28/11/2016
Deputados contemplados com doações através do caixa 2, eufemismo criado para legitimar propina de empreiteiras, tentam descriminalizar a origem desses recursos espúrios. ABI endossa artigo do conselheiro Luís Carlos Azedo publicado no Correio Braziliense. Azedo criticou a manobra dos deputados em artigo publicado na edição de sábado. O Congresso em Foco divulgou a lista apreendida pela Polícia Federal na Odebrecht, com mais de 300 políticos mencionados em documentos.
Temer, Renan e Maia dizem que não vão barrar anistia do caixa 2
O presidente da República, Michel Temer, e os presidentes do Senado Federal, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), anunciaram, neste domingo (27) um acordo para barrar a anistia ao caixa 2, que vinha sendo discutida, pelos parlamentares, no bojo do pacote das dez medidas contra a corrupção. Temer disse que há unanimidade dos dirigentes do poder Executivo e Legislativo para atender a voz das ruas.
“Estamos aqui para revelar que, no tocante à anistia, há uma unanimidade dos dirigentes do Poder Executivo e do Poder Legislativo. Verificamos que é preciso se atender à voz das ruas, o que significa reproduzirmos um dispositivo constitucional que diz: o poder não é nosso; não é nem do presidente da República nem do Senado nem da Câmara. É do povo. Quando o povo manifesta a urgência, ela há de ser tomada pelo Poder Legislativo e igualmente pelo Executivo”, disse Temer ao abrir a coletiva de imprensa no Palácio do Planalto.
Segundo ele, esse “ajustamento institucional” foi feito com vistas a “impedir a tramitação de qualquer proposta” que vise a chamada anistia. “Até porque essa questão da anistia, em um dado momento, viria à Presidência da República, a quem caberia vetar ou não vetar”, acrescentou.
Temer garantiu que “seria impossível ao presidente da República sancionar uma matéria dessa natureza”, e que isso já vinha sendo dito durante reuniões dele com os presidentes do Senado, Renan Calheiros, e da Câmara, Rodrigo Maia. “Apontamos (nessas reuniões) que não há a menor condição de levar adiante essa proposta”.
Rodrigo Maia negou que as lideranças da Câmara estivessem atuando no sentido de incluir na proposta matérias visando a anistia. “Foi colocado com os líderes que não podíamos tratar de anistia eleitoral nem a qualquer outro crime. Esse debate nunca aconteceu e, com certeza, nunca acontecerá quando colocarmos para votação, provavelmente na terça-feira”, disse.
“A reunião de hoje é importante para esclarecermos que essa emenda nunca existiu efetivamente porque nunca foi apresentada por nenhum líder partidário. Portanto não existe. Não estamos votando medidas para anistiar nenhum crime”, acrescentou.
Renan também garantiu que atuará conjuntamente para evitar a aprovação de matéria que anistie crimes eleitorais. “Nós estamos fazendo um acordo, um ajuste institucional no sentido de que não haverá apreciação de anistia a crime eleitoral, ao caixa dois ou a qualquer crime eleitoral, até porque tudo que é aprovado vai para veto. Portanto, as presidências da Câmara e do Senado chegaram à conclusão de que essa matéria não deve tramitar.”
Artigo de Luis Carlos Azedo, no Correio Braziliense
Nas entrelinhas: Tapa na cara do cidadão
Publicado em 27/11
Políticos que receberam dinheiro de caixa dois da Odebrecht estão à beira de um ataque de nervos e dispostos a pôr um fim à Operação Lava-Jato
O Brasil não é para principiantes, dizia Tom Jobim; ou seja, não é para amadores, ainda mais quando se trata do Congresso Nacional. As Dez Medidas Contra a Corrupção, com mais de dois milhões de assinaturas, são resultado de uma iniciativa dos procuradores da República para endurecer o jogo contra empresários, executivos e políticos corruptos, mas estão servindo de cortina de fumaça para aprovação de uma lei que anistia os envolvidos na Operação Lava-Jato. Por duas vezes, a manobra já foi tentada e fracassou em plenário, mas, na próxima terça-feira, voltará à pauta da Câmara dos Deputados. O presidente da casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), nega a existência do substitutivo e garante que, se for apresentado, o submeterá à votação nominal.
O problema é que desde a Constituição de 1824, outorgada por D. Pedro I, o Brasil mimetiza leis aparentemente progressistas para manter o status quo. Nossa primeira Carta Magna era de inspiração liberal, mas a introdução do direito à propriedade privada como cláusula pétrea não mirava o desenvolvimento do capitalismo, o objetivo era apenas preservar a escravidão, que somente acabou em 1888, com a Lei Áurea. Assinada pela Princesa Isabel, a abolição só chegou quando a monarquia já não se aguentava em pé. É mais ou menos o que se quer fazer agora com aprovação de uma legislação que, ao “criminalizar” o caixa dois eleitoral, absolve todos os crimes praticados no escândalo da Petrobras, isto é, salvar o “capitalismo de laços”, seus oligarcas e nababos da dèbâcle em que se encontram.
Foi muita ingenuidade dos procuradores acreditar na aprovação de uma legislação que apartasse as doações eleitorais das empreiteiras por meio de caixa dois dos crimes conexos, como recebimento de propina, superfaturamento de obras, desvios de recursos públicos, lavagem de dinheiro e enriquecimento ilícito. Essa atribuição é do Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar os processos da Lava-Jato. Os deputados da comissão especial aprovaram o relatório do deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), mas esqueceram de combinar com os políticos já enrolados na Operação Lava-Jato, que jamais aceitarão isso.
Não foi à toa que dois lobbies se digladiaram nos bastidores da Câmara, de quarta para quinta-feira, enquanto a comissão varava a madrugada para aprovar o relatório. De um lado, procuradores de todo o país abordando os deputados de suas relações; de outro, o poderoso lobby das empreiteiras com advogados e assessores de relações institucionais. A votação em plenário foi suspensa, mas a Odebrecht adiou a assinatura do seu acordo de delação premiada, aparentemente porque Marcelo Odebrecht ainda se recusava a fazê-lo. A moeda de troca das empreiteiras na Câmara não é mais a mala cheia de dinheiro, é o medo dos deputados em risco de encerrarem a carreira política na cadeia. Na verdade, trata-se de uma corrida contra o relógio para aprovar a anistia antes da delação.
Efeito Borboleta
A teoria do caos (ou seja, o estudo da desordem organizada) explica melhor a situação. Quando simulou no computador a evolução das condições climáticas, seu autor, o meteorologista Edward Lorentz, acreditava que pequenas modificações nas condições iniciais de ventos e temperaturas acarretariam alterações também pequenas na previsão do tempo. Mas o resultado foi o contrário: pequenas modificações nas condições iniciais provocaram efeitos desproporcionais. Em um ou dois dias, eram insignificantes; em um mês, os efeitos produziam padrões catastróficos.
É mais ou menos o que está acontecendo em relação à criminalização do “caixa dois”. Todos os políticos que receberam dinheiro de caixa dois da Odebrecht estão à beira de um ataque de nervos e dispostos a pôr um fim à Operação Lava-Jato, numa manobra que acabaria também por beneficiar os demais envolvidos: empresários, executivos, lobistas e doleiros. Quem viu o filme Efeito Borboleta pode imaginar outras consequências. “Essa proposta de anistia do caixa dois de campanhas é um tapa na cara do cidadão honesto desse país”, criticou o senador José Antônio Reguffe (sem partido/DF), em pronunciamento no Senado. É mais ou menos o sentimento generalizado da sociedade. Seus colegas, porém, estão chamando o povo de volta às ruas.
Segue a lista da Odebrecht com mais de 300 políticos mencionados nos documentos apreendidos pela Polícia Federal: