18/02/2008
Em declaração divulgada nesta segunda-feira, 18 de fevereiro, a ABI externou a sua “extremada preocupação” com o conjunto de ações judiciais ajuizadas contra a Folha de S. Paulo e A Tarde, de Salvador, e a jornalista Elvira Lobato, repórter da Folha, por pastores e fiéis da Igreja Universal do Reino de Deus, que espalharam as ações por 20 estados e dezenas de municípios. A ABI considera que essas ações constituem grave ameaça à liberdade de informação e de expressão e pede à Anistia Internacional um movimento mundial em defesa dos dois jornais e da jornalista.
É o seguinte o teor de declaração:
“Como a mais antiga associação de imprensa do País e devotada desde a sua fundação, em 7 de abril de 1908, à defesa da liberdade de informação e de expressão, a Associação Brasileira de Imprensa acompanha com extremada preocupação o conjunto de ações judiciais ajuizadas contra os jornais Folha de S. Paulo e A Tarde de Salvador e contra a jornalista Elvira Lobato, repórter da Folha, por pastores e fiéis da Igreja Universal do Reino de Deus, que desencadearam contra esses órgãos e contra essa jornalista uma campanha de intimidação e coerção sem precedentes na história da comunicação no Brasil.
Ao longo de sua existência, o País conheceu a fúria repressiva do poder do Estado contra a liberdade de imprensa, como se deu sob o Estado Novo e sob a ditadura militar que nos infelicitou entre 1964 e 1985, mas jamais assistira a uma investida partida da própria sociedade civil contra a liberdade de informação com a abrangência e o conteúdo desta que se materializa nas ações judiciais armadas contra esses jornais e contra essa jornalista. Através desse procedimento, buscam os autores de tais ações obter a cobertura do Poder Judiciário para cercear e condicionar o exercício do direito de informação.
BR>Numa evidência de que há um cérebro e um comando a centralizar a instauração dessas ações judiciais, seus autores estão espalhados por quase 20 Estados da Federação, no caso da Folha de S. Paulo, e ajuizaram esses feitos em Municípios longínquos, numa clara demonstração de que a ação assim coordenada tem por objetivo dificultar a defesa da parte adversa. Há a nítida intenção de dificultar o direito de ampla defesa e do contraditório assegurado pela Constituição, em face da disposição da lei processual de que o alegado na inicial será tido como procedente se não houver contestação, ainda que se ressalve, nesta hipótese, a formulação de convicção própria pelo juiz.
A existência de um comando na ação liberticida fica patente também em outros aspectos desse conjunto de ações, que repetem a mesma redação em quase todas as petições, à exceção de umas poucas, fazendo a mesma descrição, exibindo os mesmos argumentos e formulando as mesmas postulações, entre as quais a concessão do benefício da justiça gratuita, para livrar os autores dos ônus materiais de sua iniciativa. Salvo um ou outro caso, em que se reclama o pagamento de indenizações por danos morais que variam entre R$ 10.000,00 e 12.000,00, os demandantes fixam o valor do pleiteado em R$ 1.000,00, para diminuir o montante de seu desembolso na hipótese de negação do pedido de beneficio da justiça gratuita pelo juiz da causa.
Subscritas por pastores mobilizados pela Igreja Universal como um encargo de seu ofício religioso ou por fiéis convocados para tal missão, essas ações constituem em seu conjunto intolerável agressão à ordem democrática, pelo empenho em substituir o exercício de direitos consagrados pela legislação, especialmente o direito de resposta, por alternativa que, embora aparentemente abrigada pelas leis do País, subtrai o direito de ampla defesa estabelecido pela Constituição. É grave e preocupante que tal se faça sob o pálio de uma confissão religiosa, que se porá acima do olhar dissonante dos que não a professam e da visão crítica com que estes a encarem.
A ABI dirige-se aos magistrados responsáveis pelo julgamento dessas ações para alertá-los acerca dos danos que o deferimento do pleiteado pode causar à democracia no País, objeto de um processo de construção ainda não encerrado e que deixou ao longo da recente História do Brasil não poucas vítimas e não poucos mártires.
Apela também a ABI aos cidadãos comuns e às instituições representativas dos diferentes segmentos da sociedade para que manifestem a esses magistrados a sua preocupação com a decisão que deverão tomar em cada causa, que não afeta apenas a Folha de S. Paulo, A Tarde e a jornalista Elvira Lobato, mas principalmente a integridade da democracia no País. Com esse fim a ABI divulgará proximamente em seu site (www.abi.org.br) os nomes desses juízes e os endereços desses juizados, para viabilizar a manifestação dos cidadãos ofendidos por essa ação antidemocrática.
Por fim apela a ABI à Anistia Internacional para que desencadeie um movimento mundial de solidariedade com os jornais e a jornalista ora ameaçados.
Rio de Janeiro, 18 de fevereiro de 2008
Mauricio Azêdo, Presidente.”