A força de 6 milhões de votos


05/10/2022


Por Octávio Costa, presidente da ABI, em Ultrajano

Até agora há muita gente no campo da esquerda se lamentando sobre o resultado de domingo. Abalados com surpresas nas eleições para o Congresso, comportam-se como se o ex-presidente Lula também tivesse perdido no primeiro turno. É óbvia a influência de analistas políticos que, diante dos primeiros números das urnas, cantaram aos quatro ventos a vitória de nomes do bolsonarismo no Sul e no Sudeste. Enquanto esses mesmos analistas se deliciavam com o que acontecia nos redutos simpáticos ao ex-capitão, crescia a onda a favor de Lula no Norte e no Nordeste. Mas isso passou a ser tratado como um fato lateral, de menor importância, pelos veículos de comunicação.

A grande mídia bateu o martelo e anunciou Jair Bolsonaro como o grande vencedor de 2 de outubro. Mas isso simplesmente não é verdade. Muita calma nessa hora. O ex-presidente Lula venceu o pleito de domingo com 6 milhões de votos de frente. Seu desempenho confirmou o que previam as pesquisas e ele somou 48,39% dos votos. Com mais 1,8 milhão, Lula teria liquidado a fatura no primeiro turno. Já o Capitão Corona, graças principalmente ao voto útil de quem iria votar em Ciro Gomes, chegou a 43,23%, quando os institutos de pesquisa previam algo perto de 37%. Na boca de urna, Bolsonaro saiu-se melhor do que se esperava. Mas perdeu. E a diferença não é tão pequena quanto se diz. Tanto assim que o próprio ex-capitão afirmou: “Entendo que há uma vontade de mudar por parte da população, mas tem certas mudanças que podem vir para pior”. E atribuiu sua derrota à inflação.

Lula abriu uma vantagem de 6 milhões de votos. O que de forma alguma é diferença pequena. É mais do que o total de eleitores da cidade do Rio de Janeiro, onde votam 5 milhões de pessoas. E mais do que o dobro dos 2,5 milhões de eleitores do Estado do Piauí (lá, por sinal, Lula recebeu 74,25% dos votos). Para ter a dimensão correta da vantagem, vale citar que Guilherme Boulos, do MTST, foi o deputado federal de melhor desempenho em São Paulo, com 1 milhão de votos. Pois a vantagem de Lula representa seis vezes a votação de Boulos no maior colégio eleitoral do país.

Para quem prefere disputas presidenciais, vale citar exemplos que entraram para a história. No Brasil, em 2016, Dilma Rousseff foi reeleita ao derrotar Aécio Neves por uma diferença de 3,5 milhões de votos (51,64% contra 48,36%). O tucano não só esperneou, como passou a conspirar abertamente pelo impeachment de sua adversária (essa é outra história). Nos Estados Unidos, em novembro de 1960, o democrata John Kennedy foi eleito presidente com uma vantagem sobre  Richard Nixon de apenas 113 mil votos populares (pouco mais de 0,16% do total de 68 milhões de votos). No Colégio Eleitoral, Kennedy se saiu melhor, com 303 votos contra 219. Em 2000, a disputa entre o republicano George W. Bush e o democrata Al Gore foi parar na Justiça. Gore venceu por diferença mínima de 500 mil votos num total de 104 milhões. Mas acabou derrotado no Colégio Eleitoral, por 271 a 266 votos. Foi decisivo o resultado da Flórida, mantido pela Suprema Corte.

Portanto, 6 milhões é um caminhão de votos. Supera a votação de Simone Tebet (4,9 milhões) e é quase o dobro da votação de Ciro Gomes (3,5 milhões). No segundo turno, o desafio da campanha de Lula é manter a vantagem conquistada no primeiro e buscar os votos que faltaram para a vitória no último domingo. O apoio do PDT, mesmo com a visível má vontade de Ciro (argh!), é importante. Os 3% que mantiveram o voto em Ciro até o final parecem ser pedetistas fiéis. Com o mínimo de coerência, vão respeitar a história do PDT de Leonel Brizola e votar em Lula. O eleitorado de Simone Tebet é bem mais difuso. Mas, mesmo assim, é bastante razoável pensar que uma parcela dos votos da senadora pode vir para o balaio de Lula. O PT está apostando alto no apoio de Tebet, que deve ser anunciado nesta quarta-feira.

Vamos à luta!