A Academia Brasileira de Letras –ABL inaugura nesta quinta-feira, dia 22, às 17h30, a exposição “Evandro Lins e Silva – 100 anos”, em homenagem ao centenário de nascimento do acadêmico, jurista e escritor. A mostra, que ocupará o primeiro andar do Centro Cultural do Brasil, na ABL, ficará em cartaz até o dia 31 de janeiro de 2013, das 9h às 18h, com entrada franca.
Dividida em quatro módulos, a exposição apresenta a vida de Evandro Lins e Silva desde o seu nascimento no Piauí, em 18 de janeiro de , até a sua morte no Rio de Janeira, em 17 de dezembro de 2002, através de documentos, livros, fotografias, filmes, incluindo o documentário dirigido por sua neta Flávia Lins e Silva.
O jurista e escritor foi eleito para a ABL em 16 de abril de 1998, na sucessão de Bernardo Élis, tendo sido o quinto ocupante da Cadeira número 1. Foi recebido em 11 de agosto de 1998 pelo acadêmico Josué Montello.
Homenagem
Na entrada da exposição o visitante encontrará um texto assinado pela Presidente da ABL, a escritora Ana Maria Machado, que substituiu o homenageado na Cadeira nº 1, em 24 de abril de 2003. Diz o documento:
“Nesta casa idealizada por Lucio de Mendonça, Ministro do Supremo, e neste momento em que o Supremo Tribunal Federal ocupa no imaginário dos brasileiros um lugar de destaque, é oportuno lembrar a magnífica estatura de um grande integrante de nossa história conjunta.
Jurista, escritor, ocupante de importantes cargos políticos, o acadêmico Evandro Lins e Silva foi, antes de mais nada, um advogado criminalista. Um advogado exemplar, modelo de gerações.
Esta exposição comemora seus cem anos de nascimento e evoca sua biografia. Recapitula as principais etapas de sua vida de muitas conquistas e relevantes serviços ao país. Evoca sua preocupação constante com a política brasileira, a democracia e nossas questões sociais.
É impossível, porém, trazer para ela o prazer de sua companhia, suas tiradas de humor e inteligência, sua lógica rigorosa, a rapidez de seu raciocínio, seu acúmulo de leituras variadas, sua memória prodigiosa sempre capaz de resgatar um dado preciso. A gravação de algumas entrevistas nos traz apenas uma pequena amostra dessas qualidades.
Afável e equilibrado, treinado para se controlar, Evandro Lins e Silva foi no entanto capaz de grandes paixões cívicas. Como assinalou Josué Montello, pode-se dizer que foi aos gritos que tirou um governante do poder, imbuído do papel de defensor do povo brasileiro e da república. Mas foi em surdina que, a vida toda, estudou e se preparou para garantir a defesa da liberdade individual e dos direitos da cidadania.
Ao celebrar o centenário de Evandro Lins e Silva, a Academia Brasileira de Letras reitera sua confiança na Justiça e sua fé no Direito.”
Biografia
Evandro Cavalcanti Lins e Silva, filho de Raul Lins e Silva e Maria do Carmo Cavalcanti Lins e Silva, nasceu em 18 de janeiro de 1912, na cidade de Parnaíba, no Piauí.
Foi casado com Maria Luisa Konder (Musa), falecida em 1984, durante quarenta e três anos, com quem teve quatro filhos — Ana Teresa, Carlos Eduardo, Patrícia e Cristiano, os dois primeiros advogados, a terceira educadora, e o último engenheiro eletrônico e de sistemas e professor de informática na PUC.
Evandro fez o curso primário em escolas públicas, no município de Itapicurú, Estado do Maranhão, onde seu pai, pernambucano, era Juiz, e na cidade do Recife, onde iniciou o ensino médio no Ginásio Pernambucano, tendo sido transferido no 4º ano para o Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro.
Ingressou, em 1929, na Faculdade de Direito do Rio de Janeiro e formou-se em 19 de novembro de 1932, na turma que teve como Paraninfo o Professor Afrânio Peixoto.
Ainda como estudante, e depois de formado trabalhou em diversos jornais, como Diário de Notícias, A Batalha, A Nação e O Jornal, neste último assinava uma crônica diária, na seção forense, sob o pseudônimo Lobão.
Como advogado, especializou-se em matéria penal e desenvolveu intensa atividade profissional no Tribunal do Júri, nos juizados criminais, nos tribunais superiores e no Supremo Tribunal Federal. Defendeu inúmeros processos de grande repercussão, inclusive em matéria política, perante o Tribunal de Segurança Nacional e a Justiça Militar.
Defendeu dezenas de jornalistas em julgamento perante o júri de imprensa, de 1934 em diante. Patrocinou a defesa de inúmeros perseguidos políticos, a partir de 1932, numa atividade profissional incessante. Nos anos 1940, o Tribunal de Segurança Nacional absorveu a competência do Superior Tribunal Militar para julgar os crimes de espionagem e atividades correlatas, o que aumentou a atuação profissional do jurista no tribunal de exceção.
Foi um dos fundadores do Partido Socialista Brasileiro, em 1947, juntamente com João Mangabeira, Hermes Lima, Domingos Velasco, Alceu Marinho Rego, Rubem Braga e Joel Silveira, entre outros.
Entre 1956 e 1961 trabalhou como Professor de História do Direito Penal e de Ciência Penitenciária, no curso de doutorado, da Faculdade de Direito do Estado da Guanabara.
Foi correspondente da ONU no Brasil para matéria penal e penitenciária, juntamente com os Professores Lemos Brito e César Salgado, por designação do Ministro da Justiça, Cyrilo Júnior.
Ocupou os cargos de Procurador-Geral da República, de 26 de junho de 1961 a 23 de janeiro de 1963; Chefe do Gabinete Civil da Presidência da República, de 24 de janeiro a 11 de junho de 1963; Ministro das Relações Exteriores, de 18 de junho a 14 de agosto de 1963; Ministro do Supremo Tribunal Federal, nomeado por decreto de 14 de agosto de 1963, do Presidente João Goulart, para a vaga decorrente do falecimento do Ministro Ary de Azevedo Franco. Tomou posse no dia 4 de setembro.
A partir de 1964, já como Ministro do Supremo Tribunal Federal, julgou e participou dos julgamentos de mais de uma centena de presos políticos, de governadores Mauro Borges, Plínio Coelho, Seixas Dória, Miguel Arraes; dos Professores Vieira Neto, Sérgio Cidade de Rezende, de escritores, jornalistas e intelectuais, como Caio Prado Júnior, Niomar Muniz Sodré, Enio Silveira, entre outros. Impetrou inúmeros habeas corpus perante o STF.
Aposentou-se em 16 de janeiro de 1969, por força do Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968, juntamente com os Ministros Victor Nunes Leal e Hermes Lima. A vaga não foi preenchida em virtude do Ato Institucional nº 6, de 1º de fevereiro de 1969, que reduziu de 16 para 11 o número de Ministros, restabelecendo a composição anterior ao Ato Institucional nº 2, de 27 de outubro de 1965.
Lecionou Direito Penal no CEUB, em Brasília, no ano de 1968.
Depois de aposentado, participou de processos no Tribunal do Júri e nos tribunais superiores, inclusive no impeachment do ex-presidente Fernando Collor de Mello, ao lado de Barbosa Lima Sobrinho e de Marcelo Lavenère Machado, da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e da Ordem dos Advogados do Brasil, respectivamente.
Foi membro do Conselho da Ordem dos Advogados do Brasil em vários períodos, entre 1944 e 1961, e, depois de aposentado, de 1983 a 1995.
Em 1994, esteve à frente da Comissão designada pelo Ministro de Justiça, Maurício Corrêa, para a elaboração do anteprojeto de lei de Reforma do Código Penal, tendo realizado um esboço, com base nos estudos e trabalhos produzidos pelas três subcomissões em que se dividia o grupo.
Presidiu a Sociedade Brasileira de Criminologia. Integrou o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, no governo do Presidente José Sarney, a Associação Internacional de Direito Penal (Grupo Brasileiro), e a Sociedade dos Advogados Criminais do Estado do Rio de Janeiro — SACERJ.
O jurista escreveu numerosos trabalhos de Direito Penal e Processual Penal sobre Legítima Defesa, Culpa Penal, Estelionato, Concussão, Concurso de Crimes, Crimes contra a Honra, Crimes Políticos, Indivisibilidade da Ação Penal, Recurso Extraordinário, A Liberdade Provisória no Processo Penal, Pena de Morte, Privatização das Prisões, etc., publicados em memoriais, revistas técnicas e jornais, além de pareceres e inúmeros arrazoados forenses.
É autor dos livros “A Defesa tem a Palavra”, “Arca de Guardados” e “O Salão dos Passos Perdidos”.
Prêmios
Evandro Lins e Silva recebeu a Medalha Rui Barbosa, do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, a Medalha Teixeira de Freitas, do Instituto dos Advogados Brasileiros, o Prêmio Helder Câmara e Direitos Humanos conferido pela seccional da Ordem dos Advogados de Pernambuco, o Prêmio Clóvis Bevilacqua, da Ordem dos Advogados do Ceará, a Ordem do Mérito Jurídico Militar em 3 de abril de 1959, a Gran Cruz de la Orden El Sol Del Peru, em Lima, Peru, em 20 de agosto de 1963, a Medalha do Mérito Cultural da Magistratura pelos serviços prestados à Cultura Jurídica Brasileira, em 15 de dezembro de 1997, a Medalha Rui Barbosa, concedida pela Fundação Casa de Rui Barbosa, a Medalha do Mérito José Bonifácio, da UERJ, a Ordem do Mérito da Fraternidade Ecumênica — Direitos Humanos — da Legião da Boa Vontade. Foi agraciado pela Equitem Ordinis Piani, do Vaticano, na coroação do Papa Paulo VI, em 10 de setembro de 1963, quando chefiou a delegação brasileira naquele evento. Recebeu o título “O Criminalista do Século”, pela Associação dos Advogados Criminalistas do Estado de São Paulo, em dezembro de 1999.
Participou das conferências promovidas pela Ordem dos Advogados do Brasil, antes de 1961 e depois de 1969, pela Organização das Nações Unidas (Havana, 1990) e pela Associação Internacional de Direito Penal (Viena, 1989, e Rio de Janeiro, 1994).
Figurou como Patrono de várias turmas de bacharéis em Direito, em todo país e proferiu aulas inaugurais em Faculdades de Direito de todo o Brasil.
Foi eleito membro efetivo da Academia Brasileira de Letras, em abril de 1998, na sucessão de Bernardo Élis, tendo sido o quinto ocupante da Cadeira Número 1, e recebido em 11 de agosto de 1998 pelo acadêmico Josué Montello.
Defesa
Evandro Lins e Silva patrocinou, em 1947, perante o Supremo Tribunal Federal(STF), a defesa do Desembargador Edgard Joaquim de Souza Carneiro, em processo de grande repercussão, por se tratar do Presidente em exercício do Tribunal de Justiça da Bahia, acusado de homicídio do advogado Otávio Barreto, no próprio edifício do foro. Participou da defesa o notável advogado baiano Carlito Onofre. O Supremo reconheceu ter o acusado agido em legítima defesa.
Em 1969, redigiu a defesa do então Senador Nelson Carneiro, acusado de tentativa de homicídio contra o Deputado Estácio Sotto Maior, praticada no prédio da Câmara dos Deputados.
Em 1974, foi advogado do acadêmico Ivan Lins, no Tribunal Federal de Recursos, na queixa-crime por injúria à memória de Agripino Grieco, oferecida pelo Embaixador Donatello Grieco, filho do falecido epigramista.
Em abril de 2000, defendeu o líder do Movimento Sem Terra(MST) José Rainha Júnior, em processo no Tribunal do Júri, de Vitória, Estado do Espírito Santo, acusado de homicídio de um fazendeiro e de um policial militar, fato ocorrido na cidade de Pedro Canário, processo em que havia sido condenado a 26 anos de prisão no primeiro julgamento. O réu foi absolvido nesse segundo júri.
No dia 12 de dezembro de 2002, recebeu, no Palácio da Alvorada, em Brasília, o Prêmio Nacional de Direitos Humanos e todas as condecorações e honrarias obtidas, ao longo da carreira, que haviam sido cassadas por ocasião do regime militar. Na mesma data foi empossado membro do Conselho da República, cargo para o qual foi eleito pela Câmara dos Deputados.
Cinco dias depois, em 17 de dezembro, morreu aos 90 anos, na cidade do Rio de Janeiro, após uma queda acidental.
A Assembléia Legislativa de seu Estado natal, o Piauí, prestou-lhe homenagem em sessão solene realizada no dia 13 de março de 2003.
O Supremo Tribunal Federal promoveu homenagem póstuma em sessão solene realizada aos 13 de novembro de 2003.
*Com ABL, Conjur.