e associações de jornalistas, entre as quais ABI. Na ocasião, o Presidente da entidade, Maurício Azêdo, disse que a reunião “abriu o caminho para definição de medidas que menos exponha a risco a atividade profissional de jornalista.
Ao Extra Online, o Presidente da Confederação Nacional de Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski, também comentou as ameaças à equipe do Globo, e frisou o respeito que é devido ao trabalho da imprensa:
— A gente sabe que a situação (violência) é muito complicada na região. O município é filiado à CNM, mas somos uma entidade de municípios, não representamos os prefeitos. Sem entrar no mérito do caso, a imprensa tem que ser respeitada. Se vivemos numa democracia, a liberdade é um direito fundamental. Nós defendemos o direito de informação, o acesso à informação plena, de modo geral, sem constrangimento ou omissão, disse Ziulkoski.
* Com informações do Globo e Extra Online.