10/08/2006
Belo Horizonte, julho de 2006
Ao povo de Rondônia
Aos camponeses, trabalhadores, intelectuais, democratas e honestos de todo o Brasil
Provavelmente no mês de agosto, estará indo a júri popular, em Porto Velho, Rondônia, o camponês Wenderson Francisco dos Santos, o Ruço.
Este júri não terá as luzes e a milionária cobertura da imprensa, internet, jornais, rádios e televisões, como a dedicada ao assassinato de um casal da classe média alta de São Paulo, ao que tudo indica cometido pela própria filha e seu namorado.
Mas será centenas, milhares de vezes mais importante.
Pois junto com Ruço, no banco dos réus, estará em jogo a saga de milhões de brasileiros pobres, particularmente dos camponeses que vivem em Rondônia.
Ruço chegou a Rondônia com seu pai no início dos anos 90. “Seu” Odiel veio de Belo Horizonte, onde chegou expulso pela miséria de uma das regiões mais pobres de Minas, do Brasil e do mundo, o Vale do Jequitinhonha.
Trabalhando como vigilante, ganhando pouco mais que o salário mínimo, com problemas de saúde, “seu” Odiel empreendeu o caminho de volta para o campo, foi para Rondônia.
Conseguiu um lote, plantou café. A saca entre R$ 190,00, R$ 200,00. No final dos anos 90, crise. A saca a menos de R$ 50,00. O caso se repete. No Brasil, latifundiários conseguem repetidos perdões de suas milionárias dívidas com os bancos oficiais, enquanto circulam com carros do ano e roupas de grife. Os camponeses pobres preferem honrar o nome. O pai de Ruço, “seu” Odiel, vendeu seu lote.
Foi trabalhar com os filhos que, mesmo jovens, vendo as agruras do pai, decidiram lutar pela terra junto com a Liga dos Camponeses Pobres de Rondônia, cuja origem remete às famílias que resistiram ao bárbaro, cruel e covarde ataque das forças policiais do Estado na Fazenda Santa Elina, Corumbiara, sul de Rondônia,1995, cujas cenas de torturas e execuções sumárias chocaram a nação, e até hoje, passados mais de 10 anos, estão impunes.
Ruço, seu pai e seus irmãos viviam e trabalhavam em Cujubim, norte do estado, em 2003, quando se acirram as contradições no campo.
Ao contrário de todas as expectativas alardeadas após o resultado do processo eleitoral de 2002, aumentam as mortes de camponeses assassinados por pistoleiros a mando de latifundiários, como denunciaram diversas entidades nacionais e internacionais, e como reconheceu a própria Ouvidoria Agrária Nacional, do Ministério do Desenvolvimento Agrário.
É neste cenário que em Jaru, na região de Seringal, distante aproximadamente 200 Km de Cujubim, o latifundiário Antônio Martins dos Santos, conhecido na região por “galo velho”, dono da Leme Empreendimentos, citado no “Livro Branco da Grilagem de Terras” (Ministério do Desenvolvimento Agrário, 1999-2002) como um dos maiores grileiros do país, espalha o terror na região. Seus pistoleiros, a céu aberto, em plena luz do dia, fazem bloqueios nas estradas vicinais, revistando e humilhando camponeses, incendiando barracos e espalhando ameaças de morte na região.
Os camponeses acampados na área procuraram a justiça, pelo seu advogado peticionaram solicitando a inclusão da área como “área de conflito agrário”, tentaram acionar o próprio Incra, mas nada, as autoridades fizeram ouvidos de mercador.
Em circunstâncias no mínimo estranhas, um dos pistoleiros de “galo velho” aparece morto, e aí então surgem do nada as autoridades do Estado.
Começa o calvário de Ruço.
Junto com outros dois camponeses ativistas da Liga dos Camponeses Pobres, é preso. Acusado por um outro conhecido pistoleiro (guaxeba, como falam os camponeses de Rondônia), parente de “galo velho”, que em depoimento (não confirmado posteriormente) afirmou ter reconhecido “Ruço” mascarado a 100 metros de distância. Pasmem!
Se os outros dois camponeses foram liberados por insuficiência absoluta de motivos para que permanecessem detidos, foi desencravado contra Ruço um processo antigo por um conflito em um bar, transformada a acusação em tentativa de homicídio, e Ruço condenado.
Desde então, o camponês pobre Wenderson Francisco dos Santos, o Ruço, passou a ser um refém do latifúndio contra o movimento camponês combativo.
Preso, Ruço não pôde velar o pai. Após insistentes apelos de seus companheiros, foi conduzido por 8 policiais quando do momento exato do sepultamento, cena chocante que causou comoção e indignação.
Só escapou da morte na cadeia de Jaru pela intervenção firme dos outros presos, quando pistoleiros conhecidos na cidade e ligados a “galo velho”, foram detidos por crimes diversos (todos foram soltos posteriormente), e urdiram uma intriga para assassiná-lo.
Quando, enfim, já cumprira parte da pena a que fora condenado e teria direito a liberdade provisória, mesmo diante da manifestação do Ministério Público a seu favor, Ruço foi mantido preso, conforme reconheceu a própria autoridade, por ser “membro da Liga dos Camponeses Pobres”.
Diante da insistência de seu advogado em enfrentar sua prisão arbitrária, Ruço foi visitado na cadeia por suposto representante de uma seção regional da OAB, advogado, por sinal sócio de um irmão de “galo velho” em escritório em Porto Velho, que o pressionou para que destituísse seu representante legal para que o “Júri” fosse realizado rapidamente. Absurda vilania e falta de ética profissional, comprometendo o nome de uma entidade respeitada por suas tradições democráticas.
Mais ainda.
Após manifestação pacífica de camponeses em Jaru pedindo sua libertação, Ruço foi ilegalmente transferido para a famigerada penitenciária de Urso Branco, em Porto Velho (repetidamente condenada, por organismos da própria OEA, pela violação dos direitos humanos), sob a alegação de que os camponeses pretendiam invadir a delegacia de Jaru para retirá-lo à força.
Na Urso Branco, como todos os outros presos, Ruço têm sido submetido a toda sorte de torturas morais e psicológicas, como pretendem qualificar os que definem a tortura somente quando ocorre o espancamento de um cidadão.
Já basta!
Os inocentes não podem continuar pagando por crimes que não cometeram, carregar nas costas o fardo de 5 séculos de latifúndio!
Tomamos a liberdade de nos dirigir aos rondonienses, com humildade mas reconhecendo que nossas assinaturas nesta carta representam significativa parcela dos democratas brasileiros, no sentido de manifestar apoio e esperança de que a decisão do júri popular resgatará a verdade, a justiça, e impedirá que se consume mais uma condenação, como tantas na história, que depois se transformarão em exemplos de uma sociedade putrefata moral, econômica e socialmente, onde prevalece o poder econômico e a opressão.
Raquel Scarlatelli
Presidente do CEBRASPO / Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos
Coordenadora da ILPS / Liga Internacional de Luta dos Povos
Gerson Lima – Liga Operária
Osmir Venuto – Presidente do Sindicato dos Trabalhadores na
Indústria da Construção de Belo Horizonte e Região Metropolitana
Geraldo Mascarenhas – Coordenador Político do Sindicato dos
Trabalhadores em Transporte Rodoviários de Belo Horizonte.
Considerando o conteúdo dos fatos acima, os signatários vêm manifestar sua solidariedade ao camponês Wenderson Francisco dos Santos, o Ruço, na esperança de que lhe seja feita justiça.
1. FEDERAÇÃO DOS TRABALHADORES DO TRANSPORTE RODOVIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS
2. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS E ANEXOS DE ALFENAS
3. SINDICATO DOS CONDUTORES DE VEÍCULOS RODOVIÁRIOS DE ARAXÁ
4. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE ARCOS
5. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE BARBACENA
6. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE BELO HORIZONTE
7. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE BETIM
8. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE BRUMADINHO
9. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE CONSELHEIRO LAFAIETE
10. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE CONTAGEM
11. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE CORONEL FABRICIANO
12. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE CURVELO
13. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSPORTES RODOV DE DIVINÓPOLIS
14. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE FORMIGA
15. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE GOVERNADOR VALADARES
16. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE ITABIRA
17. SINDICATO DOS CONDUTORES DE VEÍCULOS RODOVIÁRIOS DE ITAÚNA
18. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE ITUIUTABA
19. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE LAVRAS
20. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE LEOPOLDINA
21. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE MONTES CLAROS
22. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE MURIAÉ
23. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE OURO PRETO
24. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE PARACATU
25. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE PARÁ DE MINAS
26. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE PASSOS
27. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE PATOS DE MINAS
28. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE POÇOS DE CALDAS
29. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE PONTE NOVA
30. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE POUSO ALEGRE
31. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE SÃO JOÃO DEL REI
32. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE SETE LAGOAS
33. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE TEÓFILO OTONI
34. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE UBERABA
35. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE UBERLÂNDIA
36. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSP. RODOVIÁRIOS DE VARGINHA
37. Mário aparecido da Silva Sindicato dos Trabalhadores C. C. Alfenas
38. Sindicato dos Trabalhadores da Const. de BH e Região
39. Valdemoro Gualheno SINTICOM – Viçosa
40. José Justino SINTICOM – Viçosa
41. Fernando Carlos da Silva Sindicato dos Marceneiros
42. Maurício S. Assis STIC e MOB. Poços de Caldas
43. José Natalicio Oliveira STIC e MOB. Poços de Caldas
44. Joaquim Julio de Almeida STCM Passos
45. José Aparecido dos Santos SITCOJ
46. Geraldo Fernando Esteves SINTICOMEX
47. Joaquim Miranda de Godoi SINTICOMEX
48. Jaime Batista Nunes STI Teófilo Otoni
49. José Diogo Costa STIC Itabora
50. Benedito Sabino STIC Itabira
51. Francisco de Paula Costa STIC Itabira
52. Claudio Simão Sindicato dos Trabalhadores C. C. Pará de Minas
53. Teófilo Ribeiro da Silva Sinticom Vespasiano
54. Paulo H. Da Silva Sind. Const. Betim
55. Valdeci Geraldo as Silva Sindicom SJDR
56. Márcio Mendes Sind. Const. Civil Juiz de Fora
57. Victor Manuel Correa Espinoza Sind. Const. Civl TC
58. Guigermo Correa Sind. Const. Civil TC
59. Federação dos Trabalhadores da Construção e do Mobiliário do Estado de Minas Gerais
60. Sindicato dos Trabalhadores da Construção de Santa Luzia
61. Sindicato dos Comerciários de Belo Horizonte e Região
62. Sindicato dos Comerciários de Betim
63. Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria – Minas Gerais – CNTI
64. Frederico Santana Cáritas BR – MG
65. Luiz Carlos P. Lemos UTE – ITER
66. Eliene Ap. Ribeiro da Silva Fetaemg
67. Ademar Luis MST
68. Marcelo S. Picini Cáritas
69. Valquiria alves Smith Cáritas
70. Mauro Lemes MST
71. Diretório Acadêmico de Comunicação Integrada PUC MG – Belo Horizonte
72. MEPR – Movimento Estudantil Popular Revolucionário
73. Liga Operária
74. Frente Revolucionária de Defesa dos Direitos do Povo
75. MFP – Movimento Feminino Popular
76. Escola Popular Orocílio Martins Gonçalves
77. Socorro Popular
78. LPM – Luta Popular pela Moradia
79. Deputado Federal Sérgio Miranda (PDT/MG)
80. Aluísio Sindicato dos Eletricistas de BH
81. Marcio Antenor Sindicato dos Trabalhadores da Construção de Arcos
82. Geraldo Soares Sindicato dos Trabalhadores da Construção Governador Valadares
83. UCMG – União Colegial de Minas Gerais
84. 26º ENEPE (Encontro Nacional de Estudantes de Pedagogia)
85. EXNEPE (Executiva Nacional de Estudantes de Pedagogia)
86. Curso Pré-vestibular Popular Pedro Pomar (Niterói / RJ)
87. Raphael Martinelli – advogado do Fórum dos Ex-presos e Perseguidos Políticos de São Paulo
88. Luiz Cardoso – advogado do Fórum dos Ex-presos e Perseguidos Políticos de São Paulo
89. Maurício Azêdo – Presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI)