23/02/2022
Morre de complicações de Covid o cineasta Geraldo Sarno
O cineasta baiano Geraldo Sarno que morreu ontem, à noite, aos 83 anos. Ele estava internado no Copa D’Or, no Rio de Janeiro, há um mês em decorrência de complicações da Covid-19, já tinha tomado as três doses da vacina e preparava um retorno para sua cidade natal, Vitória da Conquista. O cineasta Silvio Tendler, curador do Cineclube Macunaíma que exibiu o último filme do diretor, Sertânia, e fez debate disponível no canal da ABI do YouTube, ressaltou a importância do diretor para o cinema nacional.
“Sarno da safra dos anos 60 veio lá da Bahia, foi estudar cinema em Cuba e fazer documentário. Fez vários filmes importantes para o cinema brasileiro para compreender a nossa realidade. Sarno é dessas perdas imensas porque foi um descobridor de Brasis. Ele fez muitos filmes como o jornal dos jornais do sertão em que faz um estudo sobre as revistinhas, os cordéis. A estreia dele foi com Viramundo, música de Gilberto Gil, onde faz um estudo sobre a migração brasileira, os nordestinos que vão para São Paulo. Fenomenal. Ele estudou religiões, fez filmes sobre candomblé e a igreja da Libertação. Sempre acompanhou os movimentos da humanidade. Sempre renovando a linguagem. Sertânia, o último filme que nós assistimos, exibimos e debatemos no Cineclube Macunaíma da ABI é uma renovação completa da linguagem. Fará muita falta”.
Filmes
“Viramundo”, primeiro filme de Geraldo, foi filmado em São Paulo e faz parte da história do cinema brasileiro sobre a migração dos nordestinos para a capital paulista, fugindo da fome e da seca e do surgimento de um sistema religioso neopentecostal. O longa-metragem está disponibilizado na íntegra no site do diretor e tem imagens preciosas da cidade em 1964, sendo lançado semanas antes do Golpe Militar.
Sertânia, seu último filme, foi exibido e debatido no Cineclube Macunaíma da ABI, em 2 de março do ano passado, e em menos de 24h teve mais de mil expectadores. O debate com o diretor está no canal da ABI no YouTube no link https://youtu.be/FxaXva7tpfI.
Geraldo Sarno faria 84 anos no próximo dia 6 de março e ficou conhecido por abordar temas como o movimento migratório brasileiro (em especial o nordestino), as religiões e cultura populares.
Sertânia tem referências ao movimento cinematográfico do Cinema Novo e Glauber Rocha; a fotografia em preto e branco e a montagem descontinua agregam maior valor ao filme, assim como as discussões raciais e a miséria nordestina. O delírio do cangaceiro Antão, ou Gavião, papel do ator Vertin Moura, estrutura o longa. Sobrevivente da matança de Canudos, ele é levado ainda garoto para São Paulo onde faz carreira militar. Mas, ao perder a mãe, faz a viagem de volta e ingressa no bando do Capitão Jesuíno, interpretado por Julio Adrião, que invade a cidade de Sertânia. Começa na caatinga a agonia de Antão que, baleado, delira e vai à terra dos mortos em busca do pai executado pelos militares no arraial de Antonio Conselheiro. O cineasta Edgar Navarro vive o líder messiânico. Na figura do migrante, o sertão se desloca para o país industrializado.
Em 2008, recebeu o prêmio de melhor direção no Festival de Brasília, pelo filme “Tudo isto me parece um sonho”, sobre a história do general pernambucano Ignácio Abreu e Lima, que, ao lado de Simon Bolívar, participou de batalhas que resultaram na libertação da Colômbia, Venezuela e Peru da Coroa Espanhola no século XIX. O filme, com 97 minutos e inédito nas salas cinematográficas, passou pelo Festival de Havana, pela Mostra de Tiradentes e pelo Festival Ecrã, despertando tanto entusiasmo de críticos e cinéfilos durante a quarentena que voltou a ser exibido na plataforma online do Festival Olhar de Cinema, de Curitiba.