04/11/2024
Com informações Congresso em Foco e do Instituto Moreira Salles
Morreu nesta segunda-feira (4), no Rio de Janeiro, aos 88 anos, o fotógrafo Evandro Teixeira, um dos mais respeitados fotojornalistas do Brasil. Com uma carreira que se estendeu por mais de 70 anos, ele deixou um legado valioso ao documentar momentos históricos do Brasil e do mundo, com foco especial na ditadura militar e nas questões sociais.
O corpo de Evandro Teixeira será velado na Câmara dos Vereadores nesta terça-feira (05/11), das 9h às 12h. As portas do centenário Palácio Pedro Ernesto estarão abertas para o último adeus a um dos gênios da fotografia. Foi justamente na Cinelândia que Evandro fez uma das suas imagens históricas: a da Passeata dos Cem Mil, em 1968.
Evandro dedicou grande parte de sua trajetória ao Jornal do Brasil, onde trabalhou por 47 anos. Ele participou de uma exposição da Leica em Nova York, ao lado de renomados fotógrafos como Cartier-Bresson e Robert Capa.
Natural de Irajuba, na Bahia, Evandro Teixeira cresceu em uma família humilde. Seu pai, Valdomiro, era fazendeiro e sua mãe, Almerinda, dona de casa. Em 1950, mudou-se para Jequié para continuar seus estudos e começou a trabalhar no Jornal de Jequié, o que lhe possibilitou comprar sua primeira câmera fotográfica. Depois, transferiu-se para Ipiaú, onde aprendeu fotografia com Teotônio Rocha e trabalhou no Jornal Rio Novo.
Em 1954, estabeleceu-se em Salvador, onde fez um curso de fotografia por correspondência com José Medeiros e atuou como estagiário no Diário de Notícias. Sua carreira no fotojornalismo começou em 1958, no Diário da Noite, e em 1963, ele se juntou ao Jornal do Brasil, onde permaneceu até 2010, quando a versão impressa foi descontinuada.
Em 1964, casou-se com Marly Caldas de Almeida, com quem teve duas filhas. No mesmo ano, durante o golpe militar, Evandro estava no Forte de Copacabana na madrugada de 1º de abril e capturou a chegada do general Humberto Castello Branco, uma imagem que se tornou um marco na história política brasileira.
Em 1968, ele cobriu as manifestações do movimento estudantil e a repressão da ditadura no Rio de Janeiro, produzindo fotos emblemáticas, incluindo os confrontos entre estudantes e policiais montados, além da Passeata dos Cem Mil.
Em 1973, Evandro Teixeira registrou o golpe militar no Chile que depôs Salvador Allende e foi o único jornalista a fotografar o poeta Pablo Neruda já morto no hospital. Suas imagens retrataram a dor e a comovente reação do povo chileno.
O fotógrafo visitou Canudos, na Bahia, pela primeira vez em 1994, um local histórico que foi cenário de uma violenta repressão do Exército brasileiro no século 19. Ele retornou diversas vezes a esse local.
As fotografias de Evandro estão presentes em importantes museus, como o Museu de Belas Artes de Zurique, o Museu de Arte Moderna La Tertulha na Colômbia, e o MASP em São Paulo, além do MAM e do MAR no Rio de Janeiro. Um de seus livros, “Fotojornalismo”, está na biblioteca do Centro de Artes George Pompidou, em Paris. Em 1994, seu currículo foi incluído na Enciclopédia Suíça de Fotografia, que compila os maiores fotógrafos do mundo. Entre os prêmios que recebeu, destacam-se os da Unesco, Nikon e da Sociedade Interamericana de Imprensa.
1963. Talvez tenha sido esse o ano que definiu mais decisivamente a vida pessoal e profissional do baiano Evandro Teixeira. O ano que ele mesmo classificou como “um ano de arrebatamentos”. Ingressou no Jornal do Brasil, na época, uma verdadeira escola de jornalismo que, entre os anos 1950 e 1990, foi um dos mais ou talvez o mais importante jornal brasileiro; e conheceu a professora de jardim de infância Marly Souza Caldas, com quem é casado desde 1964 e com quem teve as filhas Carina (1964-) e Adryana (1968-).
Após algumas hesitações, pois tinha um certo temor de ingressar no JB, onde trabalhava o dream team do jornalismo nacional, Evandro aceitou o convite do então Editor de fotografia, Dílson Martins, e permaneceu 47 anos trabalhando para a publicação. Tornou-se um dos craques do time, um dos mais celebrados e competentes fotojornalistas do Brasil e do mundo, autor de fotografias icônicas, representativas da história política, do comportamento e do povo brasileiro. Fotografou desde anônimos até artistas como Leila Diniz, Cartola, Pablo Neruda, Rudolf Nureyev; esportistas como Ayrton Senna e Pelé; e visitantes ilustres como a rainha Elizabeth II e a princesa Diana, dentre outras incontáveis personalidades do panorama nacional e internacional.
Pensou em ser escultor, em ser aviador até ver a máquina fotográfica de seu tio Arcelino, irmão de sua mãe. Ficou encantado e passou a fotografar seus familiares e os animais da roça.
Sua maior influência e ídolo foi o fotógrafo José Medeiros (1921 – 1990), então fotojornalista da revista O Cruzeiro, com quem fez um curso de fotografia por correspondência. Outros fotógrafos que admira e que o influenciaram foram o norte-americano Eugene Smith (1918 – 1978), o francês Henri Cartier-Bresson (1908 – 2004) e o húngaro Robert Capa (1913 – 1954).
Após uma passagem por Salvador, quando estagiou no Diário de Notícias, incentivado por seu amigo Manoel Pinto (? – 2004), o Mapin, foi, em fins de 1957, para o Rio de Janeiro dos Anos Dourados, da Bossa Nova, então a capital cultural do Brasil, o Brasil de JK. Começou, em 1958, a fotografar para o Diário da Noite e também produzia registros para O Jornal, matutino carioca dos Diários Associados. Em 1961, demitiu-se e foi trabalhar na revista O Mundo Ilustrado, cujo redator-chefe era Joel Silveira (1918 – 2007), um dos maiores repórteres da história do jornalismo brasileiro. No ano seguinte, sob o comando de Luis Alberto, ele e Rubem Pereira formaram o trio de jornalistas do Diário de Notícias que faria a cobertura da Copa do Mundo do Chile de 1962. Tanto o Mundo Ilustrado como o Diário de Notícias pertenciam à família Ribeiro Dantas.
Retornamos a 1963. Como já mencionado, finalmente, Evandro foi para o Jornal do Brasil e deste ano até agosto de 2010, quando a edição impressa foi extinta, fez história no jornal, que foi uma referência gráfica e influenciou a vida política, cultural e econômica do país com suas reportagens e colunas. “A maioria das estrelas do fotojornalismo brasileiro estava lá. Era uma honra, um orgulho ser fotógrafo do JB. Nós, fotógrafos, tínhamos até uma página gráfica, no Caderno B, intitulada ‘Onde o Rio é mais carioca’. Você tinha liberdade de sair às ruas, se pautar, criar suas matérias e ensaios fotográficos, e tudo sem flash ou fotômetro”.
Ao longo de seus anos no JB, Evandro trabalhou com fotógrafos como Alberto Ferreira Lima, Alberto Jacob, Almir Veiga, Antônio Teixeira, Ari Gomes, Campanella Neto, Carlos Mesquita, Erno Schneider, Esdras Pereira, Gilson Barreto, Kaoro Higushi, Luiz Morier, Marcelo Régua, Rogério Reis, Ronald Theobald, Rubem Barbosa, Tasso Marcelo e Walter Firmo. O JB foi o primeiro jornal a ter um estúdio fotográfico próprio e a usar as câmeras de médio formato da fabricante sueca Hasselblad, que possibilitavam grandes ampliações com excelente nitidez.
– Foi o ambiente do JB que me transformou no fotógrafo que sou – disse Evandro Teixeira, em setembro de 2010
Já no seu primeiro ano no JB foi o fotógrafo de 15 matérias da série de reportagens “Bloqueio no mar”, que rendeu ao repórter José Gonçalves Fontes (1934 – 2000) o Prêmio Esso de Jornalismo hors concours, em 1964. Evandro viajou pelo Brasil e pelo mundo e produziu imagens icônicas da história do país, dentre elas uma das fotos de capa do dia seguinte ao golpe militar de 1964, a de um soldado no Forte de Copacabana debaixo de chuva. A imagem passava um sentimento de isolamento e melancolia, que se opunha às “comemorações da vitória”. Outros destaques são “Moto e queda ou A queda da moto” (1965), uma imagem que simbolizava a instabilidade do governo militar; “Baionetas e libélulas”, de 1966, que o jornalista Marcos Sá Correa definiu como “o país espetado num fuzil”; diversas imagens do movimento estudantil de 1968; “Casamento em Paraty” (1969); fotos do velório e do enterro de Pablo Neruda, em 1973; uma foto de Vinícius de Moraes, Chico Buarque e Tom Jobim deitados em cima de uma mesa da Churrascaria Carreta, em Ipanema, comemorando os 66 anos do poeta, em 1979; e “O enterro do anjinho”, a imagem de um casal de bicicleta levando o filho de três meses para ser enterrado, em 1992.
Participou da cobertura de diversos eventos esportivos como olimpíadas, copas do mundo e corridas de Fórmula 1; registrou os índios do Xingu e também fotografou eventos culturais como o Festival de Parintins, o Círio de Nazaré e o Rock in Rio. Também foi um importante fotógrafo de moda. Ganhou vários prêmios e lançou livros de fotografias, dentre eles “Fotojornalismo”, o primeiro, em 1983; e “Canudos, 100 anos”, em 1997.
Ao longo de sua extensa carreira, realizou diversas exposições no Brasil, na Europa e nos Estados Unidos, e suas fotografias estão presentes em acervos de instituições como o Museu de Belas Artes de Zurique, o Museu de Arte Moderna La Tertulia, na Colômbia; o Museu de Arte de São Paulo e o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, dentre outros.
A ABI junta-se aos inúmeros amigos, colegas e familiares de Evandro Teixeira, aos quais envia seu mais afetuoso abraço solidário.
Veja algumas das fotos antológicas de Evandro Teixeira
Fotos: Acervo pessoal de Evandro Teixeira e acervo do Instituto Moreira Sales