O corpo do jornalista e professor Antonio Theodoro de Magalhães Barros foi velado na Capela 4 do cemitério São João Batista, em Botafogo, Zona Sul do Rio, e enterrado nesta quarta-feira, dia 17, às 11h. Theodoro Barros morreu aos 78 anos, na manhã desta terça-feira, dia 16, no hospital Prontocor, unidade da Lagoa, com quadro de mielodisplasia.
Ex-diretor do jornal Última Hora, Theodoro Barros ingressou no jornalismo em 1959, no Diário Carioca. Atuou como repórter, redator e editor nas redações do Correio da Manhã, O Jornal, O Globo e revista Manchete.
Foi o primeiro docente da Universidade Federal Fluminense (UFF) a receber o título de professor emérito, tendo se dedicado ao magistério superior por mais de 30 anos. Integrou a equipe de professores que ajudaram a formar as primeiras turmas de Jornalismo, entre os quais Muniz Sodré, Nilson Lage, Érika Werneck e Rosental Calmon Alves.
Lecionou as disciplinas Redação e Edição, Administração de Empresa Jornalística, Jornalismo Internacional e Jornalismo Político. Foi diretor do Departamento de Comunicação Social e fez parte da Comissão de Especialistas em Comunicação Social da Secretaria de Ensino Superior (Sesu) do Ministério da Educação.
Pós-Graduado em Ciências Políticas, Econômicas e Sociais pelo Instituto de Altos Estudos da América Latina – Universidade Paris III, Theodoro Bastos concluiu também o curso de bacharel em Administração pela Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas.
Muito ligado à ABI, Theodoro Bastos participou, em 13 de julho de 2011, do lançamento do livro “A Última Hora, como ela era”(Mauad-X), o jornalista Pinheiro Júnior. Na ocasião, foi realizado o debate “Última Hora – 60 anos, Os Sobreviventes”, no Auditório Oscar Guanabarino, no 9º andar do edifício-sede da Associação Brasileira de Imprensa.
A mesa de honra, coordenada pelo Presidente da ABI, Maurício Azêdo, contou com a participação de jornalistas que atuaram na Última Hora, entre os quais Theodoro Barros, e os Conselheiros da ABI Milton Coelho da Graça, Pinheiro Júnior, Domingos Meirelles, Pery Cotta, Alcyr Cavalcanti e Benício Medeiros.
Na ocasião, Theodoro Barros ressaltou a sua experiência no UH, sobre a qual escreveu o livro “Nos tempos de Samuel Weiner – A Última Hora” (1993), editado pela ABI.
—Na condição de um dos poucos sobreviventes, tive a alegria de reencontrar aqui alguns dos colegas da época da Última Hora, que realmente foi um jornal que revolucionou a imprensa carioca. Antes da Última Hora trabalhei no Diário Carioca e depois no Correio da Manhã. Mas foi na Última Hora, em várias funções, a última delas como editor internacional, que me realizei como jornalista, não só fazendo reportagens, mas principalmente editando a parte do noticiário internacional. Pena que hoje nós sejamos tão poucos e que a Última Hora esteja tão longe, 60 anos. Mas o exemplo que a Última Hora deu como linha de conduta e cobertura jornalística vai continuar a fazer seguidores. Fui professor da Universidade Federal Fluminense e tenho a esperança de que alunos e ex-alunos que hoje militam na imprensa voltem a buscar as lições da Última Hora para que o nosso jornalismo melhore ainda mais.
Escrever
Em entrevista ao jornal Caroço, produzido por estudantes de Jornalismo da UFF, Theodoro falou sobre a sua trajetória na imprensa e no ambiente acadêmico:
“Quando jovem, sonhava em se tornar arquiteto, mas aos 18 anos ingressei na Marinha Mercante, viajando pelo mundo afora durante quatro anos.
Sempre gostei de escrever. O escrever tem duas raízes: praticar muito, escrevendo sempre, e, a principal, que é ler. E eu li muito. Inclusive, nesse período da Marinha, quando li dos clássicos aos grandes autores nacionais e estrangeiros.
Como futuros oficiais no navio-escola Guanabara, da Marinha de Guerra, éramos obrigados a bater ferrugem, raspar o chão com lona e areia. O conceito básico era o seguinte: a gente não pode mandar ninguém fazer nada se não sabe fazer. Esse é também o meu conceito em jornal e como professor.
Fui jogado no jornalismo em 1959 pelo Nelson [Pereira dos Santos], meu amigo de Icaraí, que era copidesque do Diário Carioca. O jornal não pagava, mas eu rapidamente fui promovido a um monte de coisa.
Depois fui para a Última Hora. Nessa época, havia no Rio de Janeiro 23 jornais. Era muito fácil ir de um para o outro. Só da UH fui cinco vezes. Do Diário fui duas, do Correio da Manhã, duas, além do Globo e da Manchete.
Junto com Maurício Azêdo, Presidente da ABI, trabalhei no início dos anos 1960, na sucursal do Diário Carioca, em Niterói, acumulando com a UH, onde era repórter. O Samuel me chamou e disse: ‘Você tá no DC ainda? Então larga, que nós vamos lançar a edição de UH do estado do Rio’. Como editor e diretor-responsável da UH fluminense fizemos um jornal popular mas principalmente político, apoiando as reformas pretendidas pelo governo João Goulart. O jornal também cobriu fatos dramáticos como a morte do Roberto Silveira [então governador do estado do Rio, morto em acidente de helicóptero] e o incêndio do Gran Circo Americano, com mais de 300 mortos.
O golpe militar de 1964 acabou com a Rede UH, então com 11 edições em sete estados e cerca de 500 mil exemplares diários. Juntamente com oito edições regionais, a UH fluminense foi proibida de circular. Sobraram apenas a UH Rio e a UH São Paulo. Restou-me ir para o Correio da Manhã, como copidesque, então batizado ironicamente de ‘os derrotados de abril’, por abrigar jornalistas perseguidos pelo regime militar.
No final de 1964, com uma bolsa de estudos concedida pelo governo francês, ingressei no curso de pós-graduação em Ciências Políticas na Universidade de Paris. No início do ano seguinte, reencontrei em Paris Samuel Wainer, que trocara o exílio no Chile pela França.
Como minha bolsa era de apenas 500 dólares, aceitei traduzir e adaptar matérias do jornal Le Monde e da revista L’Express para serem publicadas na coluna Europa Moderna, que aproveitava as matérias originais francesas, cedidas a UH por acordo obtido por Samuel. Na verdade, a coluna era um balão de ensaio para uma futura publicação, que seria impressa na França e circularia no Brasil.
Após sondagens feitas no Rio de Janeiro por Moacir Werneck de Castro, ficou claro que os militares não permitiriam tal projeto. Continuei fazendo a coluna, mais tarde transformada em uma página inteira, dentro da editoria internacional de UH, quando regressei ao Brasil no ano seguinte.
Graças ao material do Le Monde e da Express, fizemos a melhor cobertura brasileira da revolta estudantil iniciada em maio de 1968, em Paris, e que nos meses seguintes se alastrou por praticamente todo o mundo, inclusive em nosso país.
Outra cobertura internacional importante foi a da conquista da Lua. A partir da viagem de ida e volta à Lua pela Apolo 8, a UH passou a editar também uma página batizada de Jornal da Lua, que noticiava tudo sobre as expedições seguintes.
Na subida da Apolo 11, que levou os astronautas à superfície da Lua, em julho de 1969, planejamos tudo com antecedência: decidimos que uma única edição extra não bastaria, pois estaria superada rapidamente. Fizemos quatro edições, narrando as várias etapas da conquista do satélite, que complementavam o título “O Homem está na Lua. A Terra está em festa” e eram valorizadas com manchetes curtas e de impacto como “Andaram” (1ª extra), “Lua Conquistada” (2ª), “Pularam e dançaram” (3ª) e “Eles estão Voltando” (4ª). Na última das quatro extras ainda esnobamos os concorrentes, publicando em rodapé com oito colunas as reproduções das capas das edições com o título “As quatro fases lunares de UH”.
As pressões políticas e também financeiras sobre a Última Hora obrigaram Samuel Wainer a vender o título do jornal. Primeiro foi a UH São Paulo, negociada com o grupo Folha da Manhã, e, em 1971, a UH Rio, vendida para o grupo de empreiteiros que arrendara o Correio da Manhã.
Fui, então, trabalhar na Internacional do Globo e, paralelamente, como administrador na Telerj, à época Companhia Telefônica Brasileira (CTB). A pedido de Nilson Lage, passei para o copidesque. Mas a censura era brava. Não podíamos publicar quase nada. Joguei, então, a toalha: pedi demissão.
Para piorar, sofri um acidente de carro que me deixou afastado da Telerj por cerca de um ano. Já estava quase desesperado quando o mesmo Nilson Lage, que era professor da UFF, me convidou para ser dar aula.
Fiz os concursos públicos e me doutorei com uma tese mostrando como as grandes empresas jornalísticas eram as que tinham sabido se organizar administrativamente. Para me tornar professor titular, fiz outra tese, mostrando como a Última Hora renovou a imprensa brasileira.
Voltei à França como bolsista do MEC para fazer pós-doutorado no Instituto de Imprensa da Universidade de Paris, em 1979-1980, além de pesquisas sobre novas tecnologias da informação.
Após a aposentadoria no magistério em 2003, Theodoro Barros orientou monografias de conclusão de curso, participou de bancas examinadoras e ministrou palestras e conferências em seminários e congressos promovidos por diversas universidades públicas e particulares.
*Entrevista concedida a Andressa Camargo, Cláudia Lamego, Gustavo Monteiro, Luciana Gondim, Monique Oliveira e Olívia Bandeira de Melo.