Por Cláudia Sanches e Edir Lima
07/04/2017
A Associação Brasileira de Imprensa completa 109 anos de fundação nessa sexta-feira, 7, lembrando do seu fundador, o jornalista Gustavo Lacerda. Nessa data, em 1908, o jornalista, líder do grupo de nove profissionais que fundou a entidade, criava alguns benefícios para a categoria, além do título de habilitação profissional. A reunião aconteceu em um prédio na esquina da Rua Sete de Setembro com a Avenida Rio Branco. Quatro profissionais, incluindo Gustavo de Lacerda, eram do jornal O País.
O grupo era composto ainda por Francisco Souto, vice-presidente, do Correio da Manhã; Alfredo Seabra, tesoureiro, de O País; Luís Honório, primeiro-secretário, do Jornal do Brasil; Artur Marques, secretário, da Gazeta de Notícias; Noel Batista, procurador, do Jornal do Brasil; Belisário de Sousa, de O País; Amorim Júnior, de O País,e Mário Galvão, do Diário do Comércio.
Perfil de Gustavo de Lacerda:
Um destino de luta
“….entregue de corpo e alma ao jornalismo”
No dia 7 de abril de 1808, Gustavo de Lacerda fundava a Associação Brasileira de Imprensa. A data ficou consagrada como o Dia Nacional do Jornalista. Esse ano, a ABI completa 109 anos de existência e a categoria exalta o seu fundador, grande defensor das causas dos profissionais de imprensa, que morreu como indigente, no dia 4 de setembro de 1909, aos 55 anos, dezessete anos após a fundação da centenária entidade.
A razão de sua vida foi a criação de uma instituição cujos objetivos principais eram dar apoio à organização profissional dos jornalistas e defender as liberdades públicas, lutando pelas nobres causas nacionais.
A escolha desta data como Dia do Jornalista remonta ao período do Império em homenagem a João Batista Líbero Badaró, médico e jornalista que morreu assassinado por inimigos políticos, em São Paulo, em 22 de novembro de 1830. O fato gerou um movimento popular que levou à abdicação de D. Pedro I, no dia 7 de abril de 1831.
Biografia
Em 18 de maio de 1854, nasceu Gustavo Adolfo Braga, em Nossa Senhora do Desterro, atual Florianópolis (SC). Seu sobrenome foi substituído por Lacerda, aos 22 anos, quando teve permissão do Exército, para efetivar a troca. Ingressando nas Forças Armadas, em 8 de março de 1870, chegou a conquistar o posto de segundo-sargento. Na Escola Militar de sua cidade, exerceu a função de secretário do general Tibúrcio de Sousa, que, ao perceber a sua inteligência, incentivou-o a estudar. Por divulgar os seus conhecimentos sobre o Socialismo, entre os colegas de carreira, foi desligado, em 1871, de suas atividades militares.
Autodidata, dominava o idioma português e escrevia com desenvoltura. Gustavo de Lacerda iniciou, também, estudos em francês, tendo acesso a livros que circulavam, entre amigos, sobre as ideias socialistas. Em 1875, mudou-se para o Rio de Janeiro, porém regressaria a Santa Catarina, ingressando, mais uma vez, no Exército onde permaneceu até 1881.
O jornalista
Buscando uma oportunidade de emprego, em Santos (SP), trabalhou como guarda-livros. Ao retornar ao Rio de Janeiro, 1884, lançou o primeiro número do seu jornal o “Meio Dia”. Neste periódico, ele se denominou republicano independente e apartidário: “Os partidos não tem programas nem princípios, menos ideias e união – só têm chapas”. O jornal teve existência efêmera e não chegou a completar um mês de circulação
Completamente falido e sem condições de sobrevivência, ele aceitou o emprego de repórter de setor no jornal “O Paíz” (1884-1934). Neste periódico, Gustavo de Lacerda trabalharia até falecer.
Em suas atividades, como jornalista, Gustavo de Lacerda, ao mesmo tempo, foi repórter e revisor do jornal “A Imprensa”, de Rui Barbosa (1849-1923), e, durante o governo do presidente Campos Sales (1898-1902), trabalhou, também, no Jornal do Brasil.
Depois de fazer a cobertura de uma greve de carroceiros, ele publicou uma reportagem a favor dos grevistas, resultando num atentado a tiros. O Jornal do Brasil, em seu editorial, acusou o ministro da Justiça. Epitácio Pessoa (1865- 1942), de ser o mandante: “…dois encostados da polícia atiraram para matar no nosso repórter Gustavo de Lacerda, na Ladeira do Castro, que denunciou as violências praticadas por ordem do governo contra carroceiros em greve”. De acordo com Nelson Werneck Sodré, “Gustavo de Lacerda, repórter ousado, ganhava notoriedade antes gozada por Ernesto Sena, do Jornal do Comércio, capaz de operar prodígios em busca da informação”.
O jornalista Edmar Morel (1912-1989), em seu livro, “A trincheira da liberdade” (1985), apresenta Gustavo de Lacerda, como uma figura “entregue de corpo e alma ao jornalismo, profissão que exerceu como um sacerdócio, embora explorado torpemente”.
O jornalista registra, em sua obra, que a ideia de criar uma agremiação, para lutar pelos direitos da classe jornalística, foi a meta principal da vida de Lacerda, que chegou a ser visto como inculto e visionário. Esta imagem negativa, em relação à sua figura, era difundida, principalmente, pelos proprietários de jornais que, na época, percebiam, em Gustavo de Lacerda, um líder que ia de encontro “aos privilégios de casta”. Esses comentários contrastavam com o texto sobre a fundação da ABI (1908), no qual estão registradas reivindicações que, até hoje, são a base da regulamentação profissional e das faculdades de Comunicação Social, demonstrando, assim, a coerência e o vanguardismo de suas ideias.
De acordo com o escritor Edmar Morel, a miséria “dourada”, que era vivenciada pelos profissionais da imprensa, no início do século, contribuiu para que Gustavo de Lacerda não desistisse da sua luta em prol da formação de uma associação que defendesse os direitos sem distinção de categorias. Gustavo de Lacerda, socialista convicto, batalhava por condições dignas para os trabalhadores do universo da imprensa, incluindo todos os envolvidos desde a elaboração até a impressão do jornal. Ele denominava os jornalistas de “proletários intelectuais”.
Adepto das ideias socialistas, segundo Fernando Segismundo “de um socialismo um tanto confuso, resultado de leituras desiguais, porém praticado com o nobre desígnio de suavizar a sorte dos trabalhadores”, Lacerda teve bastante dificuldade em conquistar apoio entre os colegas das redações. Após a proclamação da República (1889), de acordo com o escritor Evaristo de Moraes Filho, surgiram os primeiros partidos de cunho socialista e operário, mais de cunho reformista do que, propriamente, revolucionário.