Aepet quer mudar regulação do petróleo


28/01/2009


Em discurso na cerimônia de posse da nova diretoria da entidade, nesta segunda-feira, 26 de janeiro, o novo Presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás-Aepet, Fernando Leite Siqueira, defendeu a mudança do chamado marco regulatório do petróleo, instituído pela Lei n° 9.478/97, cujo artigo 26 foi por ele classificado de inconstitucional por conceder a propriedade do petróleo a quem produzir. Esse artigo, disse, “é fruto do lobby internacional”. 

Siqueira, que já foi Presidente da Aepet, disse que o artigo 26 “tira da União poderes de decisão de cunho absolutamente estratégico, tais como usar o petróleo como poder de barganha com países importadores, impedir a produção predatória da jazida e controlar a produção de forma a manter uma relação reserva/produção compatível com a estratégia do País”. 

O ato de posse, realizado na sede do Clube de Engenharia, foi presidido pelo Vice-Presidente da Aepet, Ricardo Maranhão, ex-Vereador à Câmara Municipal do Rio de Janeiro, e contou com uma mesa formada por representantes de cerca de 30 entidades, entre as quais a ABI, o Movimento de Defesa da Economia Nacional-Modecon, a Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra-Adesg e sindicatos de engenheiros e petroleiros do Estado do Rio, São Paulo e Bahia. Durante a cerimônia foi observado um minuto de silêncio em memória dos engenheiros Heitor Manoel Pereira, que presidia a Aepet quando faleceu, em 2008, Sidney Reis e Ruy Gesteira, que foram homenageados também no discurso do novo Presidente, cuja íntegra é reproduzida a seguir: 

“Agradecendo a presença de todos, gostaria de iniciar, solicitando um minuto de silêncio em memória dos companheiros Heitor Pereira, Ruy Gesteira e Sydney Reis. Perdas irreparáveis que a Aepet, a Petrobrás e o País sofreram no ano passado. Acho que o criador fundou uma Aepet no céu e, para garantir o seu desempenho, levou logo três dos nossos melhores expoentes. Só esperamos que Ele nos compense dando-nos condições de preencher a ausência desses patriotas. É possível que a Petrobrás e o Brasil nem tomem conhecimento ou esqueçam rápido estas nossas palavras de homenagem a estes grandes brasileiros, mas jamais poderão esquecer o que eles fizeram para o bem da Companhia e do País. 

Em seguida, coerente com a nossa linha de aversão ao “pensamento único”, que a mídia e o Sistema Financeiro Mundial tentam nos impor, diariamente, emitiremos algumas de nossas considerações sobre a crise internacional, porque, qualquer que seja a sua origem, ela está sendo muito conveniente para o seu gerador (os Estados Unidos da América). Eles não a criaram deliberadamente, mas aproveitaram para revertê-la em seu favor, ao disseminá-la pelo mundo e se salvando de uma catástrofe econômica iminente. Alguns fatos: 

1) Até 1971, a emissão de dólar era garantida por lastro-ouro depositado no Fort Knox. Estima-se que a emissão da moeda, até então, era de ordem de US$ 3 trilhões. A partir daquele ano, o Presidente Nixon, unilateralmente, eliminou a obrigação desse lastro. O Fed (Banco Central Americano), encarregado de emitir dólares, é privado e se calcula que ele e suas filiais emitiram, a partir daquele ano (1971), US$ 45 trilhões. Ou seja, 94% dos dólares em circulação no mundo não têm lastro. A maioria dos países havia se conscientizado disto e já se manifestavam pela necessidade de uma moeda referência mais sólida. O dólar vinha despencando em todo o mundo, ameaçando os EUA. A crise fez os investidores correrem para os títulos do Tesouro americano, ainda considerados os ativos mais seguros, apesar de tudo. Em conseqüência, o dólar subiu e foi ressuscitado; 

2) O mundo caminhava para o terceiro e irreversível choque do petróleo, devido à chegada do pico de produção mundial. É prevista uma queda acentuada na oferta, após esse pico, enquanto a demanda seguia crescendo. Em vista disto, a previsão dos especialistas era a subida irreversível do preço do barril. Os EUA, que já estavam numa situação bastante complicada, com seu déficit atingindo a cifra de US$ 13 trilhões, e sem muita saída, inclusive, importando mais de 5 bilhões de barris por ano, tiveram um forte alívio financeiro, pois com a crise, o consumo caiu, os especuladores correram a vender ativos em petróleo e os preços despencaram. Lembremos que, na década de 1990, os EUA atuaram para derrubar o preço de petróleo para US$ 10 por barril e quebraram a Rússia; 

3) A China vinha crescendo e ameaçando a liderança americana. Além de a crise frear o crescimento chinês, ela também esvaziou a principal fonte de recursos dos fundos soberanos estatais. Eles estavam preocupando o sistema financeiro internacional porque vinham adquirindo um poder muito forte, inclusive comprando ações de bancos daquele sistema, pondo em risco a hegemonia do poder anglo-saxão, no mundo. Com a crise, a principal fonte provedora de recursos desses fundos – o petróleo – encolheu drasticamente. Os fundos tiveram que frear fortemente sua expansão; 

4) Os especialistas internacionais em economia confirmam nossa tese: “Os EUA vão sair primeiro da crise, pois o seu Banco Central saiu na frente em socorro de sua economia”. 

5) Os EUA estão empenhadíssimos em obter reservas de petróleo, pois eles consomem cerca de 10 bilhões de barris por ano e têm reservas de apenas 29 bilhões. A descoberta do pré-sal abriu-lhes o apetite voraz, pois são reservas localizadas na América Latina; se somadas às reservas existentes, serão equivalentes às do Iraque. Eles querem obter o máximo possível do petróleo do pré-sal. A reativação da 4ª. Frota é, na melhor das hipóteses, uma forma de pressão psicológica sobre o Governo Brasileiro. Nesse sentido, estão jogando pesado no lobby pela manutenção do marco regulatório, que lhes é amplamente favorável. 

6) Com a queda do petróleo para 40 dólares o barril, os próprios brasileiros, por falta de conhecimento, ficaram céticos quanto à viabilidade do pré-sal, favorecendo a ação dos lobistas pela manutenção da Lei n° 9.478/97. 

Assim, aliados ao cartel das Sete Irmãs do petróleo (que dominam o setor há 150 anos e estão ameaçadas de morte, por suas reservas terem caído para 3% das reservas mundiais), os EUA atuam sobre os três Poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário. Nesse cartel, quatro empresas são americanas, uma é anglo-holandesa, uma é inglesa e uma é européia. Embora as principais empresas desse cartel venham se fundindo para sobreviver, novas empresas americanas e européias apareceram: Devon, El Paso, Amerada, Repsol e outras.

TIPOS DE PRESSÃO EXERCIDA SOBRE OS TRÊS PODERES BRASILEIROS

– Pressão sobre o Governo para que retome os leilões com inclusão do pré-sal, sem propor mudança no marco regulatório. Como o Presidente Lula havia constatado que é um absurdo entregar o pré-sal, com risco zero, para empresas estrangeiras que não investiram nem correram riscos, ele criou a comissão interministerial para reestudar o assunto. Esta comissão iria publicar sua proposta em novembro de 2008, mas não conseguiu vencer essa pressão. O Ministro das Minas e Energia (Edison Lobão) anunciara as linhas mestras da proposta que incluiriam mudar o marco regulatório. A reação tem sido muito forte. A Agência Nacional do Petróleo, que segue com os leilões, é subordinada ao Governo, mas tem entre seus diretores Nélson Narciso, ex-presidente da americana Halliburton em Angola e que controla os leilões e o banco de dados da ANP, que, por lei, recebe dados estratégicos da Petrobrás. 

– No 10º. leilão, a ação violenta da Polícia do Rio de Janeiro sobre os sindicalistas refletiu o poder dos interessados no prosseguimento desta ação lesiva aos interesses do País. 

– Pressionam também o Congresso para não mudar o marco regulatório, Em 2008, ocorreram quatro seminários no Senado: cada um com cinco mesas; em cada uma delas havia, pelo menos, dois lobistas internacionais. Hoje, infelizmente, o Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP), um dos lobistas, apesar do nome, congrega o interesse do cartel das Irmãs. Outros notáveis lobistas participantes são ex-membros do Instituto Liberal, criado pela Shell para quebrar o monopólio do petróleo na década de 90. Ex-diretores da ANP também integram o time de lobistas. 

Nós reivindicamos, por carta ao Senado, a participação nesses eventos e, num dos seminários, nos concederam 10 minutos. Ou seja, em cinco mesas atuaram 10 lobistas e, apenas, um contraponto de 10 minutos. 

A pressão sobre o Judiciário foi explicitada quando, através do Governador Roberto Requião, apresentamos uma Ação de Inconstitucionalidade do artigo 26 da lei do petróleo, que entrega o petróleo a quem produzir. Os grandes constitucionalistas eram unânimes em considerar o artigo inconstitucional. Obtivemos o voto magistral do relator Ayres de Brito e do Ministro Marco Aurélio Melo. O lobby, que atuou no Congresso para quebrar o monopólio, entrou em campo e garantiu os votos dos oito ministros restantes. Votos absolutamente inconsistentes e sem nexo, que, mesmo assim, valeram e infligiram uma grande derrota à Nação e à soberania nacional. 

Esse mesmo tipo de pressão tem sido exercido sobre a direção da Petrobrás: nos últimos 14 anos ela foi obrigada achatar o salário dos seus empregados e deteriorar o seu plano de Previdência, que era um grande diferencial a favor da retenção dos seus técnicos e de sua tecnologia. Hoje o salário inicial na Petrobrás é menor que a metade do salário inicial de órgãos públicos com Bacen, CVM, Susep, Ipea, e outros.

POR QUE QUEREM MANTER O MARCO REGULATÓRIO

Por que o marco regulatório atual, legado por Fernando Henrique, é bom para os EUA e para o cartel mundial do petróleo e péssimo para o País? Vejamos alguns fatos: 
a) A Lei n° 9.478/97 é intrinsicamente incoerente, pois ela tem três artigos (3º., 4º. e 21), que, em consonância com a Constituição Federal, estabelecem que as jazidas de petróleo e o produto da lavra pertencem à União, portanto ao povo brasileiro. Mas contém o artigo 26, que contraria esses artigos e a Constituição e concede a propriedade do petróleo a quem produzir. É fruto do lobby internacional; 

b) Essa lei, regulamentada pelo Decreto nº 2.705/98, estabelece que a participação da União no produto da lavra é de 0 a 40% mais 5% de royalty. Enquanto, isto, no mundo, os países exportadores recebem 84% de participação, em média. Os países da Opep – Organização dos Países Exportadores de Petróleo, recebem 90%; 

c) A propriedade de petróleo sendo de quem produz, tira da União poderes de decisão de cunho absolutamente estratégico, tais como: usar o petróleo como poder de barganha com países importadores; impedir a produção predatória da jazida (produzir mais do que o reservatório permite) e controlar a produção de forma a manter uma relação reserva/produção compatível com a estratégia do País. Exemplo: se a ANP resolver leiloar todo o pré-sal e, supondo que existam equipamentos para todos os produtores, dentro de 13 anos o pré-sal acaba. Mas se for feito um planejamento energético correto e a Petrobrás for encarregada de fazer o desenvolvimento do pré-sal, seguindo suas linhas mestras, esta rica área pode durar de 30 a 40 anos. Tempo suficiente para desenvolver o substituto ao petróleo. 

A Lei nº 9.478/97 ainda tem artigos que precisam mudar. O artigo 23, por exemplo, estabelece contrato de concessão, o pior de todos, pois ele dá a propriedade a quem produzir. É preciso mudar para o contrato de partilha ou de prestação de serviços, o melhor de todos. 

Há outros artigos que também merecem revisão, como o 22, que obriga a Petrobrás a entregar todos os seus dados históricos, inclusive os mais estratégicos, mormente os dos pré-sal, para a ANP. Esta agência entregou a gerência desse banco à Halliburton, que através de sua subsidiária Landmark administra e usufrui há dez anos desses dados. 

O Brasil está, pois, diante de uma segunda oportunidade para se firmar como o país mais viável do planeta. Tem a maioria dos recursos naturais que precisa, tem um clima ideal, sem intempéries, tem um povo altamente criativo e competente. Tem terra, energia solar e água doce em abundância. É, portanto, o país com maior potencial para substituir o petróleo em médio e longo prazos. Antes disto, com os recursos do pré-sal, o País poderá resolver todos os problemas econômicos e financeiros, podendo, inclusive sair da vergonhosa posição de abrigar dezenas de milhões de miseráveis.

OUTRAS RIQUEZAS IMPORTANTES A DEFENDER

A nossa Amazônia verde, que, além dos minerais estratégicos estimados em US$ 10 trilhões, da biodiversidade, matéria-prima para a indústria farmacêutica do futuro, da ocorrência de petróleo e gás e das funções como floresta tropical, a Amazônia ainda detém 68% da água doce nacional. Assim, com terra, água e energia do sol em abundância, a região é um alvo fortíssimo da cobiça internacional. A energia da biomassa é talvez o único produto capaz de substituir o petróleo na integra. Esses são os principais elementos que levam a cobiça internacional sobre a região. Temos uma das maiores concentrações de organizações não-governamentais internacionais do planeta, ong’s que se fossem humanitárias estariam na África, cuja população está em muito pior situação do que os índios brasileiros.

ATUAÇÃO DA NOVA DIRETORIA

Quanto à nossa atuação na direção da Associação dos Engenheiros da Petrobrás-Aepet, vamos seguir o nosso Estatuto, que determina os grandes objetivos da nossa Aepet: 

a) defender a soberania nacional sob todos os seus aspectos: cultural, econômico, territorial, social e ambiental, dando ênfase na defesa da tecnologia e do patrimônio da Petrobrás; 

b) defender o Corpo Técnico e lutar pela sua participação nos processos decisórios do Sistema Petrobrás; 

c) promover, individualmente ou com outras entidades, a preservação da memória Petrobrás; 

d) promover o desenvolvimento técnico e cultural de seus associados; 

e) promover a união entre seus associados, defendendo os interesses destes junto aos órgãos públicos e privados, inclusive podendo se valer da via judicial para tanto; 

f) defender os interesses de seus associados perante a entidade de previdência, além de defender os direitos trabalhistas dos mesmos, devendo, assim, ser entendido reivindicações por melhores condições de trabalho, podendo atuar neste item, com outras entidades que agrupem empregados da Petrobrás e suas subsidiárias; 

g) atuar em prol do aperfeiçoamento democrático do País, junto com outras instituições. 

Concluindo, gostaríamos de continuar contando com o apoio e a ajuda de todas as forças vivas da nossa Nação, bem como de todos os brasileiros, na defesa dos interesses de nosso país. Temos clareza de que sozinhos não conseguiremos defender essa riqueza recém descoberta do pré-sal que é um patrimônio do povo brasileiro. 

Nas décadas de 1940 e 1950, quando o petróleo era apenas um sonho, as forças vivas desta nação fizeram o maior movimento cívico da nossa História. Agora que o petróleo é uma realidade concreta e auspiciosa, superando todas as expectativas, temos muito mais razão para reeditar aquela campanha. “O petróleo tem que ser nosso”. 

Queríamos deixar mais um abraço de agradecimento aos nossos homenageados, Luis Antonio Castagna Maia, Roberto Requião, Ildo Sauer e Paulo Metri, que muito tem nos ajudado a defender a Petrobrás e o País. E também à antiga diretoria e aos empregados da Aepet, pela sua incansável dedicação. Muito obrigado pela honrosa presença de todas e de todos vocês e que Deus nos ajude nessa dura batalha na defesa da nossa Pátria.”