A notícia em tempo real


28/04/2005


Rodrigo Caixeta
15/04/2005

                  Rodrigo Caixeta

 Há uma década começava a circular nas redações e nas cadeiras acadêmicas brasileiras o que seria a nova vertente do jornalismo. O desenvolvimento das novas tecnologias trouxe também a necessidade de uma troca cada vez mais intensa de informações e a internet tornou-se canal potencial desse processo. A revolução que este veículo representa não se compara ao advento da televisão, mas o fato é que tem sido responsável pela mudança do papel da imprensa, da forma de produção da notícia e a abertura de novas perspectivas de carreira.

O jornalismo online — “jol” na linguagem dos profissionais da web — pode ser definido como a coleta e distribuição de informações por redes de computadores ou por meios digitais. Mas como isso funciona na prática?

Os estreantes 

Alexandre Fontoura, editor do JB

No Brasil, o JB foi o primeiro jornal a publicar suas matérias na rede, quando esta ainda era comumente chamada BBS. Neste ano, completa sua primeira década, juntamente com o início da internet comercial no País. Com cerca de 14 milhões mensais de pageviews — acessos à primeira página —, o JB Online conta com uma equipe de 21 jornalistas e três estagiários. A produção de conteúdo resulta da parceria com a Agência JB e da reprodução de todas as reportagens publicadas no impresso.

A rotina no JB Online começa cedo. O primeiro repórter chega à redação por volta das 6h30 e coloca no ar as primeiras notícias do dia na seção “Tempo real”, atualizada minuto a minuto. Neste espaço, as informações são dadas quase imediatamente. O editor Alexandre Fontoura conta como funciona a captação de notícias:
— Temos os repórteres que fazem a apuração aqui da redação ou vão para a rua e a equipe da Agência JB, que não é muito grande, mas tem correspondentes nos principais Estados e nos mandam as notas de acordo com os acontecimentos locais. Já o noticiário de outros países é produzido a partir das agências internacionais. Na Economia, temos como parceiro o site Investnews, empresa do nosso grupo da qual podemos aproveitar as notícias.

A grande diferença entre as duas versões do JB talvez seja que o conteúdo impresso sai no Online, mas a recíproca não é verdadeira. No entanto, o site abre espaço para seções especiais, como Carnaval, Oscar, Campeonato Carioca etc. Há ainda seções específicas, como “Musicalidade” e “Tempo real de informática”. Semanalmente, a equipe se reúne para discutir pautas para reportagens mais longas, cujo conteúdo eventualmente é publicado na Editoria de Cultura da versão impressa. Alexandre destaca ainda uma experiência inédita no JB:
— Há dois anos, nossa equipe assumiu o caderno de Informática. Foi a primeira vez no jornalismo brasileiro que uma equipe de jornal online assumiu o comando de um suplemento impresso.

Segundo Alexandre, “o repórter que trabalha no JB Online precisa ser maluco, mas o principal é saber escrever bem”. Para ele, quem tem o domínio da escrita se garante em todos os veículos:
— Normalmente o repórter que começa a trabalhar com jornalismo para a internet apresenta mudanças na forma de redigir. Aqueles textos longos, característicos de reportagens impressas, dão lugar a períodos curtos e objetivos, semelhantes à linguagem de rádio. 

Rotina operacional

No Globo Online, a equipe produz as notícias de capa do Globo Online e da Globo.com, além de ocupar um pequeno espaço no site da GloboNews. Quando foi criado, em 1996, reproduzia apenas o jornal impresso na web, mas hoje reúne o conteúdo dos jornais Globo, Extra e Diário de São Paulo e produz noticiário independente — eventualmente, sua equipe também sugere matérias especiais para os impressos. A captação de notícias é feita por agências e outros meios de comunicação, especialmente os pertencentes às Organizações Globo, pois não há restrição de conteúdo. A Editoria Internacional é abastecida por agências estrangeiras.

Os repórteres do Globo Online seguem uma rotina operacional. Quando chegam à redação, devem ligar o seu computador e abrir as ferramentas de edição, pois produzem as matérias e editam a página. Segundo o editor Saint-Clair Milesi, diferentemente da redação tradicional, ali o repórter tem texto final:
— É preciso ser um profissional multimídia, que bote a mão na página e esteja aberto a se adaptar a ambientes diferentes. Ninguém chega aqui sabendo, mas vai aprendendo no dia-a-dia. Nós moldamos as ferramentas de acordo com a nossa demanda.

      Tesla Coutinho, do Globo

A editora Tesla Coutinho alerta para a criação de uma nova linguagem que a internet permite. Atualmente, as matérias publicadas vêm acompanhadas de pequenos filmes registrados por câmeras digitais. Além deste recurso, o Globo Online trabalha ainda com infográficos animados, acompanhados de textos informativos. Ela explica como é feito o abastecimento de notícias:
— São 24 horas de produção. Como trabalhamos com hard news, lidamos com informações repassadas pelos repórteres e, quando eles não conseguem enviá-las num tempo hábil, ouvimos as rádios, assistimos à TV e vamos consolidando os dados. 

Questão de sinergia

Arquivo

Pedro Venceslau

Nos sites de revistas online a situação não é muito diferente. Alguns servem apenas como um canal de comunicação com o leitor e não contam com produção exclusiva de conteúdo. Não é o caso da revista Imprensa. Segundo Pedro Venceslau, Editor-executivo das versões online e impressa, o Portal Imprensa conta com uma equipe voltada para a produção de reportagens diárias para a internet. Para ele, o desafio é promover uma sinergia total entre as duas plataformas:
— Todos os dias pela manhã, fazemos uma reunião de pauta conjunta entre portal e revista para levantar os grandes temas do momento. O segundo passo é navegar por sites do Brasil e do exterior, peneirando e repercutindo informações relativas ao jornalismo e à publicidade.

No Portal Imprensa, o repórter precisa ser ágil tanto na apuração quanto na checagem e elaboração da matéria.O Editor adverte:
— O repórter online deve viver com um bloquinho embaixo do braço, esteja onde estiver. A notícia na web não é refém de fechamento, a qualquer hora você pode enviar uma nota para a home. Raramente a reportagem é tão bem-escrita e bem-acabada quanto a impressa, mas tem a obrigação de ser informativa e quente.

O jornalismo online prega a produção de notícias cada vez menores, pois o internauta não costuma ficar muito tempo em frente a uma mesma matéria no computador. O texto deve ser curto e conter o máximo de informação no mínimo de espaço.

A necessidade de dar furos torna comuns erros gramaticais e barrigas. Pedro Venceslau leva em consideração a vantagem de uma falha poder ser corrigida imediatamente, mas afirma que todo site deveria ter revisores. Já Alexandre Fontoura diz que, quando uma notícia está no ar há pouco mais de um minuto e é detectado um erro gramatical, este também é corrigido instantaneamente. Mas quando se tratam de informações erradas no ar há mais de cinco minutos, o JB Online faz a correção atentando para a falha cometida anteriormente. 


Equipe rápida

Em Época Online, a rotina semanal é fazer o noticiário dos principais fatos do dia, enviar boletins e preparar o conteúdo exclusivo do site que complementa as matérias da revista, como trechos de músicas, galerias de fotos e trailers de filmes. Durante as oito horas em média de trabalho na redação, a equipe faz ainda a montagem das páginas da revista no site e analisa o número de acessos. De acordo com Carolina Nascimento, Editora de Conteúdo, as informações são provenientes da Agência O Globo e, às vezes, são complementadas com dados de agências conceituadas como Reuters e AFP.

Para Carolina, o repórter deve estar antenado ao que é publicado nos sites de notícias e saber o que foi publicado nos jornais:
— Ele tem que pensar rápido. Para isso, precisa ter iniciativa e personalidade ativa, ser esperto e saber o que é ou não notícia. Com certeza, há mais trabalho numa redação online, porque ela não pára. A depender da rotina de trabalho, além do texto, tem que saber editar imagens e digitalizar vídeos e áudios. É preciso saber que são todas as mídias convertidas numa só.

Quanto à publicação de informações erradas na rede, ela culpa a competição entre os veículos e sabe que driblar o problema da falha de apuração é difícil:
— Os sites que se alimentam de agências de notícias são totalmente dependentes e confiam completamente nelas. No entanto, sempre há o risco de se publicar algo errado, porque muitas vezes as informações que chegam são contraditórias. Mas são problemas que empresas grandes e preocupadas com a qualidade sabem contornar e corrigir com rapidez. Além disso, hoje o leitor sabe onde encontrar notícias confiáveis. 


Uso de assessorias 

                     Verena Glass

         Marcel, da Carta Maior

Na agência Carta Maior, as notícias são obtidas por fontes e releases de assessorias de comunicação. Há também um acordo com a agência italiana Ansa, para a produção das notícias internacionais. Para o Editor Marcel Gomes, o repórter tem que estar atento às notícias do dia:
— São 15 jornalistas trabalhando. Fazemos a atualização diária com cerca de cinco reportagens e dois artigos analíticos. Em coberturas especiais, utilizamos o canal interno TV Carta Maior, inclusive com programação ao vivo.

Para Marcel, a credibilidade de um veículo só é conquistada com o tempo e a consolidação dos seus próprios leitores. Para obter notícias em primeira mão, o segredo é a manutenção das fontes e a especificidade dos assuntos do site:
— A agência trabalha com movimentos sociais, uma pauta desprezada pelos grandes veículos, o que torna grande parte do nosso conteúdo exclusivo.

Marcel também destaca o trabalho de revisão:
— A edição tem que existir como em qualquer outro veículo. O preço da velocidade não pode ser o de abdicar da segunda leitura. 

Primeira atividade

No Portal Estadão, a rotina é semelhante à dos outros veículos. A captação de notícias é feita por todos os jornalistas do Grupo Estado, que alimentam um sistema interno de informação utilizado por vários produtos da empresa, como os jornais, os sites fechados e o portal. Segundo Roberto Romano Taddei, Editor-chefe, antes de chegar à redação o repórter deve estar inteirado dos assuntos do dia, não importa se pelo rádio, a TV ou os jornais impressos e eletrônicos:
— A primeira atividade é conferir o que foi feito no dia, pois o trabalho online é 24 horas. Além de saber o que está em pauta, a gente deve estar sempre atento à concorrência.

Roberto destaca que o profissional deve ter energia para correr atrás da notícia e calma para escrevê-la e publicá-la. Para ele não há diferença entre o volume de trabalho da redação online e o da redação tradicional:
— O que há é uma diferença nos horários de concentração de trabalho. Enquanto nas redações de jornais o estresse quase sempre está associado ao fechamento, na redação online ele é constante. A partir do momento em que tomamos conhecimento de uma notícia, é como se o jornal já estivesse fechado. Já estamos atrasados e precisamos correr para noticiar o fato.

No começo da internet, Roberto diz que as redações não estavam familiarizadas com o imediatismo do “jol” e, por isso, as barrigas eram constantes:
— Hoje, com mais experiência, os jornalistas sabem que a informação só deve ser veiculada após a devida apuração, mesmo quando se trata de um assunto que está na concorrência. Nesses casos, o que mais conta não é o imediatismo, mas a credibilidade da informação.

Para evitar erros ortográficos, a equipe — “geralmente composta de uns 20 profissionais” — trabalha com ferramentas tecnológicas, como o Manual de Redação associado a um bom corretor ortográfico. A responsabilidade inicial da revisão é dos editores, que lêem e relêem as notícias diversas vezes, garantindo a boa qualidade do texto.

No Portal Estadão, a maior parte do noticiário também é hard news. Os textos devem ser diretos e objetivos, de modo a satisfazer o leitor com as informações básicas e oferecer a ele recursos para um aprofundamento qualificado. Segundo Roberto, a principal característica que difere o online do impresso é o visual:
— No papel, a composição informação-texto-diagramação deve cativar o leitor. Na internet, o elemento gráfico não é tão relevante; a informação, sim.